domingo, 21 de outubro de 2012

Poesia cinquentona


ENTREVISTA - AL ALVAREZ
Crítico rememora 50 anos de verso e prosa 

MARINA DELLA VALLE

RESUMO
Editor e crítico, Al Alvarez revelou nomes hoje canônicos na poesia de língua inglesa, como Ted Hughes e Sylvia Plath, e movimentou a cena literária a partir do pós-guerra com seus ensaios, entre eles um manifesto contra o "excesso de gentileza" na lírica britânica, e a antologia "New Poetry", publicada há 50 anos.

Al Alvarez, 83, DIZ não achar importante falar sobre o passado. "Isso foi há muito tempo. O que posso fazer por você hoje?", desconversa o escritor, poeta, crítico, jornalista e editor britânico à Folha ao ser questionado sobre o cinquentenário da publicação da antologia "The New Poetry" (Penguin), que reuniu poetas da cena pós-Guerra hoje entranhados no cânone literário britânico.
O passado de Alvarez, porém, fala por ele. Quando editou a "The New Poetry", aos 33, já havia passado por uma meteórica carreira acadêmica -foi a pessoa mais jovem a ministrar os importantes seminários "Charles Gauss Lectures", sobre literatura, em Princeton- e largado tudo para ser o crítico de poesia do jornal "The Observer". Também foi editor e consultor de publicações de poesia da Penguin.
Entre suas apostas, estavam Ted Hughes, Sylvia Plath, Tom Gunn, Robert Lowell, uma mescla de britânicos e americanos que viria a se tornar central na poesia de língua inglesa. "Na época, aquilo era importante para a minha vida", resume. Alvarez fala de sua trajetória, ainda com certa relutância, como uma sequência de ciclos fechados, deixados de lado conforme diminuía seu interesse por eles.
Essa característica se refletiu em seu histórico de publicações: além de poemas, críticas e ensaios, escreveu sobre suicídio ("O Deus Selvagem", 1972), divórcio ("Life After Marriage", 1982), sonhos ("Noite", 1995), a indústria petroleira ("Offshore"), uma autobiografia ("Where Did It All Go Right", 1999), dois livros sobre pôquer, uma de suas paixões e um perfil do alpinista britânico Mo Anthoine, seu colega de escaladas.
Mas foi com a crítica de poesia que alcançou influência. A primeira edição da "New Poetry" trouxe o ensaio "Beyond the Gentility Principle", um ataque ao que chamou de "excesso de gentileza" na poesia britânica, o que, para ele, tinha como resultado uma rigidez antiquada. Alvarez fundamentou suas ideias fazendo comparações com a poesia americana, representada por Robert Lowell e John Berryman, e percebendo contrastes entre o velho e o novo, exemplificados, respectivamente, por Philip Larkin e Ted Hughes.
O ensaio causou impacto e influenciou gerações de poetas. Em 1966, saiu uma edição revisada da antologia, dessa vez incluindo Sylvia Plath e Ann Sexton.
No início dos anos 60, Alvarez se aproximara do círculo poético conhecido como "confessional", que usava dificuldades pessoais como matéria-prima para a poesia. Após o fracasso de seu primeiro casamento e a subsequente tentativa de tirar a própria vida, escreveu "O Deus Selvagem" (Companhia das Letras, 1999), seu livro mais conhecido, uma reflexão sobre a relação do suicídio com a criatividade.
A popularidade do livro foi impulsionada pelo longo relato de Alvarez sobre seu último encontro com Sylvia, meses antes do suicídio da poeta -a história trágica e a violência dos poemas de seu livro póstumo, "Ariel", tornaram Sylvia popular entre a primeira geração do feminismo, no início de um interesse que segue até hoje.
A relação com Plath levou Alvares a ser retratado no filme "Sylvia" (2003), sobre o casamento de Ted Hughes (Daniel Craig) e Sylvia Plath (Gwyneth Paltrow); ele próprio foi interpretado por Jared Harris. A experiência não foi agradável. "Me colocaram como um tolo. Nunca fui daquele jeito", diz, reclamando dos diálogos cheios de clichês.
Aparentemente, a fuga do óbvio foi o fator preponderante de trajetória cheia de curvas bruscas. Leia a seguir trechos da entrevista que o autor concedeu à Folha, por telefone, de sua casa em Londres:
Folha - Neste ano a primeira publicação da "New Poetry" faz 50 anos. Como o sr. vê o papel da revista na cena literária da Inglaterra?
