Nascimento de filhote de gorila acirra debate sobre existência dos zoos, com argumentos exacerbados contra ou a favor dessas instituições
Tiago de Holanda
Estado de Minas: 10/08/2014
O nascimento do filhote dos gorilas Leon e Lou Lou no Zoológico de Belo Horizonte, primeiro da espécie a vir à luz na América do Sul, foi muito celebrado por moradores da capital. O fato, porém, reacendeu uma antiga polêmica. Muitas pessoas usaram as redes sociais para criticar zoológicos e defender que sejam extintos, alegando que os ambientes oferecidos por eles causam sofrimento aos animais. O Conselho Regional de Medicina Veterinária de Minas (CRMV-MG) afirma que as instituições são importantes centros de pesquisa e conservação ambiental. Em meio à controvérsia, a quantidade de zoológicos em Minas caiu 80,6% nos últimos 25 anos, passando de 62, na década de 1990, para 12, segundo a superintendência mineira do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama/MG).
O debate nas redes sociais esquentou logo após ser divulgada a notícia do nascimento do filhote, na terça-feira. O fundador do Núcleo Fauna de Defesa Animal, Franklin Oliveira, por exemplo, compartilhou no Facebook matéria do Estado de Minas sobre o fato e escreveu um lamento: “Mais uma pobre criatura para viver uma vida toda presa sem conhecer a natureza e a liberdade”. A publicação acabou virando um fórum de discussão, com dezenas de comentários calorosos, a maioria contrária à existência de zoológicos.
Essas opiniões são reforçadas por uma líder do Movimento Mineiro pelos Direitos Animais, Adriana Cristina Araújo. “A gente fica feliz em saber que mais um animal nasce, mas lamenta que nasce para ser escravizado, para viver aprisionado em um lugar muito limitado”, afirma sobre o parto ocorrido em BH. Ela critica a ideia de que zoológicos sirvam para estimular o cuidado com o meio ambiente, argumento usado por representantes do setor. “Esses lugares deseducam as pessoas, que se acostumam a ver animais presos. Eles devem ser vistos na natureza”, alega. Ela defende a ampliação dos espaços destinados aos bichos e a criação de restrições à visitação pública: “Os visitantes devem estar em grupos pequenos. Monitores devem acompanhá-los, para passar informações e garantir que ninguém faça algo que possa estressar os animais, como barulho”.
EDUCAÇÃO AMBIENTAL O presidente do CRMV-MG, Nivaldo da Silva, afirma que os zoológicos ajudam a educar a população. “Eles permitem que as pessoas tomem conhecimento da existência de determinadas espécies, podendo ver de perto algumas que nem existem na fauna nacional”, afirma. As instituições que cumprem normas previstas na legislação tomam providências para evitar que visitantes descuidados ou mal-intencionados prejudiquem os bichos. “Para manter o bem-estar dos animais, eles são mantidos a uma distância de precaução, de segurança, dos seres humanos”, alega. “Esses locais são úteis para conservar espécies ameaçadas de extinção e para a realização de estudos. Em cativeiro, podem-se observar melhor comportamentos, fisiologias. Muitas vezes, as informações obtidas contribuem para que os animais que vivem em seu hábitat sejam mantidos em condições mais adequadas”, aponta.
Exigências cumpridas Zoo de BH é o único em Minas que tem dever de atuar na conservação das espécies. Defensores dos direitos animais criticam as condições de confinamento dos bichos
Tiago Padilha
Excursão escolar visita recinto dos elefantes: projeto pedagógico para desenvolver consciência ecológica |
Em Minas, apenas o Zoológico de Belo Horizonte tem a obrigação legal de desenvolver programas de pesquisa para a conservação de espécies, segundo a superintendência mineira do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama/MG). Maior dos 12 zoos existentes no estado, é o único classificado na categoria A, que apresenta as exigências mais rigorosas no país. “A instituição é um modelo a ser seguido no Brasil e no mundo”, avalia o presidente do Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRMV-MG), Nivaldo da Silva. Por outro lado, ativistas pelos direitos animais criticam o local por ter recintos pequenos e não garantir sossego aos bichos. Um projeto de lei em tramitação na Câmara Municipal estabelece restrições à visitação pública.
