terça-feira, 3 de setembro de 2013

Segunda chance para a Câmara‏

Liminar suspende efeitos da sessão que manteve o mandato de Donadon. Oposição quer cassação já, mas Alves aguardará a decisão final do Supremo


Maria Clara Prates, Diego Abreu e Adriana Caitano

Estado de Minas: 03/09/2013 



"A indignação cívica, a perplexidade jurídica, o abalo às instituições e o constrangimento que tal situação gera para os poderes constituídos legitimam a atuação imediata do Judiciário" - Luís Roberto Barroso, ministro do STF

Brasília – As orações do deputado federal Natan Donadon (sem partido-RO) para agradecer a manutenção de seu mandato pela Câmara, mesmo condenado a mais de 13 anos de prisão por improbidade administrativa e cumprindo pena no Complexo Presidiário da Papuda, no Distrito Federal, podem ter sido precoces. Ontem a alegria do parlamentar esbarrou em decisão liminar do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso que suspendeu os efeitos da sessão da Casa legislativa que o manteve no cargo. De acordo com o ministro, todo condenado em regime fechado que tenha que permanecer detido por prazo superior ao que lhe resta de mandato não pode exercer o cargo político. Por isso, a decisão da Câmara que manteve o mandato de Donadon seria inaplicável. Entretanto, a questão ainda depende de análise no plenário da Corte, em data indefinida.

A liminar tem potencial para provocar nova tensão não só entre o Supremo e a Câmara (veja quadro), mas também dentro da própria Casa legislativa. O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), ouviu da assessoria técnica que o melhor a fazer é aguardar a análise definitiva do caso pelo plenário do STF. À noite, ele divulgou nota sobre o caso, por meio da assessoria, e disse que “a Presidência da Câmara dos Deputados solicitará a urgente decisão do pleno do Supremo Tribunal Federal sobre o mérito da questão”. A oposição, no entanto, defende que a Mesa Diretora da Casa declare a perda do mandato de Donadon imediatamente.

Antes de Alves divulgar a nota, o líder do PSDB na Câmara, deputado Carlos Sampaio (SP), autor do mandado de segurança, avaliou que o presidente da Casa deveria cumprir a liminar de imediato. “Agora, sim, a Casa tem condições de rever seu erro (manter o mandato de Donadon) e corrigi-lo. O presidente tem de agarrar essa possibilidade, em uma medida que vai ao encontro do que espera a sociedade e restabelece um mínimo de credibilidade à Câmara”, afirmou o tucano. O líder do PPS, Rubens Bueno (PR), corroborou: “Como o STF já deu liminar suspendendo os efeitos de todo o processo de cassação, a Casa precisa agir rapidamente para impedir que essa situação de deputado presidiário se arraste”.

A bancada governista permanece em recuo estratégico. O líder do PT, José Guimarães (CE), deu respostas escorregadias sobre os efeitos da liminar de Barroso, mas sinalizou que, mesmo não concordando com o resultado da votação sobre a perda de mandato, é contra a mudança do que foi decidido pela maioria dos parlamentares. “Sou contra um Poder interferir no outro. Cada macaco no seu galho”, disse. “Não podemos descartar mudança de posição pelo plenário do STF a respeito de liminar de algum ministro. Isto já ocorreu outras vezes”, contemporizou o líder do governo, Arlindo Chinaglia (PT-SP), antes de dizer que não compactuaria “com decisão que apequenasse a Câmara, ainda que ela própria tenha se apequenado”.

Na liminar, Barroso alerta que sua decisão não cassa o cargo do parlamentar, atribuição que, segundo ele, cabe à Mesa da Câmara. No mandado de segurança protocolado no STF, o PSDB apontou como um erro o fato de a Câmara ter submetido o processo de cassação ao plenário, quando a Mesa deveria ter declarado diretamente a perda de mandato.

Fora da norma Barroso reconhece que a Constituição prevê como regra geral que cabe ao Legislativo a decisão sobre a cassação de parlamentar que sofrer condenação criminal transitada em julgado. No entanto, ele pondera que o caso não se enquadra na norma. “Essa regra geral, no entanto, não se aplica em caso de condenação em regime inicial fechado por tempo superior ao prazo remanescente do mandato parlamentar. Em tal situação, a perda do mandato se dá automaticamente, por força da impossibilidade jurídica e física de seu exercício”, destaca o ministro. O mandato de Donadon se encerra no começo de 2015, antes do prazo em que ele poderá obter progressão de regime, correspondente a um sexto da pena.

Donadon foi condenado em função de desvio de verbas da Assembleia Legislativa de Rondônia entre 1995 e 1998, pelos crimes de peculato e formação de quadrilha. Na quarta-feira, a Câmara manteve o mandato do parlamentar. Foram 233 a favor da cassação (24 a menos que o total necessário), 131 contra e 41 abstenções. Donadon, que está preso desde o dia 28 de junho, foi autorizado pela Justiça a se defender em plenário, ajoelhou-se e rezou, com as mãos para cima, em comemoração.



Gravidade moral e institucional


Brasília – Na liminar na qual suspende a decisão da Câmara de manter o mandato do deputado Natan Donadon (sem partido-RO), o ministro Luís Roberto Barroso justifica ter tomado a decisão com urgência pela “gravidade moral e institucional de se manterem os efeitos de uma decisão política que chancela a existência de um deputado presidiário, cumprindo pena de mais de 13 anos, em regime inicial fechado”. Ele destacou que a “indignação cívica, a perplexidade jurídica, o abalo às instituições e o constrangimento que tal situação gera para os poderes constituídos legitimam a atuação imediata do Judiciário”.

