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Nas águas da bossa
Autor de O barquinho, músico vai receber Prêmio de Excelência Musical nos EUA em novembro
Ailton Magioli
Estado de Minas: 15/09/2013
Roberto Menescal e sua guitarra em meio às bromélias que cultiva em sua casa no Rio de Janeiro |
Em momentos de transição, não se deve falar em crise da indústria
fonográfica, mas em mudanças. “Afinal, o CD não vai ficar aí mais um
século”, justifica Roberto Menescal, o compositor, instrumentista e
produtor capixaba que fez história na MPB, a ponto de ser carinhosamente
chamado de “a Ivete Sangalo da bossa nova”, tamanha é a popularidade
dele no gênero.
“Agora começa a fase da venda de música pela internet. Nos Estados Unidos, a venda digital já passou a do disco físico. No Brasil, talvez isso já aconteça no fim do ano que vem”, prevê. Aos 75 anos, em plena atividade, Menesca, como é conhecido entre os mais íntimos, tem compromisso agendado para 20 de novembro, no Four Seasons Hotel Las Vegas, dos Estados Unidos, onde será um dos sete distinguidos com o Prêmio à Excelência Musical (Life Achievement), da Academia Latina de Gravação.
Entregue na véspera do 14º Grammy Latino, o prêmio é realizado em cerimônia da qual participam membros da academia, além de convidados, jornalistas, executivos da indústria musical e premiados, entre os quais Menescal é o único brasileiro. “Na verdade, estou um pouco surpreso. E a surpresa se torna ainda maior porque não sei exatamente o que vai acontecer no dia”, reage Roberto Menescal, lembrando que, como a programação prevê cinco dias em Los Angeles, é provável que ele tenha algo para fazer, além de participar da entrega da premiação.
"Recebo esse prêmio como mais um presente importante e com muita surpresa", reforça. De acordo com o artista, tudo o que ele faz na música e pela música é de forma natural, sem pensar em recompensas. “Mas, quando chega um reconhecimento como este, fico muito feliz", acrescenta Menescal. O produtor que acompanha a revolução por que passa a indústria musical há pelo menos meio século – do disco de 78 rotações ao CD de hoje, passando pelo LP e K7 – lembra que tecnologias do tipo iPod, por meio das quais se ouve música com qualidade inferior, são passageiras e serão substituídas em breve.
“Sempre foi assim”, constata o compositor, instrumentista e produtor, que se profissionalizou na área aos 18 anos, quando tocava violão havia apenas um. “A Silvinha Telles foi de uma coragem incrível”, recorda do convite da cantora, que, grávida de três meses, o convocou para excursionar pelo Brasil, de Manaus ao Rio. “Já cheguei ao Rio profissional”, revela, surpreso, ainda hoje.
Cria de família na qual não havia um músico sequer – hoje o filho Márcio é contrabaixista do grupo Bossacucanova –, Menescal não se esquece de outra lição do início da trajetória. “Ia prestar vestibular para arquitetura e conheci Tom Jobim: ‘Mas você não quer ser músico?’, perguntou-me o maestro, para a seguir me aconselhar: ‘Larga esta bobagem e vai ser músico’.”
No dia seguinte, obedecendo à ordem do mestre, deixou de lado a ideia de fazer faculdade, assumindo-se músico. Daí para a composição foi questão de tempo. Só ao lado do parceiro mais constante, Ronaldo Bôscoli (1928-1994), Menescal contabiliza 350 composições, entre as quais estão alguns clássicos da bossa. “Todas basicamente gravadas.”
Na produção, apesar do recorde da série Aquarela brasileira, de Emílio Santiago, que rendeu sete discos, com mais de 6 milhões de cópias vendidas, o sucesso veio mesmo com as mulheres. Além de vários discos de Elis Regina, que, mesmo não sendo uma campeã de vendas (a média de cada lançamento dela era de 200 mil cópias), fazia sucesso retumbante nos palcos, Menescal produziu os dois discos de maior vendagem de Gal Costa: Gal tropical e Aquarela do Brasil – Gal Costa canta Ary Barroso, ambos com cerca de 1 milhão de cópias vendidas.
