quinta-feira, 3 de abril de 2014

Pesquisa revela os segredos do cérebro‏

Pesquisa revela os segredos do cérebro Beneficiados por programa lançado há um ano por Obama, cientistas publicam atlas da comunicação de células nervosas. Estudo pode desvendar mecanismos por trás de distúrbios 
 
Paloma Oliveto
Estado de Minas: 03/04/2014


Brasília – O cérebro humano é tão complexo quanto uma galáxia. De fato, estima-se o número de neurônios em 100 bilhões, a mesma quantidade de estrelas da Via Láctea. Esse misterioso e imenso universo compreendido no crânio comanda o corpo inteiro: de atos complexos, como pensamentos, a ações automáticas, como um piscar de olhos. Para isso, as células cerebrais trabalham todo o tempo em sintonia. Falhas na comunicação entre elas podem acarretar problemas variados, que vão de depressão a esquizofrenia.

Apesar da importância das conexões dos neurônios, elas ainda não foram completamente esclarecidas. “Estudar e entender melhor o cérebro é essencial para elucidar os mecanismos que estão por trás de inúmeros distúrbios do neurodesenvolvimento. O que tínhamos até agora, porém, não fornecia o grau de detalhamento que necessitamos para começar a desvendar a complexidade cerebral”, observa Ed S. Lein, pesquisador do Instituto de Ciência Cerebral Allen, de Seattle, nos Estados Unidos. Ele é um dos autores de uma pesquisa publicada na revista Nature que revelou o primeiro atlas com dados em larga escala do cérebro mamífero.

“Essa é uma iniciativa pioneira e revolucionária que nos fornecerá dados sobre como o sistema nervoso processa todo tipo de informação”, acredita. Há um ano, o presidente americano Barack Obama lançou a Iniciativa Cérebro, um projeto de US$ 100 milhões para financiamento de pesquisas com o objetivo de traçar um panorama completo de como se pensa, aprende e recorda. Um dos focos é o combate ao Alzheimer, doença neurodegenerativa que afeta mais de 35 milhões de pessoas em todo o mundo, com perspectiva de atingir o dobro desse número a cada 20 anos, de acordo com a Organização Mundial de Saúde. A pesquisa publicada na Nature foi uma das contempladas com o patrocínio do governo.

O Atlas da Conectividade do Cérebro Roedor contém mais de 1,8 petabytes de dados, o equivalente um vídeo em alta definição com duração de 23,9 anos, e pode ser acessado gratuitamente online pela comunidade científica. As primeiras informações foram inseridas em novembro de 2011, e as mais recentes são do mês passado. Apesar do já robusto volume de dados, ele não está fechado e será atualizado à medida que forem realizadas mais descobertas sobre as conexões dos neurônios. O atlas pode ser acessado no endereço www.brain-map.org.


Erros genéticos O Instituto de Ciência Cerebral Allen realizou dois mapeamentos do funcionamento do cérebro. Um deles identificou alguns dos processos de expressão dos genes no órgão humano em desenvolvimento. Ed S. Lein, principal autor dessa pesquisa, explica que é ainda na fase embrionária e fetal que erros genéticos acabam provocando problemas na comunicação futura dos neurônios. “Esse ainda é um passo inicial, mas conseguimos, entre outras coisas, encontrar as regiões de expressão de muitos genes associados a distúrbios neurológicos e psiquiátricos”, diz.

O atlas, contudo, foi elaborado sobre dados de outro mamífero, o rato. Embora o cérebro do animal seja menor que o humano, com 75 milhões de neurônios, sua estrutura é muito semelhante ao nosso. Acredita-se que a comunicação entre as diferentes áreas cerebrais seja muito parecida nas duas espécies, o que torna o roedor um importante modelo de estudo do cérebro. Até agora, o único mapemaento completo de conexões cerebrais disponíveis era o do verme C. elegans, um organismo microscópico com apenas 302 neurônios.

Depois de coletar imagens com resolução menor que 1 micrômetro de mais de 1,7 mil cérebros, cada um deles dividido em 140 secções, os cientistas do Instituto Allen criaram um diagrama da atividade elétrica dos neurônios, chamado por eles de “connectome”. “É como o mapa da fiação elétrica de um edifício”, compara Hongkui Zeng, diretor de pesquisa da instituição. Em um software, as informações se transformaram em um mapa tridimensional da rede de comunicação do sistema nervoso central. “Isso nunca tinha sido feito antes. Temos detalhes sem precedentes de como as estruturas estão conectadas dentro do cérebro. O atlas é um passo crucial na compreensão da forma como o cérebro codifica as informações”, comemora Zeng.

Em nota, David Anderson, professor de biologia e pesquisador do Instituto de Tecnologia da Califórnia, que também participou do estudo, disse que o atlas é um mapeamento das “estradas” do cérebro no nível de rodovias estatuais. “Estradas menores e suas interseções com as interestaduais serão nosso próximo passo, seguido de mapas das ruas em diferentes municípios”, comparou. “Essa informação vai fornecer um ‘padrão de tráfego’ das informações que navegam pelo cérebro durante várias atividades, como tomada de decisões, aprendizado, lembranças e outros processos cognitivos e emocionais”, disse.

Também por meio de um comunicado de imprensa, Thomas R. Insel, diretor do Instituto Nacional de Saúde Mental dos EUA, disse que o atlas é uma “ferramenta de valor inestimável” para toda a comunidade científica. “Esse mapa já está transformando a maneira como os cientistas enxergam o desenvolvimento do cérebro e de distúrbios do neurodesenvolvimento”, considerou. 

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