Carlos Herculano Lopes
Estado de Minas: 14/02/2013
Exemplos de livreiros que, de tanto lidar com o produto, com o passar do tempo acabaram também se tornando editores são comuns na história brasileira. Talvez o caso mais famoso seja o de José Olympio, que, em 1931, em São Paulo (transferindo-se depois para o Rio), criou a José Olympio Editora, hoje incorporada ao Grupo Editorial Record, que se tornaria uma das casas editoriais mais lendárias do país. Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Rachel de Queirós e José Lins do Rego, entre outros, passaram por lá. Sair pela José Olympio, durante muitos anos, foi sinônimo de privilégio e qualidade.
Aqui em Minas, de uns anos para cá, essa tradição vem sendo retomada, numa demonstração de que o livro, apesar de muitos dizerem o contrário e da concorrência da internet, continua em alta. É o caso de Welbert Belfort, o Betinho. Mineiro de Ouro Preto, de 48, há 19 chegou a Belo Horizonte, onde, em 1997, resolveu abrir uma livraria, a Scriptum, que inicialmente funcionava na Rua Pernambuco, na Savassi, antes de ser transferida para o endereço atual, na Rua Fernandes Tourinho, no mesmo bairro.
Ex-bancário e ex-estudante de história, Betinho conta que a Scriptum, desde sua inauguração, sempre procurou apoiar movimentos culturais, seja oferecendo seu espaço, confeccionando cartazes ou até mesmo auxiliando com dinheiro. Mas a ideia de transformá-la em editora só surgiu em 2004, como uma maneira de fortalecer institucionalmente a marca. Depois de formado um conselho editorial, que continua tendo “todos os poderes” em relação às publicações, ele se recorda de que o primeiro livro que conseguiram lançar pelo selo Scriptum foi a coletânea de poemas Trívio, de Ricardo Aleixo.
De lá para cá, diz o livreiro e editor, além de algumas revistas ligadas à área de psicanálise, como Estudos lacanianos, que é editada em parceria com o curso de pós-gradução em psicologia da UFMG, e Curinga, que tem o apoio da Escola Brasileira de Psicologia de MG, já publicaram cerca de 90 livros de gêneros diversos, como poesia, contos, romances, ensaios, crítica literária e história, entre outros.
“Fomos a primeira editora brasileira a lançar Ana Martins Marques e Carlos Brito e Melo, que hoje estão na Companhia das Letras, ganhando prêmios e fazendo sucesso país afora”, diz. Na área da psicanálise, que é um dos fortes da casa, já colocaram nas livrarias autores como Sérgio de Castro, Margarete Couto, Graziela Bessa e Celso Rennó, além de alguns estrangeiros.
Entre os próximos lançamentos da Scriptum, programados ainda para este semestre, estão Indo ao futuro para entender as mães, de Barbara Muniz, que inaugura a coleção infantojuvenil da editora, e O silêncio anterior, do médico Narciso Bedran. O livro terá prefácio do jornalista Roberto Pompeu de Toledo.
Entre as dificuldades enfrentadas por uma pequena editora, Betinho afirma que a maior continua sendo a distribuição. Aí estão presentes uma série de fatores que entravam o envio dos livros, principalmente para outros estados, como a logística, os custos, o transporte e a burocracia fiscal. “Mas de uns tempos para cá a situação tem melhorado e em São Paulo, por exemplo, já conseguimos colocar nossos livros em livrarias como a Cultura, Saraiva, Livraria da Vila e algumas outras”, comemora.
Clássicos Outro livreiro, o goiano Oséias Ferraz, que chegou a Belo Horizonte há 20 anos, também acabou transformando sua livraria, a Crisálida, numa editora. Ainda funcionando no local de origem, o Edifício Maletta, no Centro, Oséias conta que no início sua pretensão era editar apenas clássicos brasileiros e estrangeiros esgotados, como era o caso de William Blake, D. H. Lawrence e Heinrich Heine.
Nessa linha, um dos últimos lançamentos da editora foi o livro A alma encantadora das ruas, do cronista João do Rio, cuja primeira edição havia saído em 1908. Recentemente, publicaram Godard, cinema e literatura, com entrevistas feitas por Mário Alves Coutinho com 11 especialistas franceses. Para este ano, adianta, estão previstos vários lançamentos, alguns com a Editora Autêntica, cuja parceria já rendeu O belo autônomo – textos clássicos de estética, organizado por Rodrigo Duarte. “Foi uma maneira que encontramos de viabilizar nossos projetos com mais agilidade”, diz Oséias.
Assim como Betinho, o maior problema que Oséias enfrenta é a distribuição. “Isso aqui no Brasil sempre foi complicado. São muitos títulos editados, poucas livrarias e pouco espaço para exposição. Além do mais, a maioria dos nossos livreiros, infelizmente, não é leitor e só quer reproduzir nas vitrines a listas dos mais vendidos, o que faz com que as editoras que trabalham com outros nichos fiquem sem espaço”, afirma.