Sempre perto das estrelas
Verdade que Roberto Menescal também fez sucesso na seara masculina. Que o diga Chico Buarque, para o qual produziu Construção. Além, é claro, de Emílio Santiago com o estrondoso sucesso da série Aquarela brasileira. Com Ivan Lins (Jobiniano) e Bossacucanova (Brasilidade), foi indicado ao Grammy Latino.
Mas a consagração veio mesmo com as mulheres. “Bôscoli gostava de dizer que sou um tremendo rabo de cometa, por estar sempre atrás de uma estrela”, diverte-se o próprio Menescal, admitindo tratar-se apenas de coincidência. “Nunca saí atrás das cantoras”, reconhece o músico e produtor, que ainda teve sob sua responsabilidade musas como Nara Leão, Leila Pinheiro, Wanda Sá, Maria Bethânia e Cris Delanno, entre outras.
A mais recente descoberta de Roberto Menescal é a jovem pernambucana Andrea Amorim (Bossa de alma nova), que, antes de se tornar sua parceira, cantar e gravar bossa nova, era conhecida como a Nina Hagen do Nordeste.
Além de um disco de Leny Andrade cantando Roberto Carlos, em espanhol, e outro de Wanda Sá cantando Tom Jobim, em inglês, ele produziu recentemente a norte-americana Stacey Kent, cantando jazz, incluindo Agarradinhos, de sua autoria. Duas cantoras japonesas e uma italiana também estão na lista do produtor.
Só ao Japão, vale lembrar, Menescal já foi 30 vezes, desde a primeira viagem, em 1985, com Nara Leão. “É o melhor público do mundo. Eles nos tratam com um respeito”, diz o produtor, que há 15 anos criou selo próprio (Albatroz Discos), por meio do qual já lançou 250 discos.
Bromélias
Casado há 50 anos, pai de três filhos e avô de cinco netos, nas horas de lazer Menescal cuida dos cerca de 1,5 mil espécimes de bromélias que cultiva em sua casa, na Barra da Tijuca. Nascido em Vitória (ES), aos 3 anos ele se mudou para o Rio de Janeiro, onde morou no Jardim Botânico e Copacabana, antes da mudança para a Barra. O artista, que sempre curtiu orquídeas, em 1985 passou a se dedicar às bromélias, diante da desproteção e da importância da espécie para a natureza.
ROBERTO MENESCAL
EM DISCOS
A galeria do Menescal (2012)
United Kingdom of Ipanema, com Andy Summers (2011)
Declaração, com Wanda Sá (2010)
Os Bossa Nova, com Carlos Lyra, Marcos Valle e João Donato (2008)
Bossa jam (2007)
Swingueira, com Wanda Sá (2006)
Agarradinhos, com Leila Pinheiro (2006)
Balansamba (2005)
Eu e Cris, com Cris Delanno (2003)
Brasilidade, com Bossacucanova (2001)
Bossa entre amigos, com Wanda Sá e Marcos Valle (2001)
40 anos cheio de bossa (2001)
A música brasileira deste século por seus autores e intérpretes (2000)
Bossa evergreen (2000)
Estrada Tokyo-Rio, com Wanda Sá (1998)
Uma mistura fina, com Wanda Sá e Miele (1997)
Eu e a música, com Wanda Sá (1995)
Ditos & feitos (1992)
Roberto Menescal (1991)
Um cantinho, um violão, com Nara Leão (1985)
O conjunto de Roberto Menescal (1969)
A nova bossa de Roberto Menescal (1968)
Surf board – Roberto Menescal e seu Conjunto (1966)
Bossa nova – Roberto Menescal e seu Conjunto (1966)
Bossa session, com Silvinha Telles, Lúcio Alves e Roberto Menescal e seu Conjunto (1964)
A bossa nova de Roberto Menescal e seu Conjunto (1963) – Elenco – LP
Bossa é bossa (1959) – Compacto simples
LIVROS
O barquinho vai... Roberto Menescal e suas histórias, de Bruna Fonte, Irmãos Vitale
Essa tal de bossa nova, de Bruna Fonte, Editora Prumo
Roberto Menescal Songbook, Souza Lima
E CINEMA
Com dois convites para cinebiografia, Roberto Menescal fica receoso de ver a sua vida e obra romanceadas. O primeiro vem de um diretor de São Paulo, cujo nome e projeto, inspirado em livro de Bruna Fonte, ele prefere manter sob sigilo. Já o segundo convite é de um produtor do Canal Brasil, onde o artista fez três anos de Letras brasileiras, com Oswaldo Montenegro, que resultou em 39 programas e três CDs. O projeto resultaria em documentário biográfico dirigido por Paulo Henrique Fontenelle, o mesmo de Loki – Arnaldo Baptista.
