Em um dia marcado por declarações fortes
de parlamentares e ministros do STF, presidente da Câmara suspende
tramitação da PEC que dá ao Congresso o poder de barrar decisões da
Corte
Juliana Braga, Leandro Kleber, Diego Abreu e Adriana Caitano
Estado de Minas: 26/04/2013
Brasília –
A crise institucional iniciada pela aprovação da Proposta de Emenda à
Constituição (PEC) 33/2001, que dá ao Legislativo a palavra final sobre
as decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) atingiu o ápice ontem e,
após declarações fortes de integrantes dos Três Poderes, levou o
presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), a suspender a
tramitação do projeto. Ontem, após reunião, Henrique Alves e o
presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), elevaram o tom e
admitiram haver uma crise entre o Legislativo e o Judiciário. Eles
chamaram de “invasão” do STF no Congresso a decisão do ministro Gilmar
Mendes de suspender a tramitação do projeto que dificulta a criação de
partidos. Alves e Calheiros entraram com um agravo regimental no Supremo
contra a liminar do ministro.
Com a reação imediata e negativa
de ministros do Supremo, de partidos de oposição e do procurador-geral
da República, Roberto Gurgel, em relação à aprovação da PEC 33 na
Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, Henrique Alves anunciou
que, “enquanto não tiver uma definição muito clara” sobre o assunto,
está suspensa a criação da comissão especial que iria analisar a
proposta. O ministro Gilmar Mendes chegou a dizer que se a medida for
aprovada pelo Legislativo será melhor “fechar” a Suprema Corte. “A PEC é
inconstitucional do começo ao fim, de Deus ao último constituinte que
assinou a Constituição. Eles rasgaram a Constituição. Se um dia essa
emenda vier a ser aprovada, é melhor que se feche o Supremo Tribunal
Federal”, recriminou.
Em Nova York, pouco antes de embarcar para o
Brasil, o presidente do STF, Joaquim Barbosa, afirmou, por meio de sua
assessoria de imprensa, que uma eventual aprovação da PEC fragilizaria a
democracia. “Tem quase 80 anos a tradição já consolidada de se permitir
que o Supremo Tribunal Federal declare a inviabilidade jurídica de uma
lei votada pelo Congresso por violação de uma cláusula constitucional.
Por que alterar isso agora, em pleno século 21? Essa medida, se
aprovada, fragilizará a democracia”, criticou.
Apesar da
suspensão da tramitação, tanto Henrique quanto Renan mantiveram a tensão
e subiram o tom do discurso. “A separação entre os poderes não pode se
resumir a uma mera questão emocional”, respondeu, referindo-se à
possível retaliação da decisão de Gilmar Mendes. Os dois passaram o dia
ontem reunidos com outros parlamentares, traçando qual seria o
contra-ataque do Congresso ao que consideraram uma “invasão” do STF.
Mandado de segurança O
PSDB e o MD (fusão do PPS com o PMN) protocolaram ontem mandados de
segurança para que o Supremo impeça a tramitação da PEC 33. O autor da
proposta, deputado Nazareno Fonteles (PT-PI), disse que não esperava
tamanha repercussão com a aprovação do texto porque a proposta está
disponível há dois anos, desde que foi protocolada na Casa. Ao negar que
haja uma estratégia de retaliação ao STF após o julgamento do mensalão,
o parlamentar argumenta que há exatamente um ano uma PEC semelhante foi
aprovada no mesmo colegiado, também sob a relatoria do tucano deputado
tucano João Campos (GO). “Como pode ser uma retaliação a algo que ainda
nem tinha acontecido (julgamento do mensalão)”, questionou. Ele
classificou as críticas como “desonestidade intelectual”.
Fonteles
criticou ainda a decisão de Henrique Alves de não instalar a comissão
especial na Câmara para analisar a proposta. “Ele não tem esse poder. Só
tem a obrigação de criar a comissão especial e não pode fazer um ato
contra a CCJ, que já deliberou”, ressaltou. Em nota, o presidente da
CCJ, deputado Décio Lima (PT-SC), afirmou que a polêmica em torno da
aprovação da PEC 33 “não passa de tempestade em um copo d’agua”. Segundo
ele, o debate entre os poderes é normal e nenhum assunto é proibido. O
ministro do STF Dias Toffoli também tentou amenizar o debate acalorado.
“O ruim seria se o Congresso e o Judiciário não estivessem atuando. Por
isso, não há crise. O que há são os Poderes funcionando. E que bom que
estejam funcionando. Isso é melhor para a democracia”, avaliou.
O
vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB), também a aprovação
da PEC 33. “Eu lamento até dizer isso, mas acho que houve uma demasia. A
palavra última há de ser sempre a do Poder Judiciário, especialmente em
matéria de constitucionalidade e vinculação de uma determinada decisão
para os tribunais inferiores”, disse.
