Antônio Machado
Estado de Minas: 22/08/2013
Parece inimaginável,
com o dólar chegando à cercania de R$ 2,45 e a variação mensal da
inflação voltando a alçar voo, saindo de quase zero em julho para 0,16%
no meio de agosto, além de a abertura de postos de trabalho despencar de
142,5 mil para 41,5 mil, de um mês para outro, que haja clima para
falar de oportunidades de negócios.
Mas foi o que aconteceu na terça-feira na sede do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no Rio. E oportunidades não faltaram, apesar da bruma que embaça o horizonte da economia, já que assim foi por oito horas seguidas – da manhã ao fim de tarde. E não se tratava de executivos do BNDES esforçando-se em atrair investidores para as concessões de infraestrutura.
Foi o contrário: um grupo dos mais poderosos empresários do Japão, conhecido por Grupo de Sábios, veio de Tóquio apresentar propostas inovadoras, visionárias até, para atuação conjunta com a Petrobras na exploração do pré-sal, entre outras. Uma nova concepção para o desenvolvimento da malha ferroviária nacional, por exemplo, também entrou nas conversas, conduzidas pelo presidente do BNDES, Luciano Coutinho, hoje, principal referência japonesa na relação bilateral.
Os empresários tiveram audiência com a presidente Dilma Rousseff, e se mostraram resolutos quanto ao interesse renovado no Brasil. O Japão e empresas japonesas foram grandes investidores no país, até meados da década de 1980, financiando de Itaipu ao desenvolvimento agrícola no cerrado. Depois, com duas décadas de inflação endêmica e crises cambiais, se afastaram, embora alguns grupos fincassem pé, como a trading Mitsui, sócia da Vale, e Nippon Steel, da Usiminas.
Parte da retração do capitalismo japonês talvez se deva a décadas de estagnação econômica do Japão. Mas, a ser assim, o investimento japonês deveria ter se retraído na Ásia, sobretudo na China, e nos EUA, e isso nunca aconteceu. Algo estranho, até por estar no Brasil a maior colônia japonesa no mundo, já na terceira geração.
Comparado à presença maciça de multinacionais dos EUA e ascendente da China, o Japão S/A no Brasil é um anão. A Toyota, que está para o Japão como a Coca-Cola para os EUA, é só a sexta ou sétima maior montadora no Brasil em vendas. Empresas da vizinha Coreia do Sul, economia pujante, mas muito menor, têm sido mais ativas.
Parceria geoestratégica
O alheamento japonês pode começar a mudar. Mas bem de acordo com o ritmo oriental: datam de 2004, no governo Lula, as primeiras ações para o resgate da parceria estratégica com o Japão. Coutinho viajou a Tóquio duas vezes ao ano, desde 2007, aproximando o BNDES do JBIC (Japan Bank for International Cooperation), veículo do investimento privado e institucional japonês. Dois movimentos podem ter servido para se passar das discussões para o exame concreto de negócios.
A seleta de concessões de ativos de logística, além do megabloco de Libra, no pré-sal, é a oportunidade imediata. O desastre nuclear de Fukushima, conflitos com a China e o envelhecimento da população orientam o sentido geoestratégico da reaproximação com o Brasil.
Visão para pensar grande
Ainda que em passant, os empresários indagaram sobre os protestos de junho e os movimentos recentes do câmbio e inflação. Falaram de impostos não para criticar o tamanho da carga tributária, mas para estranhar a enorme complexidade e burocracia. Assinamos embaixo.
A questão a destacar é que os integrantes do Grupo de Notáveis (ou Sábios) do Comitê de Cooperação Japão-Brasil – formado entre outros pela Mitsui, Nippon, Toyota, Ishikawagima (sócio de tecnologia do Estaleiro Atlântico Sul), Panasonic –, vieram com uma postura pouco comum nestes tempos de desconfiança com a economia e de resultados medíocres: abstrair o curto prazo, olhar longe e pensar grande. E o que eles veem? Progresso, se não tropeçarmos nas próprias pernas.
Logística radicalizada
A visão japonesa do pré-sal, por exemplo, parece futurista, mas é a radicalização da logística de acesso às plataformas a mais de 300 quilômetros mar adentro, muito além da autonomia dos helicópteros.
A proposta, acompanhada de projeto, financiamento e investimento: navios como plataformas flutuantes, servindo de heliporto, tancagem e alojamento remoto. Lanchas rápidas, navegando a 45 nós (83km) e com capacidade para 300 passageiros, ligariam as plataformas. Os custos, segundo essa ideia, baixariam, e a segurança aumentaria.
É o caminho: planejar e executar. Não se pode é ficar pensando na morte da bezerra, algemando as decisões devido às eleições de 2014, a crendices ideológicas, a barganhas dos partidos. E, agora, também à indecisão do Federal Reserve sobre quando o laxismo monetário vai refluir. O Fed pensa, enquanto as moedas mundo afora desmoronam.
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