quarta-feira, 18 de junho de 2014

Esculpidos pelo calor

Esculpidos pelo calor
Pesquisadores norte-americanos desenvolvem polímeros capazes de assumir formas predeterminadas quando aquecidos

Estado de Minas: 18/06/2014




A ideia de que uma chapa lisa de plástico pode assumir uma forma tridimensional complexa a partir de, somente, uma mudança de temperatura parece cena de filme. Se essa peça bruta tiver saído de uma impressora 3D, então, é com certeza ficção científica. Certo? Não – pelo menos no que depender de um grupo de professores de engenharia elétrica e ciência da computação do Massachusetts Institute of Technology (MIT) coordenado pela professora Daniela Rus. Em um estudo apresentado este mês na Conferência Internacional de Automação e Robótica do Instituto de Engenheiros Elétricos e Eletrônicos americano, a pesquisadora e colegas conseguiram sintetizar um polímero que, quando aquecido até determinada temperatura, assume uma forma predefinida.

O que difere a pesquisa das outras que já foram feitas sobre os materiais com memória de forma é justamente a precisão que a equipe conseguiu. A peça produzida no MIT se dobra nos ângulos certos para se tornar a figura planejada à medida que a temperatura sobe (veja infografia). “Temos que produzir as peças em camadas com densidades e características específicas. O objetivo é que cada parte reaja de determinada forma a partir do estímulo de calor e, com isso, assuma o aspecto predeterminado”, explica Daniela. A pesquisadora compara o processo de impressão do material à montagem de um bolo, cujas camadas também precisam ser cuidadosamente sobrepostas para que se atinja o objetivo. “A diferença está no fato de que, com esse polímero, conseguimos encontrar a temperatura ideal para que se ele deforme como o esperado”, lembra.

O grupo conseguiu distribuir as propriedades do material usado como matéria-prima de forma que, na região das dobras, o polímero se comporte mais como um líquido do que como sólido. “Quando a peça é aquecida até a temperatura certa, aqueles locais que deveriam ser arestas ficam menos rígidos e deformam-se”, esclarece a cientista. Esse estímulo é dado por somente frações de segundo e, quando a temperatura do objeto volta ao normal, as arestas formadas se resfriam e endurecem novamente. “Temos o grande sonho de construir pequenas fábricas de utilidades usando somente impressoras 3D e projetos que poderão ser comercializados pela internet. Você compra o material, coloca como se fosse a tinta da impressora, pega o projeto na internet e poderá construir o que quiser”, planeja Daniela Rus.

O uso da impressora 3D, inclusive, foi fator determinante para o sucesso do projeto. Essas máquinas constroem objetos a partir de camadas muito finas e detalhadas, o que é ideal para a diferença específica entre as densidades e as propriedades de cada uma das camadas. O processo, no entanto, só ocorreria uma vez.

Utilidade e limitações “Quando desestimulado, diferentemente dos conhecidos metais de memória, esse polímero não retorna ao estado inicial”, lembra o coordenador do Laboratório de Robótica e professor do Departamento de Engenharia Mecânica da PUC Rio, Marco Antônio Meggiolaro. Ele explica que esses materiais com memória de forma são usados há várias décadas, mas, na grande maioria das pesquisas, eram estudadas as características das ligas metálicas. Isso porque esses objetos são projetados para ser transportados de forma mais fácil e assuma a forma final apenas na hora e no local certos, geralmente de difícil acesso. Usos possíveis vão de próteses médicas – como stents que podem ser inseridos na artéria na forma plana e, depois de posicionados no lugar certo, ser expandidos – até estruturas maiores, como abrigos.

Para Meggiolaro, o fato de o material utilizado ser um polímero impõe algumas limitações ao projeto. “É claro que apresenta vantagens, como o peso menor, que poderia ajudar a diminuir custos com transporte, por exemplo, mas a baixa resistência do plástico restringe o uso”, alerta o professor, que não participou do estudo. Ele lembra que essas técnicas de estimular deformações em materiais a partir do conhecimento de suas características físicas já são utilizadas há anos, sendo a corrente elétrica uma alternativa ao estímulo de temperatura.

O material estudado e utilizado pela professora Daniela Rus e seus colegas do MIT acaba, de fato, restringindo o uso. Os metais de memória podem ser utilizados para se construir satélites, que são lançados fechados e, só depois de entrar em órbita, ganham o formato final. Se fosse de polímero, no entanto, o satélite não conseguiria nem chegar ao espaço.


Compostos químicos

Polímeros são compostos químicos de elevada massa molecular, resultantes de reações químicas de polimerização. A grosso modo, são todos os tipos de plásticos, que podem ser divididos entre termoplásticos (PVC), termorrígidos (poliéster) e elastômeros (borrachas).


Nitinol

Materiais com memória de forma são conhecidos desde 1962, quando foi descoberta uma liga metálica composta de níquel e titânio em porcentagens atômicas praticamente iguais, denominada nitinol. O material apresentava um efeito térmico de memória que conferia a capacidade de sofrer deformação em certa temperatura e, então, recuperar a forma original.

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