Zero Hora 29//06/2014
Quem viaja para um país exótico sempre acaba provando algum prato
estranho, fora do seu costume. Nem que seja para fotografar e postar
numa rede social com a legenda: sobrevivi.
Escorpião frito em Cingapura, morcego à caçarola no Vietnã, cérebro
de macaco na África, sopa de cachorro na Coreia do Sul, ou mesmo uma
iguaria chique e nem tão exótica, como o escargot francês – lesma, em
bom português. Nada disso mata, mas produz muita cara feia. Minto:
algumas refeições matam, sim – o baiacu venenoso da cozinha japonesa,
por exemplo. Por mais bem treinados que sejam os chefs que se habilitam a
preparar esse peixe, ainda assim 20 pessoas por ano dão adeus à vida
depois de ingeri-lo.
Pois o Brasil está tendo a chance de, simpaticamente, dar o troco.
Nunca recebeu tantos estrangeiros de uma só vez como no período da Copa,
e essa gente toda, de tantas partes do mundo, precisa se alimentar. A
caipirinha cai no agrado de todos, mas como eles estarão enfrentando os
sólidos? Vatapá não mata, só nocauteia. Buchada de bode dizem que também
não mata, mas duvido. E farofa de formiga costuma ser confundida com
farofa de amendoim, ou seja, os gringos não devem estar passando muito
trabalho no Norte e Nordeste, ao menos nada que se compare com a cena
que vi de uns australianos, aqui no Sul, encarando seu primeiro coração
de galinha.
“Vocês comem coração de galinha???? Oh, my God!”
Dizer a eles que chamamos carinhosamente de coraçãozinho não
minimizou o asco. Entendo: eu também não ficaria comovida se me
servissem um filezinho de cobra. Mas cobra é um réptil repugnante,
viscoso, traiçoeiro, já a galinha é uma criatura doméstica, pacífica,
rechonchuda. Mais arisca do que dócil, é verdade, mas nunca fez mal a
ninguém, logo, é tenro seu coraçãozinho.
Tentaram. Mas foi como se estivessem de frente para um olho de
cabra, um rabo de camundongo, o músculo de um gambá. Demonstraram
absoluto pavor em comer um coração, algo que ainda estava batendo dias
atrás, símbolo da paixão e da vida – mesmo de uma galinha.
Uns não tiveram coragem, outros tiveram e fizeram caretas tão
repugnantes e sofridas que chegou a me dar pena: coitados, não estava
sendo uma experiência cultural, e sim uma tortura impiedosa. Ok, acabou a
brincadeira, vamos pedir hot dog para todo mundo – e que ninguém venha
comentar as minúcias da fabricação de salsichas.
Dias atrás teve churrasco aqui em casa e vi meus dois pequenos
sobrinhos devorarem um quilo de coração sem dó, com uma gula de
centroavantes. Por que eles não questionam o que comem? Porque a gente
só reluta diante do desconhecido. Se fosse servido um canguruzinho a
vapor (que os australianos, aliás, adoram), aí teria que ter preleção
antes – e nem gosto de imaginar as caretas.
Acredito que o texto mostra, com muita clareza narrativa, as diferenças culturais entre os povos. Acredito que estes estilos culinários exóticos servem para unir a humanidade, através do respeito às diferenças, tendo como consequência a aproximação dos povos. Sigamos em frente !! Abraços !!
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