Mensaleiros
A participação de deputados condenados no julgamento do mensalão na
Comissão de Constituição e Justiça da Câmara – José Genoino (PT-SP) e
João Paulo Cunha (PT-SP) – também é motivo de crítica. O ministro do
Supremo Marco Aurélio Mello observou que nenhum integrante da CCJ
questionou o teor da PEC 33. “E é sintomático que na comissão tenhamos
dois réus da Ação Penal 470 (mensalão)”, disse. O procurador-geral da
República, Roberto Gurgel, alertou que os dois parlamentares petistas
não deveriam sequer estar na Câmara.
Recurso para manter votação
Presidentes da Câmara e do Senado
rejeitam %u201Cinvasão%u201D do Judiciário e anunciam agravo contra
decisão de ministro do Supremo que suspendeu a tramitação de projeto
sobre partidos
Juliana Braga e Adriana Caitano
Brasília –
A criação do Rede Sustentabilidade, partido pelo qual a ex-senadora
Marina Silva pretende candidatar-se à Presidência da República em 2014,
corre o risco de enfrentar novos obstáculos nos próximos dias. Depois de
o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes conceder
mandado de segurança suspendendo a tramitação do projeto que dificulta a
criação de legendas e veta a transferência do tempo de TV e do Fundo
Partidário para as novas legendas, o presidente do Senado, Renan
Calheiros (PMDB-AL), entrou com um recurso na Corte contra a decisão.
Ele pede a revisão da decisão pelo plenário.
Caso seja acatado o
pedido de Renan, o texto que muda as regras de divisão do Fundo
Partidário e do tempo de televisão volta a tramitar no Senado. Tanto
Renan quanto o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN),
consideram que houve uma “invasão” do Judiciário no Legislativo. “Da
mesma forma que nós nunca influenciamos decisões do Judiciário, nós não
aceitamos que o Judiciário influa nas decisões legislativas. De modo que
nós consideramos isso uma invasão. É inconcebível que haja uma
tentativa de influir no andamento do processo legislativo”, ressaltou
Calheiros. Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), autor do pedido de mandado de
segurança, por outro lado, acusa a base governista de “autoritarismo”.
Pela
manhã, Henrique Alves criticou a liminar. “Nós estranhamos muito porque
foi uma decisão soberana desta Casa que, de forma democrática e
transparente, cumpriu todos os preceitos regimentais”, comentou. Mais
tarde, disse que o PSB se equivocou ao pedir o mandado de segurança no
STF. “(O Supremo) foi provocado de forma equivocada. Não aceitamos essa
intromissão na nossa competência”, sustentou.
Já Rollemberg disse
que está confiante em relação à decisão que o STF tomará. “Nós temos
muita convicção que o Supremo derrubará esse projeto. Toda vez que um
projeto de lei é feito para atingir um objetivo pessoal ou pequeno grupo
de pessoas, isso é uma medida inconstitucional, uma medida ilegal e foi
assim que o Supremo entendeu e entendeu corretamente”, afirmou.
Rollemberg
ainda criticou a base aliada, que estaria “perdendo a medida das
coisas”. “Esse viés autoritário é extremamente prejudicial à democracia.
Nós não podemos, através de uma lei ordinária, querer mudar uma
interpretação da Constituição feita recentemente pelo STF”, alfinetou.
O
recurso apresentado por Renan, na prática, terá papel mais político. O
pedido para o mérito ser avaliado no plenário é redundante, já que a
questão seria avaliada por todos os ministros de qualquer forma. Mas a
avaliação dos aliados do peemedebista é que, dessa forma, o Senado marca
posição e garante que sua argumentação será levada em conta quando o
assunto for analisado pelo Supremo.
Favorecidos
No mandado de segurança, Gilmar Mendes acata a argumentação de
Rollemberg e alega “extrema velocidade” na apreciação da matéria,
caracterizando casuísmo em prejuízo de minorias políticas. A rapidez na
tramitação da proposta no Congresso foi articulada pela base governista,
com a finalidade de que as mudanças atinjam o partido que Marina Silva
pretende criar.
Quem também tem pressa na tramitação da proposta
é o DEM, que conseguiu incluir, ainda na Câmara, uma emenda que muda a
divisão do tempo de TV e favorece a legenda. Hoje, o tempo é dividido de
duas formas: um terço é repartido igualmente entre todas as legendas e
os outros dois proporcionalmente levando em conta a bancada eleita de
cada partido. O deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO) conseguiu inserir
mudança na parte fixa do tempo distribuída. Um terço dela – ou seja, um
nono do total – continuaria sendo repartida igualmente e o restante
também atenderia à proporcionalidade. Com isso, o DEM consegue reduzir o
impacto da perda de 11 deputados federais para o PSD.
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