“Agora começa a fase da venda de música pela internet. Nos Estados Unidos, a venda digital já passou a do disco físico. No Brasil, talvez isso já aconteça no fim do ano que vem”, prevê. Aos 75 anos, em plena atividade, Menesca, como é conhecido entre os mais íntimos, tem compromisso agendado para 20 de novembro, no Four Seasons Hotel Las Vegas, dos Estados Unidos, onde será um dos sete distinguidos com o Prêmio à Excelência Musical (Life Achievement), da Academia Latina de Gravação.
Entregue na véspera do 14º Grammy Latino, o prêmio é realizado em cerimônia da qual participam membros da academia, além de convidados, jornalistas, executivos da indústria musical e premiados, entre os quais Menescal é o único brasileiro. “Na verdade, estou um pouco surpreso. E a surpresa se torna ainda maior porque não sei exatamente o que vai acontecer no dia”, reage Roberto Menescal, lembrando que, como a programação prevê cinco dias em Los Angeles, é provável que ele tenha algo para fazer, além de participar da entrega da premiação.
"Recebo esse prêmio como mais um presente importante e com muita surpresa", reforça. De acordo com o artista, tudo o que ele faz na música e pela música é de forma natural, sem pensar em recompensas. “Mas, quando chega um reconhecimento como este, fico muito feliz", acrescenta Menescal. O produtor que acompanha a revolução por que passa a indústria musical há pelo menos meio século – do disco de 78 rotações ao CD de hoje, passando pelo LP e K7 – lembra que tecnologias do tipo iPod, por meio das quais se ouve música com qualidade inferior, são passageiras e serão substituídas em breve.
“Sempre foi assim”, constata o compositor, instrumentista e produtor, que se profissionalizou na área aos 18 anos, quando tocava violão havia apenas um. “A Silvinha Telles foi de uma coragem incrível”, recorda do convite da cantora, que, grávida de três meses, o convocou para excursionar pelo Brasil, de Manaus ao Rio. “Já cheguei ao Rio profissional”, revela, surpreso, ainda hoje.
Cria de família na qual não havia um músico sequer – hoje o filho Márcio é contrabaixista do grupo Bossacucanova –, Menescal não se esquece de outra lição do início da trajetória. “Ia prestar vestibular para arquitetura e conheci Tom Jobim: ‘Mas você não quer ser músico?’, perguntou-me o maestro, para a seguir me aconselhar: ‘Larga esta bobagem e vai ser músico’.”
No dia seguinte, obedecendo à ordem do mestre, deixou de lado a ideia de fazer faculdade, assumindo-se músico. Daí para a composição foi questão de tempo. Só ao lado do parceiro mais constante, Ronaldo Bôscoli (1928-1994), Menescal contabiliza 350 composições, entre as quais estão alguns clássicos da bossa. “Todas basicamente gravadas.”
Na produção, apesar do recorde da série Aquarela brasileira, de Emílio Santiago, que rendeu sete discos, com mais de 6 milhões de cópias vendidas, o sucesso veio mesmo com as mulheres. Além de vários discos de Elis Regina, que, mesmo não sendo uma campeã de vendas (a média de cada lançamento dela era de 200 mil cópias), fazia sucesso retumbante nos palcos, Menescal produziu os dois discos de maior vendagem de Gal Costa: Gal tropical e Aquarela do Brasil – Gal Costa canta Ary Barroso, ambos com cerca de 1 milhão de cópias vendidas.
Menescal com Oscar Castro Neves, Luiz Eça, Alaíde Costa e Olívia Hime, em 1960 |
Sempre perto das estrelas
Verdade que Roberto Menescal também fez sucesso na seara masculina. Que o diga Chico Buarque, para o qual produziu Construção. Além, é claro, de Emílio Santiago com o estrondoso sucesso da série Aquarela brasileira. Com Ivan Lins (Jobiniano) e Bossacucanova (Brasilidade), foi indicado ao Grammy Latino.