O entendimento do ministro de que Donadon não pode exercer o mandato por estar na cadeia não alcança três dos quatro parlamentares réus do julgamento do mensalão. Diferentemente de Donadon, que cumpre pena em regime fechado, os deputados José Genoino (PT-SP), Pedro Henry (PP-MT) e Valdemar Costa Neto (PR-SP) foram condenados ao regime semiaberto, o que permitiria que trabalhassem durante o dia. Nesse raciocínio, o único congressista ligado ao mensalão que teria que perder o mandato imediatamente seria João Paulo Cunha (PT-SP), cuja pena é de 9 anos e 4 meses de cadeia.

A liminar de Barroso vai ser submetida ao plenário do STF em data ainda indefinida. O ministro fixou prazo de 10 dias para que a Câmara e a Advocacia-Geral da União se manifestem sobre o caso. Durante o julgamento do processo do mensalão, em 2012, o STF havia estabelecido que caberia à Câmara apenas cumprir a cassação do mandato dos deputados condenados quando o processo fosse encerrado. No entanto, em agosto passado, com nova composição, o Supremo fixou, após condenar o senador Ivo Cassol (PP-RO) a uma pena de 4 anos e 8 meses em regime semiaberto, que cabe à Casa Legislativa deliberar sobre a perda do mandato. (DA)

Trombadas entre poderes

Julho de 2010


Ficha Limpa
Com a aprovação no Congresso do texto que barra a candidatura de políticos condenados por decisões colegiadas, a lei poderia ter entrado em vigor nas eleições de 2010, mas o STF considerou inconstitucional a validade da regra no mesmo ano em que foi criada – a norma entrou em vigor em 7 de junho, quatro meses antes do primeiro turno eleitoral. No Congresso, sobraram críticas à interpretação dos ministros. Os desencontros com a Corte já se vinham tornando repetitivos em relação à inelegibilidade de políticos desde 2008, quando o STF decidiu que os políticos que respondem a processos – chamados “fichas-sujas” – não poderiam ser impedidos de disputar a eleição.

Dezembro de 2013

Mensalão
O então presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), afirmou, em 18 de dezembro de 2012, que a Câmara dos Deputados deveria reagir ao que ele considerava "ingerência" do STF sobre o Parlamento, ao comentar a decisão de que haveria perda automática dos mandatos dos deputados condenados no processo do mensalão – João Paulo Cunha (PT-SP), Pedro Henry (PP-MT), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e, empossado depois, José Genoino (PT-SP). Ele avaliou que a Câmara deveria se preparar para impedir que o poder de cassação de deputados lhe fosse usurpado. O novo presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), acenou que deve cumprir a decisão do Supremo.

Janeiro de 2013

Fundo de Participação dos Estados
Às vésperas de deixar o comando do Congresso, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), afirmou que o Legislativo votaria no mês seguinte as novas regras de distribuição dos recursos do FPE se houvesse boa vontade dos parlamentares e dos partidos políticos. Na ocasião, o STF havia concedido 150 dias para o Legislativo resolver a questão. O ministro Ricardo Lewandowski, que presidia interinamente o Supremo na época, permitira, no dia anterior, que o FPE continuasse sendo pago, apesar de seu critério de distribuição ter sido considerado ilegal pelo próprio Supremo em 2010, até que os parlamentares votassem um novo critério de distribuição do fundo

Abril de 2013

Tribunais Regionais
Contra a orientação do governo, a Câmara dos Deputados aprovou a proposta de emenda constitucional (PEC) que cria mais quatro Tribunais Regionais Federais (TRFs) no país. O placar foi de 371 votos a favor e 54 contra. O presidente do STF, Joaquim Barbosa, trabalhou diretamente para evitar a aprovação da matéria, mas não obteve sucesso. Barbosa argumenta que a medida amplia os gastos da Justiça e não resolverá o problema de excesso de trabalho e chegou a dizer que os tribunais serão criados em resorts.

Partidos
O ministro do STF Gilmar Mendes determinou que fosse suspensa a votação no Senado do projeto de lei que prejudica a criação de novos partidos, com menos tempo de TV e menos verba do Fundo Partidário. Pela proposta, de autoria do deputado Edinho Araújo (PMDB-SP), os parlamentares que mudarem de partido no meio do mandato não poderão transferir o tempo de rádio e TV nem os recursos do Fundo Partidário da sigla de origem para a nova legenda, mecanismos vitais para o funcionamento eleitoral e financeiro das siglas

Projeto que submete o STF ao Congresso
O deputado federal Nazareno Fonteles (PT-PI) apresentou Proposta de Emenda Constitucional 33, que submete decisões da Corte ao crivo Congresso. A proposta foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara e gerou fortes reações do Judiciário. O ministro Marco Aurélio disse que a PEC seria “retaliação”" do Congresso. Gilmar Mendes defendeu que, se aprovada, “é melhor fechar o Supremo”, e Joaquim Barbosa, presidente da Corte, declarou que a proposta “fragilizaria a democracia”. A tramitação da PEC foi suspensa pelo presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN).


Vandalismo na cúpula
 (Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)


A cúpula que representa a Câmara no Congresso Nacional amanheceu pichada ontem, com a palavra “porcos”. O ato de vandalismo ocorreu durante e madrugada, mas ninguém foi detido. Um casal que passava próximo ao local chegou a ser abordado por policiais legislativos do Senado, mas, como não havia indícios de envolvimento da dupla na pichação, o homem e a mulher foram liberados. De acordo com o diretor da Coordenação de Polícia Judiciária da Câmara, Antônio Geraldo Martins, foi aberto boletim de ocorrência para apurar o caso. A pichação foi apagada no fim da manhã (foto), quando a cúpula foi pintada de branco por funcionários da Casa.

Nenhum comentário:

Postar um comentário