quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Literatura em família - Carlos Herculano Lopes

Literatura em família
Luiz Fernando Emediato volta a publicar e lança livro ao lado dos filhos Fernanda e Antônio. Escritor e editor avalia o mercado e anuncia a adaptação de seus romances para o cinema
Carlos Herculano Lopes
Estado de Minas: 04/12/2013


Fernanda, Antônio Anselmo Emediato e Luiz Fernando Emeditato: unidos pelo amor aos livros (André Stefano/Divulgação )
Fernanda, Antônio Anselmo Emediato e Luiz Fernando Emeditato: unidos pelo amor aos livros

 (Geração/reprodução)

De uma geração de escritores que começou a fazer literatura em Belo Horizonte no início da década de 1970, à qual pertenciam, entre outros, Antônio Barreto, Jeferson de Andrade e Paulinho Assunção, Luiz Fernando Emediato, ao contrário dos seus colegas, parou de escrever aos 30 anos. Achava que não valia a pena continuar na luta. A partir daí, sempre vivendo em São Paulo, trabalhou em jornais, foi diretor de televisão, coordenou campanhas políticas e, em 1990, resolveu mudar mais uma vez: deixou o jornalismo e criou uma editora, a Geração Editorial, que está no mercado desde então, e atualmente tem seu foco voltado para a literatura de ficção, livros de reportagens e literatura infantojuvenil.

Só agora, aos 62 anos, Luiz Fernando Emediato resolveu voltar à ativa como escritor. Mas não veio sozinho. Chega acompanhado dos filhos Fernanda, de 30 anos, e Antônio Anselmo, de 8. Recentemente, eles lançaram em dose tripla, durante festa realizada em São Paulo, os livros Não passarás o Jordão – Tortura e morte na ditadura militar, que sai em nova edição revisada, e os infantis A menina perdida e Minha família, de autoria dos filhos. “Foi uma alegria grande. A Fernanda começou a escrever para se aproximar de mim e o Antônio vive no meio de livros desde que nasceu. O livro da Fernanda foi escrito quando ela era ainda adolescente e estava desaparecido. O do Antônio, ditado para mim quando ele tinha 6 anos , é um primor de bom humor e ironia. Esse menino vai longe”, brinca Emediato.

Se a família escreve unida, também trabalha unida. Na Geração Editorial desde os 14 anos, quando começou atuando como recepcionista, atualmente Fernanda Emediato é a diretora da empresa, em que ainda coordena o departamento voltado para a literatura infantojuvenil. “Quase tudo o que aprendi na editora foi com meu pai. Fui passando por quase todos os setores, o que me deu um grande know-how de como as coisas funcionam num universo como este. Sou muito grata a meu pai quando ele viu que eu estava preparada me deu parte da sociedade. Hoje, a Geração faz parte da minha vida”, diz.

Com a experiência adquirida ao longo dos anos, Fernanda diz que o lado mais difícil de trabalhar com livros não é tanto a parte editorial, mas a distribuição, principalmente em um país das dimensões do Brasil. No caso dos infantis e infantojuvenis, é mais problemático ainda. “Os espaços nas livrarias destinados ao segmento é muito pequeno. E o que possuímos temos que dividir e vamos perdendo feio para os livros de brinquedo, que têm pelúcia, bonecas, imagens 3D, todos impressos na China ou na Índia, o que permite que sejam vendidos aqui a preços mais baixos que os nossos. Se não fossem as compras feitas pelo governo, seria muito difícil continuar nesta área”, conta Fernanda.

Quanto ao fato de trabalhar com o pai, o que nem sempre é tarefa das mais fáceis, ela diz que, em certos assuntos, ele lhe dá bastante autonomia. Em outros, nem tanto. “Como somos de gerações diferentes, às vezes temos ideias opostas e nos confrontamos em alguns casos. Acabamos discutindo o assunto e, se eu não conseguir convencê-lo de que estou certa, a palavra final é dele. Mas nem por isso deixo de respeitá-lo, pois ele tem uma experiência muito grande”, diz Fernanda. 