Mas a consagração veio mesmo com as mulheres. “Bôscoli gostava de dizer que sou um tremendo rabo de cometa, por estar sempre atrás de uma estrela”, diverte-se o próprio Menescal, admitindo tratar-se apenas de coincidência. “Nunca saí atrás das cantoras”, reconhece o músico e produtor, que ainda teve sob sua responsabilidade musas como Nara Leão, Leila Pinheiro, Wanda Sá, Maria Bethânia e Cris Delanno, entre outras.
A mais recente descoberta de Roberto Menescal é a jovem pernambucana Andrea Amorim (Bossa de alma nova), que, antes de se tornar sua parceira, cantar e gravar bossa nova, era conhecida como a Nina Hagen do Nordeste.
Além de um disco de Leny Andrade cantando Roberto Carlos, em espanhol, e outro de Wanda Sá cantando Tom Jobim, em inglês, ele produziu recentemente a norte-americana Stacey Kent, cantando jazz, incluindo Agarradinhos, de sua autoria. Duas cantoras japonesas e uma italiana também estão na lista do produtor.
Só ao Japão, vale lembrar, Menescal já foi 30 vezes, desde a primeira viagem, em 1985, com Nara Leão. “É o melhor público do mundo. Eles nos tratam com um respeito”, diz o produtor, que há 15 anos criou selo próprio (Albatroz Discos), por meio do qual já lançou 250 discos.
Bromélias
Casado há 50 anos, pai de três filhos e avô de cinco netos, nas horas de lazer Menescal cuida dos cerca de 1,5 mil espécimes de bromélias que cultiva em sua casa, na Barra da Tijuca. Nascido em Vitória (ES), aos 3 anos ele se mudou para o Rio de Janeiro, onde morou no Jardim Botânico e Copacabana, antes da mudança para a Barra. O artista, que sempre curtiu orquídeas, em 1985 passou a se dedicar às bromélias, diante da desproteção e da importância da espécie para a natureza.
ROBERTO MENESCAL
EM DISCOS
A galeria do Menescal (2012)
United Kingdom of Ipanema, com Andy Summers (2011)
Declaração, com Wanda Sá (2010)
Os Bossa Nova, com Carlos Lyra, Marcos Valle e João Donato (2008)
Bossa jam (2007)
Swingueira, com Wanda Sá (2006)
Agarradinhos, com Leila Pinheiro (2006)
Balansamba (2005)
Eu e Cris, com Cris Delanno (2003)
Brasilidade, com Bossacucanova (2001)
Bossa entre amigos, com Wanda Sá e Marcos Valle (2001)
40 anos cheio de bossa (2001)
A música brasileira deste século por seus autores e intérpretes (2000)
Bossa evergreen (2000)
Estrada Tokyo-Rio, com Wanda Sá (1998)
Uma mistura fina, com Wanda Sá e Miele (1997)
Eu e a música, com Wanda Sá (1995)
Ditos & feitos (1992)
Roberto Menescal (1991)
Um cantinho, um violão, com Nara Leão (1985)
O conjunto de Roberto Menescal (1969)
A nova bossa de Roberto Menescal (1968)
Surf board – Roberto Menescal e seu Conjunto (1966)
Bossa nova – Roberto Menescal e seu Conjunto (1966)
Bossa session, com Silvinha Telles, Lúcio Alves e Roberto Menescal e seu Conjunto (1964)
A bossa nova de Roberto Menescal e seu Conjunto (1963) – Elenco – LP
Bossa é bossa (1959) – Compacto simples
LIVROS
O barquinho vai... Roberto Menescal e suas histórias, de Bruna Fonte, Irmãos Vitale
Essa tal de bossa nova, de Bruna Fonte, Editora Prumo
Roberto Menescal Songbook, Souza Lima
E CINEMA
Com dois convites para cinebiografia, Roberto Menescal fica receoso de ver a sua vida e obra romanceadas. O primeiro vem de um diretor de São Paulo, cujo nome e projeto, inspirado em livro de Bruna Fonte, ele prefere manter sob sigilo. Já o segundo convite é de um produtor do Canal Brasil, onde o artista fez três anos de Letras brasileiras, com Oswaldo Montenegro, que resultou em 39 programas e três CDs. O projeto resultaria em documentário biográfico dirigido por Paulo Henrique Fontenelle, o mesmo de Loki – Arnaldo Baptista.
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