Zero Hora 20/08/2014
Quando leio notícias como a do acidente que vitimou Eduardo Campos, me
dá um mal-estar não só por ser mais um aviso sobre a precariedade da
vida, mas por reconhecer que, quando não se morre de doença, se morre de
chuva, de vento, de tempestade. É outro tipo de morte por causa
natural.
As quedas de aeronaves são bem representativas. Dificilmente caem
por desgaste mecânico. Ou são abatidas pelas mãos do homem (ataque
terrorista e falhas humanas) ou são abatidas pela falta de visibilidade,
pela instabilidade provocada por pressões atmosféricas, por arremetidas
que são sempre manobras súbitas, e por isso o frio na barriga. Os
problemas técnicos na aeronave do candidato à Presidência surgiram
posteriormente à arremetida – se as condições meteorológicas fossem
boas, tudo indica que teria aterrissado com tranquilidade.
Acidentes de carro acontecem mais em dias de pista molhada do que
seca. Engavetamentos em estradas acontecem quase sempre por causa de
nevoeiros, temporais e nevascas.
Pessoas perdem tudo o que têm em enchentes e deslizamentos de terra,
barcos naufragam no mar revolto, ondas gigantes invadem praias, casas
são destelhadas por tufões, suicídios acontecem mais no inverno do que
no verão. A tragédia, decididamente, não é solar.
A vida muda – e até termina – por uma questão que está fora do nosso
controle, o clima. Há paliativos, ok. Pode-se prever e minimizar os
riscos, mas não se pode evitá-los, então somos ceifados por uma potência
destrutiva que não vem da maldade do homem e sim do humor da natureza e
que atinge a todos: crianças, velhos, pobres, ricos, pessoas de
qualquer lugar, de qualquer idade, numa loteria democrática, mas sempre
injusta.
Quando vejo moradores varrendo a lama de suas moradias no dia
seguinte ao de um estrago devastador, me parece uma provocação: o céu
límpido retorna ao local do crime com a maior cara de pau. O sol no dia
seguinte ao de um tsunami é um convidado atrasado, alguém que não
conseguiu chegar a tempo de impedir uma desolação. É bem-vindo porque
traz a possibilidade de reconstrução, porém a reconciliação é
provisória. Pessoas que perdem seus filhos, maridos e esposas para os
desatinos climáticos são confrontadas com a total falta de lógica da
existência.
Como diz uma amiga minha, “a morte é definitiva demais para o meu
gosto”. De fato. E mais definitiva nos parece quando acontece de uma
hora para outra, pelo capricho de nuvens pesadas, garoas insistentes,
rajadas desestabilizadoras, umidades traiçoeiras, por um anoitecer
prematuro, por relâmpagos, pelo cenário típico dos pesadelos, que,
ironicamente, tem lá sua poesia e sua beleza, como em toda tragédia –
desde que a gente sobreviva a ela, claro.
Ninguém deveria morrer de mau tempo, mas a natureza não negocia.
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