Zero Hora 05/03/2014
Sofrer dá mais dignidade à existência do que alegrar-se. Chorar causa
uma comoção que o sorrir nem de longe atinge. Tudo o que impede a
felicidade possui uma fleuma poética e é mais respeitado, pois provoca
introspecção, exige o pensar-se. O.k., mas desde que não se prolongue o
coitadismo. O que tenho visto já é exagero. As pessoas têm tido uma
propulsão a emperrar, complicar e outras atitudes que interrompem o
andamento do curso da vida. E nessas atitudes não reside poesia alguma.
Tão mais simples seria cooperar. Abrir caminho. Facilitar.
Se as coisas estão nebulosas, converse. Se há dúvida no ar,
explique. Se há mágoas se acumulando, dissolva-as. É básico. Só que
muitos pensam que viver dessa forma é falta de imaginação. Não concebem a
rotina sem uma complicaçãozinha. Se limparem a área, o que farão? Como
ocuparão seu vazio?
Enquanto essa postura de autoboicote se restringir à vida pessoal de
cada um, vá lá. Não há como impedir alguém de ser infeliz, se é esse o
projeto para o qual a criatura tem vocação. Mas, em termos sociais, é
nosso dever colaborar.
Poderia dar inúmeros exemplos, mas fico com um atual, o da ampliação
do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Entendo a preocupação dos
ambientalistas em relação às 240 árvores que deverão ser cortadas para
erguer os dois novos prédios. Tenho certeza de que eles não são contra a
população que será beneficiada com mais leitos e com um ambulatório
maior. Apenas estão fazendo a parte deles, sendo coerentes com sua
ideologia. Mas nem sempre o certo e o errado estão em discussão. Às
vezes é o certo x o certo, como neste caso. Quem não seria a favor da
natureza? Árvores geram vida também. Quem deve ceder quando duas
posturas positivas entram em choque?
Da mesma forma, os embates amorosos quase sempre são a luta de um
certo contra outro certo. Ambos têm suas razões para ser como são,
pensar como pensam, acreditar no que acreditam. E, no entanto, um dos
dois terá que baixar a guarda para dar continuidade à relação – no caso
de haver o desejo mútuo de dar continuidade à relação, óbvio.
Enfrentamentos nunca são fáceis. No caso do hospital, parece claro
que a palavra que decide o caso é emergência. Saúde é um dos problemas
mais graves do Estado. Há dinheiro em caixa para o início da obra, o que
é um luxo neste país em que tudo é desviado para o bolso de alguns
poucos. As condições são propícias e a necessidade urge. É um acerto
maior versus um acerto menor. Cooperação é tudo o que se espera para que
a cidade possa ir adiante.
Aquele que cede pensa que perde. Mas não perde nada. Contribuirá à
sua maneira (não atrapalhar é contribuir) e exercitará a flexibilidade,
que sempre é sinal de inteligência.
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