Parceria Quem também tem apostado no sonho de editar livros é Álvaro Gentil. Mineiro de Ituiutaba, de 51, e ex-estudante de agronomia, ele conta que o embrião da sua editora, a Asadepapel (nome dado em homenagem a um livro homônimo de Marcelo Xavier), foi um jornalzinho literário, Manuscritos, editado pela Livraria Café Book, onde trabalha. Como a experiência deu certo, ele resolveu aventurar-se no ramo da edição. “Percebi também que existia uma falta de editoras em Belo Horizonte voltadas para o lançamento de livros de ficção e por isso resolvi seguir em frente. O primeiro volume que conseguimos publicar foi a coletânea Crônicas do fim do tempo, do jornalista Roberto Mendonça. Isso foi há 10 anos e, de lá para cá, já lançamos cerca de 20 títulos, a maioria em parceria com os autores, em edições de 300 a 500 exemplares”, diz Gentil.
Entre os últimos lançamentos da editora, que se esmera em entregar ao leitor um produto final bem-acabado, estão os livros Até o apagar da velha chama, de Nilton Eustáquio; Concreto quase, de Fabiano Novaes; Tito, totiti, titoti, de Raquel Vale; Aonde quer que eu vá, de Cynthia França; e Donzelas para povoar, de Ana Medina. No próximo mês, a Asadepapel deve lançar Guardiões, de Gustavo Campos.
Seguindo os passos dos seus colegas livreiros, Alencar Perdigão, de 48, e que desde 1993 está à frente da Quixote Livraria, também resolveu abrir sua própria editora, Aqui se imprimem livros, nome dado em homenagem a uma passagem de Dom Quixote, de Miguel de Cervantes. “Começamos no ano passado com a publicação de dois títulos: Pedacim de mim, de Marcos Tota, e Corteatrela, da psicanalista Vera Valadares, e este ano pretendemos publicar 10 títulos, em parceria ou não com os autores”, diz.
Assim como Betinho Belfort, da Scriptum, Oséias Ferraz, da Crisálida, e Álvaro Gentil, da Asadepapel, também para Alencar a distribuição continua sendo a grande pedra no sapato dos editores mineiros. “Não só no nosso, mas da maioria dos pequenos editores do país”, conclui.
• Livrarias e editoras
» Café Book, Rua Padre Rolim, 616, Santa Efigênia, (31) 3224-5784.
» Crisálida, Rua da Bahia, 1.148, sobreloja, 63, Centro, (31) 3222-4956.
» Livraria e Editora Scriptum, Rua Fernandes Tourinho, 99, Savassi, (31) 3223-7226.
» Quixote Livraria e Café, Rua Fernandes Tourinho, 274, Savassi,(31) 3227-3077.
Aqui em Minas, de uns anos para cá, essa tradição vem sendo retomada, numa demonstração de que o livro, apesar de muitos dizerem o contrário e da concorrência da internet, continua em alta. É o caso de Welbert Belfort, o Betinho. Mineiro de Ouro Preto, de 48, há 19 chegou a Belo Horizonte, onde, em 1997, resolveu abrir uma livraria, a Scriptum, que inicialmente funcionava na Rua Pernambuco, na Savassi, antes de ser transferida para o endereço atual, na Rua Fernandes Tourinho, no mesmo bairro.
Ex-bancário e ex-estudante de história, Betinho conta que a Scriptum, desde sua inauguração, sempre procurou apoiar movimentos culturais, seja oferecendo seu espaço, confeccionando cartazes ou até mesmo auxiliando com dinheiro. Mas a ideia de transformá-la em editora só surgiu em 2004, como uma maneira de fortalecer institucionalmente a marca. Depois de formado um conselho editorial, que continua tendo “todos os poderes” em relação às publicações, ele se recorda de que o primeiro livro que conseguiram lançar pelo selo Scriptum foi a coletânea de poemas Trívio, de Ricardo Aleixo.
De lá para cá, diz o livreiro e editor, além de algumas revistas ligadas à área de psicanálise, como Estudos lacanianos, que é editada em parceria com o curso de pós-gradução em psicologia da UFMG, e Curinga, que tem o apoio da Escola Brasileira de Psicologia de MG, já publicaram cerca de 90 livros de gêneros diversos, como poesia, contos, romances, ensaios, crítica literária e história, entre outros.
“Fomos a primeira editora brasileira a lançar Ana Martins Marques e Carlos Brito e Melo, que hoje estão na Companhia das Letras, ganhando prêmios e fazendo sucesso país afora”, diz. Na área da psicanálise, que é um dos fortes da casa, já colocaram nas livrarias autores como Sérgio de Castro, Margarete Couto, Graziela Bessa e Celso Rennó, além de alguns estrangeiros.
