Correio Braziliense - 22/08/2013
Sonhei que a esta altura da história velhas torpezas humanas como
racismo, machismo, homofobia e perseguição religiosa seriam coisas
enterradas no passado. Mas o novo milênio ainda não conseguiu derrotar o
medo e a ignorância que nos fazem intolerantes com o outro. Os
absurdos que temos visto nos últimos dias, potencializados pelas redes
sociais, deixaram evidentes o fato de que a Terra ainda é quadrada,
ressuscitando aqui uma nostálgica gíria para nomear coisas
carrancudamente ultrapassadas.
Se o indivíduo espalhafatoso pode parecer ridículo, a caretice
desinibida de hoje chega a ser tragicômica. Outro dia foi a vez de
Oprah Winfrey, a bilionária rainha da tevê norte-americana, reclamar de
preconceito racial e social em Zurique, na Suíça. A balconista de uma
loja de luxo teria sugerido que a estrela afrodescendente não tinha
condições financeiras de levar para casa uma peça muito cara.
Em outra parte do mundo, uma jovem iraniana foi proibida de assumir o
cargo de vereadora por ser “bonita demais”. Os 10 mil votos dados a
Nina Siahkali Moradi, 27 anos, foram anulados em razão de suas
“credenciais”, leia-se elegância e belo rosto. Notícia ainda mais
repugnante veio da Itália, quando o senador Roberto Calderoli, do
partido Liga Norte, comparou Cecile Kyenge, a primeira ministra negra do
país, a um orangotango. O vice-presidente do Senado cometeu o deslize
motivado pela campanha contra imigrantes, sobretudo os vindos da
África.
Os protestos de representantes da torcida organizada do Corinthians
contra o atacante Emerson Sheik, que postou na internet foto dando um
selinho num amigo, são desmedidos. A fome e a violência expostos à luz
do meio-dia no centro da capital paulista deveriam escandalizar e
revoltar muito mais. Não conseguimos ver igual debate ou mobilização
para reverter o quadro de queda vertiginosa no valor dado à vida.
Matam-se hoje pessoas apenas para “matar o tempo”.
Para completar esses exemplos de episódios caducos, um dos principais
símbolos do atletismo mundial, a russa Yelena Isinbayeva, causou comoção
internacional ao se declarar favorável à legislação antigay de seu
país. Depois até tentou consertar a frase infeliz, culpando seu domínio
imperfeito da língua inglesa. Mas era tarde. Na mesma Rússia onde
líderes soviéticos davam selinhos nos líderes da Cortina de Ferro em
frente às câmeras, fornecer informações sobre homossexuais a menores de
idade virou crime.
Nenhum comentário:
Postar um comentário