As duas mulheres
Carlos Herculano Lopes
carloslopes.mg@diariosassociados.com.br
Estado de Minas: 21/02/2014
Não conheci as duas
mulheres que há alguns dias foram atropeladas por um motoqueiro na
Avenida Getúlio Vargas, em frente ao Grupo Barão do Rio Branco, assim
como não sei (embora muitos amigos tenham sido mortos no trânsito) quem
são as dezenas de pessoas que, pelo mesmo motivo, ficam sequeladas ou
perdem a vida nas ruas e estradas deste país. Sair de viagem, seja qual
distância for, é como ir para a guerra: não podemos prever se voltaremos
vivos.
Mesmo não imaginando quem são as duas mulheres
atropeladas, talvez irmãs, pois se pareciam muito, condoí-me com aquela
cena, testemunhada por várias pessoas. Por acaso, eu passava pelo local.
Uma das vítimas, quem sabe a mais velha, estava encostada em uma árvore
com o rosto ensanguentado, enquanto a outra, em estado mais grave, era
atendida com muito cuidado pelo pessoal do Samu, que a imobilizava antes
de colocá-la na maca. O motoqueiro, com cara de quem não havia
entendido nada, conversava com um policial, que tomava nota na
caderneta. A moto, que tinha se estragado bastante, estava caída no
passeio com uma das rodas empenada.
Embora não tenha ideia de
quem eram as três vítimas – as duas mulheres deviam ter mais de 60 anos,
e o motoqueiro parecia bastante jovem –, doeu fundo ter presenciado
aquela tragédia, uma a mais entre centenas a engrossar as terríveis
estatísticas de acidentes de trânsito.
Uma das mulheres, a que
estava encostada na árvore, com o rosto cheio de sangue, tinha o olhar
perdido. Era como se não estivesse ali. Na hora, não sei por que,
pensei: por onde andarão os pensamentos desta senhora? Impossível saber.
Talvez estivessem voltados para os perdidos dias da infância em alguma
cidade desse vasto interior mineiro; para algum filho, que tinha ficado
em casa ou, quem sabe, não vivesse mais. Ou não desse à mãe a atenção
merecida. Ou, então, pela brutalidade de tudo aquilo, talvez a mulher
não estivesse pensando em nada.
E a outra? Estaria dando conta
de alguma coisa enquanto era socorrida pelo Samu? É provável que não,
pelo estado em que se encontrava. O motoqueiro, que certamente
trabalhava para alguma firma com rigorosos horários a cumprir, obrigado a
cobrir a cota diária de entregas senão o salário vinha ainda mais
minguado no fim do mês, estaria pensando em algo? Também não dá para
saber.
Mas a sentença contra ele, que tentava se explicar para o
policial, já havia sido dada por um homem de terno: “Esses caras são
uns loucos; era ele quem devia estar no lugar daquela pobre coitada”. E
apontou para a mulher, já dentro da ambulância, que saiu em disparada
com a sirene ligada na maior altura. A outra, que talvez fosse sua irmã,
começava a ser socorrida. Ainda assustado com tudo aquilo, segui meu
caminho. Estava atrasado para o trabalho.
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