sábado, 12 de julho de 2014

O produtor Chico Neves traz seu estúdio carioca para casa em Nova Lima.

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O produtor Chico Neves traz seu estúdio carioca para casa em Nova Lima. Ele abriu os microfones para jovens talentos mineiros, destaques da cena indie do país e nomes como Herbert Vianna
Mariana Peixoto
Estado de Minas: 12/07/2014


Chico Neves trocou o Rio de Janeiro por Minas e quer promover o encontro de artistas em seu Estúdio 304  (BETO NOVAES/EM/D.APRESS)
Chico Neves trocou o Rio de Janeiro por Minas e quer promover o encontro de artistas em seu Estúdio 304


A lista de discos é enorme e encheria boa parte desta página. Na impossibilidade de publicá-la, uma pequena amostra já diz muito: O dia em que faremos contato (1997), primeiro CD solo de Lenine; Lado B lado A (1999), o melhor trabalho d’O Rappa; Maquinarama (2000) e Bloco do eu sozinho (2001), divisores de águas do Skank e do Los Hermanos, respectivamente. Além de numeroso, o elenco é diverso: passa ainda por Jorge Mautner, Gilberto Gil, Fernanda Abreu, Arnaldo Antunes, Paralamas do Sucesso, Nando Reis e Lô Borges. Todos esses artistas e bandas têm em comum o produtor Chico Neves, de 54 anos. Mineiro de Belo Horizonte, ele deixou a cidade no fim da adolescência para passar um tempo no Rio de Janeiro. De volta agora a BH, sabe que os planos iniciais também não vão vingar. “Fui para o Rio sem saber de nada e fiquei 30 e poucos anos. Planejo mais uns anos aqui, não tenho prazo”, admite.

Na sala da parte de baixo da casa onde vive, num condomínio em Nova Lima, Chico pilota seu estúdio. Além do equipamento, o novo endereço herdou o nome: 304, referência ao segundo apartamento no Jardim Botânico, onde o estúdio funcionou por décadas. “Era um prédio bem folclórico do Rio, meio largadão, mistura de comercial com residencial. Até Raul Seixas morou lá”, conta. Se a vista carioca dava para o Parque Lage e a floresta da Tijuca, agora é só deixar o estúdio para dar de cara com o verde e as montanhas.

Encontro

A mudança de cenário, Chico garante, trouxe a reboque muitas novidades. “Acabo promovendo o encontro das pessoas aqui”, comenta. Nesse primeiro ano na cidade, o produtor gravou novo álbum da banda Falcatrua e mixou o do Somba. Atualmente, dedica-se à produção do grupo Todos os Caetanos do Mundo. Na sequência, vai emendar trabalho da cantora Luiza Brina. “Várias coisas estão acontecendo em Belo Horizonte. Tenho o desejo de trabalhar com o Graveola”, afirma ele, que vem tomando contato com uma cidade bem diferente daquela que deixou em 1978. Na época, quando chegou ao Rio, era um garoto de 17 anos, que, por meio de um estágio na gravadora Odeon (hoje EMI), tomou contato com os grandes da época. Como estagiário, sua função era apenas observar. Nos estúdios, presenciou registros de discos de Dona Ivone Lara, Clementina de Jesus, Ângela Maria, Clara Nunes, Milton Nascimento e Egberto Gismonti.

Mas o pulo do gato de Chico se deu no rock. “O Gil foi produzir um disco da Lucinha Turnbull (primeira mulher a tocar guitarra no Brasil, fez parte do Tutti Frutti, de Rita Lee) e chamaram o Liminha para tocar baixo. Durante o processo de gravação, havia uma emenda complicada. O engenheiro que estava gravando era bem tradicional. Disse que ele teria de gravar todo o baixo desde o começo, não daria para consertar. Eu, quieto, pedi autorização para fazer a emenda. A coisa deu certo”, relembra Chico. Assim, ele ganhou o emprego como assistente de Liminha – naquele início da década de 1980, o ex-Mutante havia se tornado produtor da Warner, multinacional recém-chegada ao país.

