sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Carlos Herculano Lopes-Um homem feliz‏

Um homem feliz 
 
"Pouco mais de um ano depois da minha vinda para a capital, a alegria das alegrias: a Seleção Brasileira foi tricampeã" 
 
Carlos Herculano Lopes
Estado de Minas: 03/01/2014


Quando cheguei a Belo Horizonte, no fim de dezembro de 1968, portanto, há 45 anos, depois da viagem de caminhão que durou três dias e meio para vencer cerca de 380 quilômetros, chovia tanto que o Vale do Rio Doce, de onde vim, parecia que ia desaparecer, como ocorre agora.

A primeira coisa que me impressionou na capital, se bem me lembro (morava com os tios Neusa Beirão e Joaquim Aguiar, no Bairro da Serra, mas descia a pé para o Colégio Arnaldo), foram as enormes correntes que, no início da tarde, eram instaladas na Avenida Afonso Pena, da esquina com a Rua Aimorés até a Avenida Bernardo Monteiro, impedindo o trânsito. Um dia, sem conseguir conter a curiosidade, perguntei à tia Neusa o porquê daquilo. E ela me respondeu: “Ali é o Dops, onde ficam os presos políticos”.

Por aqueles tempos, o prefeito de BH se chamava Luiz de Souza Lima, e também me lembro de que algum tempo depois, pois os jornais e a televisão não falavam de outra coisa, mataram sua filha, Jô. O governador de Minas era Israel Pinheiro da Silva, que, como meu pai havia me contado, foi o engenheiro chefe da construção de Brasília. Sua mulher, dona Coraci, faleceu recentemente, já centenária. Durante o seu mandato – também nunca me saiu da memória –, ocorreu a tragédia do desabamento do Parque de Exposições da Gameleira, matando dezenas de operários.

Pouco mais de um ano depois da minha vinda para a capital, a alegria das alegrias: a Seleção Brasileira comandada por Zagalo foi tricampeã no México. O jogo final, contra a Itália, nós vencemos por 4 a 1. Alguns dias depois, na companhia de colegas do Arnaldo, fui à Avenida Afonso Pena receber os jogadores mineiros, que desfilaram em um caminhão do Corpo de Bombeiros. Entre eles estavam Tostão, Dario e Piazza, craques que nos anos seguintes teria o privilégio de conhecer.

Naquele dia em que o Brasil ganhou o tri, para melhorar ainda mais as coisas, o general Emílio Garrastazu Médici, presidente da República, decretou que os ônibus deveriam circular de graça. Fizemos a maior farra, andando de um lado para outro com as roletas liberadas. Poucos meses depois, na minha inocente adolescência, ajudei a recepcionar este homem, também na Afonso Pena, balançando bandeirinhas do Brasil enquanto papel picado caía dos prédios e bandas militares executavam hinos patrióticos.

Nos idos de 1968, quando tantas coisas aconteciam no mundo e cheguei a Belo Horizonte, de onde nunca mais saí, acabei me apaixonando por uma menina chamada Lílian, que estudava no Colégio Sacré-Coeur de Marie, também na Serra, colega da minha prima Maria Helena. Dona de imensos olhos verdes, dos quais não posso me esquecer, ela se mudou pouco depois com a família para Alagoas, para onde o pai, que era do Exército, havia sido transferido.

Jamais poderia imaginar que, tanto tempo depois de chegar a esta cidade que considero minha, iria poder, guardadas as devidas proporções (e por isso agradeço a Deus), me considerar um homem feliz, que hoje tem a alegria de desejar a todos os amigos e leitores um ótimo 2014. 

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