sexta-feira, 15 de novembro de 2013

CARLOS HERCULANO LOPES » Por amor às frutas‏

CARLOS HERCULANO LOPES » Por amor às frutas 

 
Estado de Minas: 15/11/2013





Ao escritor uruguaio Eduardo Galeano, autor de As veias abertas da América Latina, livro que o tornou famoso na década de 1970, tomo emprestados o título desta crônica e um texto seu, com o mesmo nome, publicado no primeiro volume da trilogia Memória do fogo, na qual, num misto de poesia e espanto, conta a história do nosso continente, da era pré-colombiana à década de 1980, com todos os horrores e belezas que desde sempre fizeram parte da nossa realidade.

Mas essa breve “apropriação”, também por amor às frutas, tem uma razão de ser: em terras brasileiras, neste mês de novembro, estamos em plena safra de três maravilhas, que estão entre as melhores iguarias da Terra – manga, jabuticaba e abacaxi. De sabor inigualável, pelo menos para mim, essa última é uma fruta que supera todas as outras.

 Também pensou igual, pelos idos de 1514, em Santa Maria do Darién, onde hoje está o Panamá, o historiador espanhol Gonzalo Fernández de Oviedo quando os nativos lhe apresentaram algumas frutas do Novo Mundo que ele nem imaginava existir. Galeano, com talento e poesia, narrou assim esse encontro e as conclusões de Oviedo: “... A goiaba lhe parece muito superior à maçã. A fruta-de-conde é formosa e oferece uma polpa branca, aguada, de muito temperado sabor, que por muito que se coma não causa dano nem empanturra. O mamey tem um sabor de lamber os lábios e cheira muito bem. ‘Não existe nada melhor’, opina. Mas morde uma nêspera e lhe invade a cabeça um aroma que nem o almíscar iguala. ‘A nêspera é a melhor fruta’, corrige, e não se acha coisa que se lhe possa comparar. Descasca, então, um abacaxi. O dourado abacaxi cheira como gostariam de cheirar os pêssegos e é capaz de abrir o apetite de quem nem lembrava a vontade de comer. Oviedo não conhece palavras que mereçam dizer suas virtudes. Se alegram seus olhos, seu nariz, seus dedos, sua língua. ‘Esta supera todas’, sentencia, ‘como as plumas do pavão real resplandecem sobre as de qualquer ave’”.

Ao gosto de apreciar essa fruta, que com a devida distância do tempo me uniu a Gonzalo Oviedo, não teve a mesma sorte a minha linda amiga Mariana Peixoto, com quem tenho a alegria de trabalhar aqui no Estado de Minas. Mas por uma razão das mais justas: ela conta que, quando criança, na escola onde estudava, quase todos os dias, na hora do lanche, faziam-lhe descer goela abaixo, assim como a dezenas de outras meninas, um suco de abacaxi azedo e quente. “Como se não bastasse, ainda tínhamos de comer junto com ele uma rosca seca, de sabor horrível”, lembra. Em compensação, a manga, que ela também detestava, hoje está entre as frutas que mais aprecia. Não há uma vez que vá ao supermercado e deixe de levar pelo menos três mangas para casa. Nem tudo está perdido neste mundo.

>> carloslopes.mg@diariosassociados.com.br

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