quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Marina Colasanti - Hora de casamento gay‏


Marina Colasanti
Estado de Minas: 14/02/2013 
Como foi possível, nos perguntamos hoje, que até 1990 a Organização Mundial da Saúde incluísse em sua lista de doenças mentais o homossexualismo? E como nós, que enchíamos a boca com a palavra democracia, pudemos suportá-lo?

Ainda agora, quando França e Inglaterra se movimentam para legalizar o casamento gay, cartazes contrários se erguem em alguns pontos da multidão. Leio um deles na foto do jornal? “O casamento é para homem e mulher, não cabe ao Parlamento mudar o eterno plano de Deus”. Uma senhora gorduchinha e de ar benévolo o segura, em uma praça de Londres.

A senhora em questão, que acredita defender a família cristã e nessa defesa enfrenta cansaço e o frio do inverno, está certa de abrigar bons sentimentos. Alguém precisaria lhe dizer que o casamento nunca fez parte dos planos de Deus. Tivesse feito, Ele o teria promovido ainda no paraíso terrestre, unindo legalmente Adão e Eva – autoridade para isso não lhe faltava. Mas os dois saíram escorraçados, com uma mão na frente e outra atrás, literalmente, sem qualquer vínculo entre si que não fosse o fato de serem a única opção recíproca possível sobre a Terra. A parte do plano de Deus que levaram consigo, e que depois foi necessário organizar através de vários modelos de casamento, era apenas o impulso de amar-se fisicamente e procriar. 

E como pode aquela senhora respeitável, de cabelos brancos e óculos, acreditar como acredita que a mão de Deus tudo comanda, se coloca os gays fora da proteção dessa mão? Por que Deus os teria criado e teria posto amor no seu coração se houvesse erro na realização desse amor? 

A senhora londrina, como tantas pessoas em tantos outros países, acha que a família tradicional estará ameaçada se os casais gays também puderem fundar a sua. Não acha, porém, que a família esteve ameaçada ao longo de tantos séculos, quando os gays foram obrigados a se fingir de héteros, a se casar com héteros, a ser infelizes com héteros, e a pôr em risco a felicidade de seu cônjuge hétero.

Onze países já legalizaram o casamento gay. Portugal, com grandes discussões internas. E a Argentina, nossa vizinha que sempre olhamos com ares de superioridade liberal, foi o sexto e, sem ser supostamente careta, nos passou a perna mais uma vez. Obama, Cameron e Hollande já declararam, vão batalhar para aumentar esse conjunto e não pretendem perder.

Tenho visto paradas de orgulho gay mundo afora, fantasias, cílios postiços, falsas cabeleiras e falsos bigodes, meias arrastão e ligas, Barbies e sadomasô. Meu pensamento é que está na hora de mudar esse modelo. No princípio há de ter sido necessário exacerbar, agredir os chamados bem pensantes, impactar as cidades e gerar notícias. Carnavalizou-se a questão como forma de escancarar a presença gay, tornar pública a grande saída do armário. Mas esse momento passou.

Hoje, gostaria de ver na parada de orgulho gay as pessoas vestidas como o são no seu cotidiano. Sem peruca, sem maquiagem, talvez identificadas por profissão, médicos, advogados, cineastas, lixeiros, contadores, babás, vendedores ambulantes, dançarinos, militares, publicitários, cozinheiros. Porque a hora é de dizer que os gays não são diferentes, diferente é somente sua vertente sexual. E que não “estão entre nós”, mas são nós.

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