Nas Nuvens

Com Liminha e Gilberto Gil, Chico Neves viu o nascimento do estúdio Nas Nuvens, onde fez alguns discos. Até que, em 1986, deu um basta na indústria fonográfica e decidiu atuar sozinho. No tal prédio do Jardim Botânico, alugou primeiramente o apartamento 302 e, anos depois, fez um upgrade no 304. Independentemente do endereço, a maneira de trabalhar não mudou. Chico gosta de fazê-lo em seu próprio estúdio e, geralmente, sozinho. “Pouquíssimas vezes saí do meu lugar. No meu estúdio, não dependo de ninguém, sei como as coisas são feitas. Geralmente, em outro lugar há técnico, assistente, e gosto de ficar independente. Se fico na mão do outro, quando quero um cabo, demora. Prefiro eu mesmo fazer”, explica ele, que, eventualmente, trabalha com assistentes com quem está acostumado. Se não, é apenas ele, a máquina e a cadela Bela, que o acompanha há muitos anos. O disco da banda carioca Do Amor, por exemplo, é aberto com um latido dela.

No fim das contas, o que mais importa é quem está trabalhando. “Equipamento, é só você ter dinheiro para comprar. Quem vai conduzir aquilo é o que faz a diferença.” Como produtor, assume ser bem livre na hora do registro. Geralmente, grava tudo junto, mas apenas um instrumento valendo. “Não tenho esse purismo de gravar todo mundo. Se for para fazer isso, você aperta rec e gravou a performance. Meu trabalho é outra coisa. Muito artesanal, bem de criação. Sempre falo: por natureza, a máquina é muito fria. É você quem lhe dá vida.”

Numa conversa, Chico parece ser um cara tranquilo. Ele gosta de fazer com que as pessoas se inspirem. “Assim, elas tocam melhor e isso passa para a gravação.” Também é um agregador. Ele apresentou Pedro Sá a Lenine – tanto que o guitarrista, hoje produtor e integrante da banda de Caetano Veloso, tocou por tempos com o pernambucano. Foi Chico quem apresentou o sampler a Fernanda Abreu (foi um dos primeiros a usá-lo no Brasil) e o estúdio Real World (na Inglaterra, pertence a Peter Gabriel, referência mundial) a Lenine.

“Era um sonho meu mixar o disco lá na Inglaterra. Na época, o Lenine não tinha gravadora e eu, nos momentos em que estou mais disponível, pego trabalhos em que acredito, independentemente de ter ou não dinheiro. No final, o Lenine conseguiu negociar (o álbum O dia em que faremos contato) com a BMG. A única coisa que pedi foi ir para o Real World. Quando cheguei, parecia que já tinha uma história com aquele lugar. Acabei levando muita gente para gravar lá”, conta ele.

Além de grupos e artistas de Belo Horizonte, Chico gravou no 304 mineiro o combo curitibano A Banda Mais Bonita da Cidade – “como a casa é grande, hospedei os músicos” –, a banda carioca Scracho e a trilha do documentário I love kuduro, de Mário Patrocínio. Na seara das trilhas sonoras, Chico trabalhou em filmes como Eu, tu, eles (com Gilberto Gil, em 2000), de Andrucha Waddington; Benjamin (com Arnaldo Antunes, em 2003), de Monique Gardenberg; e Deus é brasileiro (com Hermano Vianna e Sergio Mekler, em 2003), do cineasta Cacá Diegues.

Com Herbert

Há dois anos, no Rio de Janeiro, Chico Neves produziu Victoria, álbum solo de Herbert Vianna com canções inéditas do Paralamas. Em BH, o produtor capitaneia o novo disco do vocalista e guitarrista, desta vez com suas músicas preferidas. “Somos só nós dois, e a maior parte delas é em inglês. Volta e meia o Herbert fica aqui para gravar. O disco já está bem encaminhado”, revela Chico, que também recebeu Dado Villa-Lobos e Daniel Jobim no 304. “À medida que as pessoas vêm gravar comigo, espero que conheçam o pessoal de BH. Quem sabe daqui a pouco começa a rolar uma troca?”, conclui Chico. Abertas, as portas já estão.

BY CHICO

O RAPPA
Lado B Lado A

LOS HERMANOS
Bloco do eu sozinho

LENINE
O dia em que faremos contato

HERBERT VIANNA
Victoria

ARNALDO ANTUNES
Saiba

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