quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Eterno carnaval - Kiko Ferreira

Eterno carnaval 
 
Há mais de 40 anos na estrada, Maria Alcina lança disco com repertório que junta canções antigas e inéditas de Arnaldo Antunes, Zeca Baleiro, Karina Buhr e Péricles Cavalcanti 


Kiko Ferreira
Estado de Minas: 20/02/2014


Maria Alcina levou dois anos para concluir este álbum, que sai pelo selo Nova Estação, de Thiago Marques Luiz  (Jardiel Carvalho/Divulgação )
Maria Alcina levou dois anos para concluir este álbum, que sai pelo selo Nova Estação, de Thiago Marques Luiz

A cantora Maria Alcina fará 65 anos em abril. Mas continua uma intérprete vigorosa, irreverente e original, como na estreia, em 1972, cantando Fio Maravilha, de Jorge Benjor. Há dois anos, para comemorar as quatro décadas de carreira, ela e o produtor Thiago Marques Luiz começaram a gravar o disco De normal (bastam os outros), lançado agora pelo selo do próprio Thiago, Nova Estação.

Como toda boa festa, o disco mescla memórias marcantes com novidades. São 13 músicas distribuídas em 12 faixas. Só quatro delas inéditas. A primeira, Eu sou Alcina, de Zeca Baleiro, representa bem a personalidade da mineira de Cataguases, traduzida como sapeca, moleca, altiva, ativa, montada e ladina, uma “safada fada fadada/ a ser o que eu sou”. A faixa De normal, de onde saiu o título do CD, é de Arnaldo Antunes, segue linha semelhante e defende o estilo inusitado da figura Alcina. Cocadinha de sal, tema menos inspirado de Karina Buhr, tem melhor forma que conteúdo. E a marchinha Dionísio, deus do vinho e do prazer, de Péricles Cavalcanti, soa como uma mistura de Jorge Mautner e Zé Celso Martinez Corrêa.

Aliás, uma mescla óbvia de estilos, que já deveria ter acontecido há tempos, finalmente se concretiza. Alcina encontra Ney Matogrosso numa das melhores faixas, uma leitura refrescante do clássico Bigorrilho (Sebastião Gomes, Paquito e Romeu Gentil), samba com DNA de coco que foi sucesso na voz de Jorge Veiga. Outro standard, Segura esse samba, de Oswaldo Nunes, também ressurge em interpretação mais do que convincente, incluindo trecho de Dondoca, de Adoniran Barbosa. E o baião Não se avexe não, de Chico Anysio e Haydee de Paula, ganha tempero superior ao da gravação original de Dolores Duran.

Na linha de letras maliciosas de duplo sentido, que ela consagrou em músicas como Prenda o Tadeu e É mais embaixo, aparece Concurso de bicho, com presença de uma das autoras, Anastácia. E o carimbó Fogo da morena, do paraense Felipe Cordeiro, assim como Nhem nhem nhem, de Totonho, reafirma o diálogo da cantora com as novas gerações, explicitado no ótimo disco que ela gravou há 10 anos com o grupo Bojo.

A dupla João Bosco & Aldir Blanc, de quem ela chegou a gravar quatro faixas num só disco (incluindo o hit Kid Cavaquinho), reaparece num tema pouco conhecido, da safra dos anos 1990, O chefão. Mesmo habituada aos dribles e maldades das letras de Blanc, Alcina soa um pouco sem cintura na faixa. Situação semelhante ao da música Sem vergonha, de Jorge Benjor, que ela mesma já havia gravado em 1992. Apesar de ter sido um presente do Babulina, não está no rol de sua melhor safra.

Sucessor do álbum Maria Alcina, confete e serpentina, de 2009, De normal (bastam os outros) é um bom suporte para celebrar os 40 anos de vida artística da mineira. É prova inconteste de que ela tem uma qualidade rara numa época de poucos riscos: estilo. E sugere que um show dela com Ney Matogrosso seria, no mínimo, sensacional.

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