 (Geração/reprodução)

Multifuncional Luiz Fernando, por uma série de compromissos, ultimamente tem aparecido pouco na editora, da qual hoje é uma espécie de consultor especial. Ele diz que acompanha tudo no dia a dia, via e-mail e Skype, além de telefonemas dados para a filha. “Hoje em dia, você pode fazer tudo sem sair de casa. Estou plugado 24 horas por dia, mas sou feliz assim. Meu cérebro é multifuncional, posso estar falando com alguma pessoa e lendo e-mails ao mesmo tempo”, conta Emediato. Sua palavra continua pesando na hora de decidir se um livro adulto será publicado.

A propósito, ele adianta que no início do ano que vem a editora vai lançar uma “obra monumental”, Os vencedores, do escritor gaúcho Ayrton Caetano. “São biografias que se cruzam, de uns 30 lutadores que foram esmagados pela repressão nos anos 1960/70 e hoje estão vitoriosos, no governo ou simplesmente na vida. Vamos lançar ainda uma reportagem-denúncia sobre um grande banqueiro e um bom pacote de livros mais variados. Tenho sentido falta de literatura brasileira. Gostaria muito de lançar mais autores jovens. Mas parece que essa turma prefere escrever em blogs”, diz.

Conseguir colocar livros de autores jovens nas livrarias e vendê-los é uma luta. “Vejo jovens promissores surgindo, como Daniel Galera, Luísa Gleiser, Michel Laub e Ana Martins Marques. Por outro lado, tem uma moçada nova tentando escrever romances policiais como Rubem Fonseca ou imitando autores de entretenimento estrangeiros, com histórias de vampiros, fadas, duendes, uma salada monstruosa, um conúbio de Tolkien com J. K. Rowling. Nada disso vai ficar”, acredita.
 (Geração/reprodução)

Tetralogia Quanto à volta para a literatura 32 anos depois, Emediato é pura animação. Retomou com toda a força um romance existencial e político que estava parado, no qual traz um personagem dos 1960 para nossos dias, tendo como pano de fundo meio século de história do Brasil. Tem se dedicado também ao cinema e para abril do ano que vem está prevista a estreia de O outro lado do paraíso, longa baseado na sua autobiografia. O filme, que terá como diretor André Ristum, que foi assistente de Bernardo Bertolucci em Beleza roubada, está orçado em R$10 milhões. “Pretendo que seja o primeiro de uma tetralogia que terá, na sequência Verdes anos, sobre a juventude alienada dos anos de 1970; Não passarás o Jordão, sobre os jovens que foram para a luta armada; e, finalmente, Perdição, que pegará os mesmos personagens já nos dias de hoje, na maturidade”, antecipa o escritor.

Sobre a oportunidade que teve de lançar um livro com os filhos, coisa que não é fácil de acontecer, Luiz Fernando Emediato, que atualmente, além da retomada literária, trabalha com consultoria para políticos e organizações sindicais, diz que valeu a pena. Mas faz uma ressalva: “No caso do Antônio, espero que ele não siga a carreira literária e procure outra coisa para fazer. É sofrimento demais”, conclui.

Não passarás o Jordão
De Luiz Fernando Emediato, contos,
224 páginas, R$ 34

A menina perdida
De Fernanda
Emediato, infantil,
24 páginas, R$ 29,90

Minha família
De Antônio Anselmo Emediato, infantil,
64 páginas, R$ 39,90

• Todos da Geração
Editorial. Informações: www.geracaoeditorial.com.br


Três perguntas para...

Luiz Fernando Emediato
escritor e editor

Como foi sua relação com Belo Horizonte?
Cheguei à cidade com 21 anos, trabalhei em um banco e estudei jornalismo na UFMG. Em BH escrevi e publiquei meus primeiros contos e aprendi a combater a ditadura com os escritores Benito Barreto, Roberto Drummond e outros, enquanto Murilo Rubião, nosso amigo e protetor, dava conselhos a que não obedecíamos.

Como você avalia o futuro da literatura em um mundo cada vez mais virtual?

A literatura sobreviverá, escrita por poucos e para poucos. Refiro-me à literatura de verdade. Quando aos livros de entretenimento, autoajuda, religião e misticismo, histórias românticas e eróticas, fantasias, distopias, policiais e coisas do gênero, esses também sempre existirão, seja no formato impresso, seja em e-book.

Por falar em e-books, eles deram certo? Estão vendendo bem?
No Brasil, ainda não. Nossa editora está entre as 10 que mais vendem e-books, mas isso significa 4% do faturamento. O problema aqui é o preço do aparelho leitor, o e-reader, e o do livro digital, que ainda é alto.

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