domingo, 15 de setembro de 2013

Autismo e psicanálise - Leitores debatem tratamento psicanalítico do autismo

Nilde Jacob Parada Franch: Autismo e psicanálise

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Tendências / DebatesO autismo vem se tornando um dos mais graves problemas de saúde pública no Brasil.
Hoje, estima-se que uma em cada cem crianças apresenta o transtorno. Há 15 anos, os dados indicavam um caso em cada 2.000 crianças. Ainda que os critérios de diagnóstico tenham mudado, os especialistas reconhecem que houve aumento do número absoluto de casos.
Políticas em saúde mental infantil são uma preocupação relativamente recente, mesmo com índices crescentes de transtornos em crianças e adolescentes. Neste ano, importantes conquistas foram obtidas em termos legais, e a perspectiva de que o tratamento oferecido pelo Estado contemple abordagens psicológicas distintas é cada vez maior, o que configura enorme progresso.
Alguns desses avanços resultaram também da iniciativa de psicanalistas que se mobilizaram para tornar o autismo pauta do dia e para impedir que o seu método deixasse de ser utilizado nos Centros de Atenção Psicossocial (Caps), sob o argumento da "falta de cientificidade".
Em São Paulo, o Movimento Psicanálise, Autismo e Saúde Pública (MPASP) é um dos mais importantes no comando dessa iniciativa, dirigindo-se aos profissionais e aos gestores públicos da saúde a fim de incentivar a pluralidade de abordagens científicas e a oferta de um tratamento interdisciplinar das pessoas com autismo e suas famílias.
Apesar disso, chama a atenção como as grandes mídias ignoram a psicanálise, que tem, sim, muito a contribuir em termos de diagnóstico e tratamento. Programas televisivos recentes não disponibilizaram à população um rol completo de informações sobre o tema, enfocando apenas uma das formas de compreender o transtorno.
A perspectiva psicanalítica é uma valiosa abordagem para uma gama enorme de transtornos psíquicos e com o autismo não é diferente. Seu instrumental clínico possui reconhecimento em diversos centros de cuidado e deve ser integrado em nossas políticas públicas de saúde.
Sobre os métodos de tratamento, o que mais se vê em reportagens sobre o tema é o comportamental, com abordagens em torno de "dar independência" à criança, ensinar tarefas simples e "controlar a agressividade". Raramente se fala sobre o tratamento ter como foco a criança e seu bem-estar, simples assim.
A ênfase na necessidade de a criança autista se enquadrar em um modelo de comportamento tido como normal prevalece, deixando de lado a busca pelos sentidos que os sintomas expressam e que ajudam a compreender o papel da doença não apenas para a criança, mas também para a sua família.
A psicanálise compreende que o autismo está ligado a uma dificuldade de a criança se relacionar com a outra pessoa como um outro. E daí surgem consequências como os rituais autísticos, cuja função é manter o seu isolamento e impedir as trocas sociais.
Um aspecto central é a importância do diagnóstico precoce. Quanto mais cedo o transtorno é identificado, melhores os resultados do tratamento, já que é possível evitar que modos desviantes de funcionamento se cristalizem.
Em relação ao tratamento, o método psicanalítico se ocupa da estrutura mental e é pensado para trazer a criança para o contato, reduzir seu isolamento. Ainda que ela pareça muitas vezes estranha e inacessível, o que se busca é encontrá-la onde ela estiver e trazê-la ao convívio.
A Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, que conta com dois grupos de estudos integrantes do MPASP, reconhece a complexidade do assunto, estimula o diálogo com outras abordagens e contribui na articulação de novas propostas para a saúde pública infantil.
Ignorar a psicanálise como método para detecção e tratamento do autismo é privar as famílias de um instrumental científico que pode, em muito, abreviar o caminho para um diagnóstico definitivo e proporcionar um tratamento de qualidade.
NILDE JACOB PARADA FRANCH, 77, é presidente da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo


Leitores debatem tratamento psicanalítico do autismo

Considero de extrema relevância que um veículo como esse possa abrir espaço para o debate de ideias no campo científico em torno da questão do Autismo, e, sobretudo que isso se dê no tempo em que se discute a implementação de uma rede de atenção a pessoa com autismo como política nacional.
A longa experiência da psicanálise nesta clínica demonstra a cada dia que neste campo só temos podido avançar por via da interdisciplinaridade.
As formulações da ciência médica acerca da plasticidade neuronal e da epigenética, por exemplo, situam de modo vigoroso a importância --também confirmada pela clínica psicanalítica-- de que as intervenções clínicas sejam realizadas desde que os primeiros indícios de vulnerabilidade e risco de sofrimento psíquico são descobertos. Para tanto, o amplo debate deve ser sustentado no campo científico e a população deve ser legitimamente informada de maneira a garantir o direito de escolha sobre o modo de tratar seus filhos.
ILANA KATZ, PSICANALISTA (São Paulo, SP)
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A carta do leitor Luis Celso Vilanova, do dia 14/09, é mais uma das inúmeras tentativas de desqualificar a psicanálise como uma linha da abordagem das pessoas com autismo. Ele não apresenta nenhum critério clínico ou teórico para refutar os argumentos apresentados pelo artigo de Nilde Jacob Parada Franch.
O leitor parece desconhecer as inúmeras publicações psicanalíticas sobre o tema e o consenso internacional sobre o benefício produzido por tratamentos que consideram como questão central a subjetividade e intervém na ampliação das possibilidades de circulação familiar, escolar, social e cultural dessas pessoas.
No Brasil, o Movimento Psicanálise Autismo Saúde Pública (MPASP) conta hoje com 500 profissionais representando 100 instituições, entre as quais se encontram as mais prestigiadas universidades do país, instituições psicanalíticas de diferentes filiações teóricas e organizações não governamentais. Seus integrantes atendem, pesquisam e teorizam sobre essa clínica e estão abertos para o diálogo interdisciplinar que a complexidade desses casos requer. Precisamos pensar em benefício dos pacientes e suas famílias no lugar de defender interesses corporativos transvestidos de argumentos científicos.
ADELA STOPPEL DE GUELLER, Professora de Psicanálise da Criança do Instituto Sedes Sapientiae (SÃO PAULO, SP)
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O autismo não é propriedade privada de nenhuma área de conhecimento e está no processo civilizatório com todo seu "mal-estar". E a Psicanálise não abre mão de incluí-lo nas suas perspectivas teóricas, metodológicas, clínica e políticas.
Será que 'não cai a ficha' de alguns profissionais da Saúde? A Psicanálise já foi absorvida pela cultura. Isso não está mais em discussão. E, por isso mesmo, ela não pode excluir a pessoa com autismo, assim como a educação, a saúde e a política não o fazem. Essas áreas estão se virando, cada uma a seu modo, para fazer as crianças e adolescentes responderem aos seus tratamentos. É isso que está em jogo e não a desqualificação de uma ou outra área.
MARIA NOEMI DE ARAUJO, DOUTORA EM EDUCAÇÃO E PSICANÁLISE (SÃO PAULO, SP)

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