Vilhena Soares
Estado de Minas: 14/09/2013
Caranguejo, um exemplo de artrópode, grupo animal que mais cresceu durante a chamada explosão cambriana |
A teoria da evolução, elaborada por Charles Darwin no fim do século 19, defende que os animais encontrados hoje na Terra são resultado de um processo gradual de mudanças ocorridas em espécies mais antigas — alterações que ajudaram os seres a se adaptar às novas condições que foram surgindo, permitindo que seus grupos continuassem a existir. Apesar de amplamente aceitas, as ideias de Darwin pareciam, de acordo com alguns especialistas, ameaçadas por um período conhecido como explosão cambriana, ocorrido entre 490 milhões e 543 milhões de anos atrás e no qual um número muito grande de espécies surgiu no planeta.
O processo lento e gradual de evolução elaborado pelo naturalista britânico não parecia compatível com essa espécie de big bang da vida do Período Cambriano. Agora, no entanto, um estudo australiano afirma que a evolução como pensada por Darwin pode sim levar a momentos em que muitas formas de vida surgem de uma vez. No artigo, publicado na edição desta semana da revista especializada Current Biology, os cientistas analisam espécies de artrópodes e as mudanças que elas sofreram durante ao longo do tempo. A conclusão é de que a morfologia e os genes desses bichos evoluíram cinco vezes mais durante a explosão cambriana, velocidade considerada rápida, mas ainda assim compatível com a teoria.
Com a ajuda de registros fósseis e métodos de análise molecular, a equipe do biólogo evolucionista da Universidade de Adelaide Michael Lee analisou as diferenças anatômicas e genéticas de artrópodes vivos para determinar as taxas evolutivas do passado. “Os artrópodes são animais com exoesqueletos rígidos e pernas articuladas, tais como insetos, caranguejos, escorpiões e aranhas. Eles foram o grupo mais diverso durante a explosão cambriana e ainda são o grupo dominante atualmente”, explica Lee. “Por conta disso, os padrões evolutivos encontrados em artrópodes, muito provavelmente, se aplicam a todos os animais”, justifica.
Segundo Lee, os resultados tiram o argumento de quem prega que a evolução há cerca de 530 milhões de anos foi demasiadamente acelerada. “Nossos resultados mostram que a evolução aconteceu de modo moderadamente acelerado, que sustentado ao longo de algumas dezenas de milhões de anos, poderia ter produzido esse padrão”, destaca Lee.
Validação A professora do Laboratório de Biologia Evolutiva da Universidade de Brasília (UnB) Rosana Tidon, que não participou do estudo, diz que a pesquisa ajuda a validar ainda mais a teoria de Darwin. “Os mecanismos evolutivos que promoveram a explosão cambriana são os mesmos mecanismos darwinistas atuantes nos outros períodos (seleção natural atuando sobre variação biológica). A diferença é que essas mudanças foram intensificadas durante o Período Cambriano”, destaca a pesquisadora. “ Dessa forma, podemos explicar a explosão cambriana sob uma perspectiva darwinista. Não precisamos mais predizer que essa explosão foi o cume de um processo que se iniciou muito antes nem precisamos acionar mecanismos evolutivos desconhecidos para explicar a explosão. Esse trabalho suporta a teoria evolutiva de Darwin”, afirma a especialista.
Lee acredita que o estudo fornece uma nova visão a uma teoria antiga, sem se basear unicamente nos registros fósseis. “Essa descoberta representa uma nova forma de compreender a história e a evolução da vida na Terra, que usa informações bastante independentes do registro fóssil”, detalha. Para Tidon, da UnB, a aceleração constatada pelos cientistas deverá ser o foco de próximos estudos. “Fiquei pensando sobre possíveis razões que pudessem explicar essa aceleração nas taxas de mudanças. Os autores não falam sobre isso, mas certamente essa questão será objeto de pesquisas futuras”, acrescenta.
Migração prevista
Pesquisadores da Universidade de Princeton, nos Estados Unidos, acreditam ser possível usar a temperatura dos oceanos para prever os locais para onde os animais marinhos migrarão, o que pode ajudar a melhorar as políticas de preservação. Em um estudo publicado na revista Science, os especialistas observaram o comportamento de diversas espécies durante mudanças de temperatura ocorridas nas últimas décadas no litoral da América do Norte. Constatou-se, então, que os bichos mantiveram-se fieis a suas temperaturas preferenciais.
O biólogo Malin Pinsky, um dos autores do artigo, conta que o trabalho analisou o maior número possível de variações climáticas ao longo de quatro décadas. “Nós comparamos os movimentos de animais marinhos em 360 variações de temperatura. Descobrimos que as espécies responderam às mudanças de uma forma surpreendentemente previsível: eles seguiram suas temperaturas ‘preferidas’, cruzando o espaço marinho”, destaca o pesquisador.
De acordo com Pinsky, o trabalho mostra que pequenas mudanças climáticas, em locais distintos dentro de um grande território, também interferem na migração dos animais. “Nossa descoberta também sugere que as principais populações de peixes que alimentam o mundo estão deixando as águas tradicionais do oceano. Isso significa que tanto podem ser necessárias medidas de conservação como reservas marinhas em novos lugares. E que as reservas existentes podem, no futuro, proteger diferentes tipos de peixe do que tínhamos inicialmente previsto”, destaca.
Igor Schneider, biólogo e professor da Universidade Federal do Pará (UFPA), explica a importância da descoberta. “O aparentemente aleatório padrão de migração das espécies pode ser explicado e, portanto, previsto quando se leva em consideração a variação da velocidade da mudança climática em diferentes áreas”, diz. “Isso é importante, pois nos permite algo impossível anteriormente: prever o comportamento migratório de espécies de interesse para conservação ou de importância comercial dada uma mudança climática”, complementa. (VS)
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