Segundo o Ibama/MG, 10 zoológicos no estado são da categoria C, que apresenta menos exigências. Um particular em Ipatinga é da classe B e, como obrigações extras, deve “possuir programas de estágio supervisionado nas diversas áreas de atuação” e “literatura especializada disponível para o público”, define a Instrução Normativa 169 do Ibama, de 2008. Independentemente do tipo, as instituições têm de desenvolver programas de educação ambiental. O Zoo de BH, entre outros preceitos, precisa “promover intercâmbios técnicos nacionais e internacionais”, como todos da classe A. “Temos parcerias com várias universidades, como a UFMG e a PUC Minas”, afirma o diretor, Gladstone Corrêa, que ressalta convênio com a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) para concessão e pagamento de bolsas de iniciação científica.
A instituição belo-horizontina abriga 3,7 mil animais de cerca de 270 espécies, segundo Gladstone. “Dessas, 24 são brasileiras ameaçadas de extinção, das quais 15 se reproduziram nos últimos 10 anos no zoológico, como o cachorro-do-mato-vinagre e o tamanduá-bandeira. Uma delas, a ararinha-azul, foi extinta na natureza e hoje só existe em zoológicos, que são aliados da conservação”, afirma. A maior parte dos animais que chegam a essas instituições foi apreendida de traficantes pela polícia ou resgatados, ressalta a bióloga Vivian Teixeira Fraiha, da seção de mamíferos. “Também há bichos excedentes de outros zoológicos. Nunca são simplesmente capturados da natureza”, diz. Alguns nascidos em cativeiro chegam a ser introduzidos em hábitat.
EXCURSÕES O zoológico da capital recebe diariamente excursões de escolas públicas e particulares. Na quarta-feira, por exemplo, o local foi visitado por um grupo de 20 alunos de 4 e 5 anos do Instituto Cecília Meireles, que funciona no Bairro Santo Agostinho, Região Centro-Sul da cidade. “Todos os anos, turmas de 2 a 6 anos vêm para cá. A visita é o trabalho de campo de um projeto pedagógico que envolve todas as disciplinas. É importante para que desenvolvam o zelo pelos animais”, explica a coordenadora da educação infantil, Maize Borges.
A professora aposentada da Faculdade de Letras da UFMG Maria Antonieta Pereira, coordenadora do programa Adote um Amigo, que, em convênio com a PBH realiza a castração de animais e incentiva a adoção deles, acredita que a visita a zoológicos é deseducativa. “As pessoas devem observar os bichos em seu habitat natural, não presos. A própria visitação é um fator de estresse para eles”, defende. “Os zoológicos promovem a espetacularização dos animais, que ainda sofrem com desrespeitos do público, que faz barulho, joga lixo”, critica uma representante do Movimento Mineiro pelos Direitos Animais, Adriana Cristina Araújo. Ela cita o fato de um elefante africano ter morrido na instituição de BH em 1995 após ingerir garrafas plásticas jogadas por visitantes. Em junho, uma girafa morreu ao se enforcar acidentalmente com a corda usada para prender o seu alimento.
O Projeto de Lei 87, de 2013, aprovado em primeiro turno na Câmara Municipal, define que o zoológico da capital tenha entre suas tarefas recuperar animais silvestres para posterior reinserção na natureza, incluindo a possibilidade de animais apreendidos pela polícia, hoje encaminhados ao Ibama, sejam entregues à instituição. “O nascimento de um gorila é um exemplo espetacular do bom trabalho feito pela instituição, mas hoje sua função prioritária é mostrar animais para as pessoas. Ela precisa mudar seu foco. A função de recuperar animais apreendido se tornaria a principal. A visitação ficaria restrita a fins acadêmicos”, diz o autor do projeto, vereador Leonardo Mattos (PV).
ENQUANTO ISSO... » ...Dieta caprichada
Cuidar bem da família de gorilas chefiada pelo macho Leon é uma das preocupações dos veterinários e nutricionistas do zoológico de BH, principalmente depois do nascimento do filhote de Lou Lou. Legumes e verduras frescas são servidos fartamente aos primatas, para reforçar a alimentação da fêmea, que está amamentando, e da outra gorila, Imbi, que está grávida e deve dar à luz até o fim de setembro.
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