Al Alvarez - Isso foi há muito tempo. O que posso fazer por você hoje? Já não acompanho poesia, é uma parte da minha vida que acabou. Não saberia dizer como essa cena literária se desenvolveu.
Na época, o sr. era uma figura central na revista e na cena poética inglesa. Poetas o procuravam para saber sua opinião sobre o que produziam. Seu papel como crítico extrapolou o âmbito da publicação?
Aconteceu de autores me mostrarem seus trabalhos em busca de opinião. Naquela época, queria publicar os poetas dos quais gostava, e muitos desses eram meus contemporâneos, uma grande parte nada conhecida no momento da publicação.
E acho que deu certo. Muitos poetas publicados na antologia se tornaram nomes conhecidos, então acho que saiu tudo bem.
Seu ensaio sobre o "excesso de gentileza" na poesia inglesa causou impacto e continua relevante. O sr. imaginava essa repercussão?
Na verdade, sim. Eu era jovem, passei anos como editor de poesia do "Observer", e poesia era algo central na minha vida. Consequentemente, também era importante escrever e fazer as pessoas pensarem sobre ela.
O sr. desenvolveu uma carreira acadêmica importante ainda muito jovem, mas logo a deixou de lado e nunca mais voltou. Por quê?
Gosto muito de dar aulas, mas não gostava do ambiente. Não falo isso em relação aos alunos, o que eu não gostava era do ambiente nos departamentos. Então resolvi deixar aquilo de lado e procurar meu próprio caminho.
Foi em busca desse seu próprio caminho que resolveu escrever sobre assuntos não relacionados à literatura, como pôquer e alpinismo?
Você leu meus livros sobre pôquer? Sempre procurei escrever sobre os assuntos que fazem parte da minha vida, e o pôquer teve um papel importante nela (risos).
Escrevi um livro sobre Mo Anthoine [o alpinista britânico Julian Vincent Anthoine, companheiro de escalada de Alvarez], uma pessoa interessante, inteligente, engraçada. Você leu esse livro ["Feeding the Rats: Profile of a Climber"]? Não? É interessante, acho que ficou bom.
Ao menos internacionalmente, seu livro mais conhecido é "O Deus Selvagem". A que credita isso?
Pois é, faz 40 anos, mas ainda é meu livro mais conhecido. Acho que é por causa do tema, o suicídio. Ninguém escrevia sobre isso, o que tornava o assunto importante.
Boa parte do interesse se deve à descrição de seu último encontro com Sylvia Plath, não acha?
Sim, também há o interesse em Sylvia. Foi importante escrever sobre ela e sua morte. De repente, ela estava morta, mas ao mesmo tempo continuava tão viva... Quis escrever sobre essa poeta que passou por tempos difíceis e que usou a força disso em seus poemas.
Naquele tempo, Sylvia não era tão conhecida em Londres, mas sua morte foi significativa para diferentes pessoas por diferentes motivos. Escrever sobre ela foi importante para mim mesmo. Desde então, fiz o que pude para demonstrar que o que importa é o que ela escreveu, e não a maneira como perdeu a vida.
Ela virou um nome conhecido, e acho que contribuí para isso. Fico feliz em pensar que sim.
Você aparece como personagem do filme sobre Sylvia Plath. Como foi essa experiência?
Ah, estranha. O ator que me interpretou veio me encontrar antes das filmagens. Mas a maneira que fui retratado... Me colocaram como um tolo, falando como um tolo, e nunca fui daquele jeito. Posso dizer que não foi uma experiência agradável (risos).
E qual sua opinião sobre o filme?
Em relação a Sylvia, acho que é razoável. O que me incomoda é que se trata de um filme sobre poetas, e poetas são fascinados por palavras, pela linguagem. Isso não se reflete nos diálogos, que são cheios de clichês.
Essa paixão pelas palavras poderia ter sido demonstrada na fala, mas isso não acontece.

2 comentários:

  1. Com surpresa encontro um blog editado por você, Bê Neviani. É uma caixinha de guardados refinados pela sua habilidosa e ágil leitura. Voltarei aqui, sempre que desejar encontrar textos com temas variados.

    Receba o meu abraço e cumprimentos, além da sugestão para que escreva, também, queridona leitora.

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