quinta-feira, 17 de outubro de 2013

À sombra da história‏

No Brasil, a política é míope em relação à atualidade mundial


Antonio Carlos de Albuquerque

Professor, economista, membro efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais

Estado de Minas: 17/10/2013 



A Revolução de 30, extinguindo a política do café com leite, revela outro lado, que entende aquele ano como o da construção do pensamento autoritário no Brasil e o futuro na perspectiva dos vencedores. O estado de São Paulo se levantou em 9 de julho de 1932, buscando, no apoio das elites mineira e gaúcha, as condições para derrubar Getúlio Vargas do poder, mas em três meses o estado paulista foi derrotado. No período, o governador de Minas era Benedito Valadares. As memórias de Valadares (1892 — 1973), em Tempos idos e vividos, apontam significativas transformações (1932 — 1945) para a análise dos destinos políticos do Brasil. No último capítulo, o memorialista escreveu: “No Planalto Central, sem o canto amenizador dos pássaros, ouvindo o vento uivante, fecho as janelas e repito com o poeta: o resto é silêncio.” Que experiência o mineiro Valadares acumulou que não valeria a pena explicitá-la? Trata-se de uma interrogação a ser ainda decifrada. A partir de 1990, o empresariado nacional verificou que houve o surgimento de novo paradigma na produção econômica, denominado pós-fordista. Essa reestruturação do capital buscando inovações organizacionais e tecnológicas se deu num processo de aumento da competição empresarial voltado para um mercado cada vez mais segmentado, gerando dilemas sérios na sociedade do trabalho. A elite política não compreendeu essa mudança. Foi míope e desinteressada. Dá-nos a entender que o país nunca experimentou os sentimentos de decadência como os outros.

No plano político, houve uma metamorfose nas ideologias conservadoras acreditando-se em força demiúrgica de visão paradoxal: modernização conservadora e desenvolvimentista. Ao que se vem assistindo na realidade brasileira nos últimos 10 anos — as materialidades são visíveis — não é o aparecimento de liderança política estruturada com base em um projeto novo de reformas. O que salta aos olhos é a manutenção de um processo de hostilidade permanente sobre a ideologia de modernização e a democracia.

 Paralelamente, a degradação da virtude republicana. Para a busca da verdade os detentores do poder se valem do que podemos denominar de loucura metódica. Ela acaba no maquiavelismo puro no qual os fins justificam os meios. Vai-se estabelecendo um tipo de burocracia pós-stalinista mantendo seus privilégios, enquanto a nação enfrenta todo tipo de obstáculos. Nesse ponto reside a dúvida para o reconhecimento com clareza de quem são os vencedores ou os vencidos nos últimos acontecimentos de mobilização da população nas cidades brasileiras.

De forma soberana, no contexto de paz ou de crise, a decisão do aprofundamento da realidade pertence ao Estado como unidade essencialmente política e deve fazê-lo para bem de todos. Mas não o fez, pois a articulação é desagregada dos objetivos nacionais e dos direitos individuais fundamentais estabelecidos na Constituição federal. O que Valadares teria nos escondido quando escreveu: “o resto é silêncio”? Não se concebe começar o Brasil do zero. Mas como suportar a destruição de todas as esperanças não realizando inclusive o que é possível? Haverá que se seguir na luta, sem o que não se resguardará a certeza da construção da democracia política, social e econômica. Nunca esteve tão apropriado o aforismo: “o preço da liberdade é a eterna vigilância”.

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