Entre os próximos lançamentos da Scriptum, programados ainda para este semestre, estão Indo ao futuro para entender as mães, de Barbara Muniz, que inaugura a coleção infantojuvenil da editora, e O silêncio anterior, do médico Narciso Bedran. O livro terá prefácio do jornalista Roberto Pompeu de Toledo.
Entre as dificuldades enfrentadas por uma pequena editora, Betinho afirma que a maior continua sendo a distribuição. Aí estão presentes uma série de fatores que entravam o envio dos livros, principalmente para outros estados, como a logística, os custos, o transporte e a burocracia fiscal. “Mas de uns tempos para cá a situação tem melhorado e em São Paulo, por exemplo, já conseguimos colocar nossos livros em livrarias como a Cultura, Saraiva, Livraria da Vila e algumas outras”, comemora.
Clássicos Outro livreiro, o goiano Oséias Ferraz, que chegou a Belo Horizonte há 20 anos, também acabou transformando sua livraria, a Crisálida, numa editora. Ainda funcionando no local de origem, o Edifício Maletta, no Centro, Oséias conta que no início sua pretensão era editar apenas clássicos brasileiros e estrangeiros esgotados, como era o caso de William Blake, D. H. Lawrence e Heinrich Heine.
Nessa linha, um dos últimos lançamentos da editora foi o livro A alma encantadora das ruas, do cronista João do Rio, cuja primeira edição havia saído em 1908. Recentemente, publicaram Godard, cinema e literatura, com entrevistas feitas por Mário Alves Coutinho com 11 especialistas franceses. Para este ano, adianta, estão previstos vários lançamentos, alguns com a Editora Autêntica, cuja parceria já rendeu O belo autônomo – textos clássicos de estética, organizado por Rodrigo Duarte. “Foi uma maneira que encontramos de viabilizar nossos projetos com mais agilidade”, diz Oséias.
Assim como Betinho, o maior problema que Oséias enfrenta é a distribuição. “Isso aqui no Brasil sempre foi complicado. São muitos títulos editados, poucas livrarias e pouco espaço para exposição. Além do mais, a maioria dos nossos livreiros, infelizmente, não é leitor e só quer reproduzir nas vitrines a listas dos mais vendidos, o que faz com que as editoras que trabalham com outros nichos fiquem sem espaço”, afirma.
Parceria Quem também tem apostado no sonho de editar livros é Álvaro Gentil. Mineiro de Ituiutaba, de 51, e ex-estudante de agronomia, ele conta que o embrião da sua editora, a Asadepapel (nome dado em homenagem a um livro homônimo de Marcelo Xavier), foi um jornalzinho literário, Manuscritos, editado pela Livraria Café Book, onde trabalha. Como a experiência deu certo, ele resolveu aventurar-se no ramo da edição. “Percebi também que existia uma falta de editoras em Belo Horizonte voltadas para o lançamento de livros de ficção e por isso resolvi seguir em frente. O primeiro volume que conseguimos publicar foi a coletânea Crônicas do fim do tempo, do jornalista Roberto Mendonça. Isso foi há 10 anos e, de lá para cá, já lançamos cerca de 20 títulos, a maioria em parceria com os autores, em edições de 300 a 500 exemplares”, diz Gentil.
Entre os últimos lançamentos da editora, que se esmera em entregar ao leitor um produto final bem-acabado, estão os livros Até o apagar da velha chama, de Nilton Eustáquio; Concreto quase, de Fabiano Novaes; Tito, totiti, titoti, de Raquel Vale; Aonde quer que eu vá, de Cynthia França; e Donzelas para povoar, de Ana Medina. No próximo mês, a Asadepapel deve lançar Guardiões, de Gustavo Campos.
Seguindo os passos dos seus colegas livreiros, Alencar Perdigão, de 48, e que desde 1993 está à frente da Quixote Livraria, também resolveu abrir sua própria editora, Aqui se imprimem livros, nome dado em homenagem a uma passagem de Dom Quixote, de Miguel de Cervantes. “Começamos no ano passado com a publicação de dois títulos: Pedacim de mim, de Marcos Tota, e Corteatrela, da psicanalista Vera Valadares, e este ano pretendemos publicar 10 títulos, em parceria ou não com os autores”, diz.
Assim como Betinho Belfort, da Scriptum, Oséias Ferraz, da Crisálida, e Álvaro Gentil, da Asadepapel, também para Alencar a distribuição continua sendo a grande pedra no sapato dos editores mineiros. “Não só no nosso, mas da maioria dos pequenos editores do país”, conclui.
• Livrarias e editoras
» Café Book, Rua Padre Rolim, 616, Santa Efigênia, (31) 3224-5784.
» Crisálida, Rua da Bahia, 1.148, sobreloja, 63, Centro, (31) 3222-4956.
» Livraria e Editora Scriptum, Rua Fernandes Tourinho, 99, Savassi, (31) 3223-7226.
» Quixote Livraria e Café, Rua Fernandes Tourinho, 274, Savassi,(31) 3227-3077.
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