Zero Hora - 23/10/2013
A Ana me ligou no final da tarde de sexta: “E aí, você vem?”.
Eu não fazia ideia sobre o que ela estava falando. Foi então que a
Ana se deu conta de que eu não estava no Facebook, portanto, não sabia
da festa que a turma havia armado. Como eu não havia me pronunciado, ela
resolveu ligar para saber se eu estava viva.
O cerco está apertando. Antes, eu trocava e-mails com os amigos com
uma certa frequência, agora todos debandaram, só um ou outro lembra que
eu não estou nas redes sociais e faz a caridade de me manter informada
sobre o que acontece no universo.
Não tenho vontade de ter perfil em lugar algum (e mesmo assim tenho,
criados e postados por pessoas que não sei quem são). Instagram,
Twitter, WhatsApp, nada disso me seduz, não conseguiria tempo para esse
contato eletrizante. Ainda me custa compreender pessoas que deixam o
iPhone sobre a mesa do restaurante, que precisam fotografar cada minuto
vivido, que desmaiam quando esquecem o celular em casa. Eu deveria ter
me alistado na expedição de colonização de Marte, onde certamente eu me
sentiria menos deslocada do que aqui na Terra.
Mas não me alistei, então terei que me ajustar à nova ordem social do meu planeta.
Óbvio que a tecnologia não é a vilã da história, e sim o uso
obsessivo que se faz dela. Para quem tem autocontrole, esses gadgets são
fascinantes por seu dinamismo, modernidade, capacidade de agregação, de
agilização de tarefas, e ainda resolvem a questão do anonimato, com o
qual ninguém mais quer lidar. As redes transformaram palco e plateia
numa coisa só: todos são espectadores dos outros e ao mesmo tempo
possuem um holofote sobre si. Já que existir virou sinônimo de “quantos
me curtem”, a população mundial conseguiu um jeito de ficar quite com o
próprio ego.
É muito provável que eu estivesse nas redes caso não escrevesse
colunas em jornais. Como tenho esse canal de expressão semanalmente, não
me fazem falta outros. Ou não faziam. Estou nesse impasse agora: devo
mergulhar com mais profundidade no mundo virtual? Reconheço três
vantagens: acompanhar o que meus amigos andam tramando às minhas costas,
me atualizar com mais rapidez e oferecer aos meus leitores um perfil
oficial. Além de me sentir menos mumificada.
Será isso que chamam de “se reinventar”?
Ando cada vez mais próxima da filosofia budista, exalto a
desaceleração, prezo uma boa conversa, adoro ter tempo para meus livros,
meu silêncio, minhas caminhadas. Não sinto falta de saber mais, de ter
mais acesso à informação, de conhecer mais gente. Por outro lado, não
quero me isolar dos amigos nem ficar sem assunto com eles – e com o
mundo.
Que dúvida. Pela primeira vez, reflito sobre algo de que, numa era
em que se debate tudo, pouco se fala: o nosso direito de ser
indiferente.
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