Estado de Minas: 05/09/2013
Não é novidade para a medicina que a pancreatite (inflamação crônica do pâncreas) pode evoluir e causar o desenvolvimento de câncer no órgão. O modo, entretanto, como ocorre a transformação para o tumor era desconhecido até agora. Pesquisadores da Clínica Mayo de Jacksonville, na Flórida, desvenderam o processo e acreditam que a descoberta abre novos meios para identificar pacientes com riscos de chegar ao câncer, além de viabilizar a utilização de medicamentos para a reversão do processo.
Publicado no The Journal of Cell Biology, o estudo explica a maneira como a pancreatite provoca a transformação de células acinares (responsáveis pela produção de enzimas digestivas) em células ductais (existentes no revestimento de dutos). A mudança dessas microestruturas faz com que elas passem por mutações que, por fim, podem resultar no desenvolvimento do tumor.
Ainda não se sabe por qual motivo ocorre a reprogramação das células, mas uma das explicações possíveis, de acordo com os pesquisadores, é que a produção de enzimas em um órgão danificado (função das células acinares) pode ser mais danoso ao pâncreas devido à inflamação. Apesar dessa lacuna, o autor principal do estudo, Peter Storz , bioquímico e biológo molecular, afirma que a descoberta é uma boa notícia, pois o processo pode ser reversível.
“Nós identificamos uma quantidade de moléculas envolvidas nessa via que podem ser o alvo no esforço para transformar essas novas células ductais de volta em células acinares, eliminando, com isso, o risco de desenvolvimento de câncer”, afirma. Ratos de laboratórios estão sendo usados para testar a eficácia de medicamentos na reversão do processo. Os medicamentos utilizados no teste já existem no mercado, o que possibilita, caso se confirme a eficácia deles para esses casos, que o tratamento e a prevenção do tumor sejam facilitados.
Prevenção Para desvendar o trajeto da inflamação até o início de um tumor, os pesquisadores analisaram o que acontece quando glóbulos brancos que consomem material estranho no organismo (os macrófagos) reagem a um pâncreas inflamado. A crença anterior, segundo Storz, era de que os macrófagos tinham a função de remover células danificadas do órgão. “Descobrimos que elas não são tão benignas assim. Percebemos que, na verdade, os próprios macrófagos provocam a transformação e criam a estrutura para o desenvolvimento do câncer”, declara.
Chefe de Centro de Oncologia do Hospital Universitário de Brasília (HUB), o especialista em cancerologia Sandro Martins afirma que o estudo revelou experimentalmente como a inflamação pode atuar na iniciação do tumor. Para Martins, a descoberta, de fato, pode auxiliar na prevenção do tumor e contribuir para que o tratamento da doença evolua. “O trabalho abre oportunidade de estudos experimentais sobre quimioprevenção. Pelo uso de drogas inibidoras das vias de sinalização implicadas, em tese, seria possível evitar o aparecimento do tumor pela interferência já na fase inicial”, diz.
O especialista explica, no entanto, que o processo de transformação das células sozinho não é etapa suficiente para o aparecimento do tumor. No caso do pâncreas, ainda não se sabe com clareza quais fatores são responsáveis pelas fases posteriores que levam ao aparecimento da doença. Segundo ele, a formação de câncer, em geral, acontece lentamente, podendo passar vários anos para que uma célula cancerosa se prolifere e dê origem a um tumor visível.
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