Estado de Minas: 27/07/2014
O romance Hilda
Furacão, de Roberto Drummond, pode ser lido como uma espécie de guia
para se conhecer a BH dos anos de 1950 até 1964, quando termina a
história do livro, com a chegada dos militares ao poder e o fim da
democracia no país.
Dos tantos lugares e entidades citados pelo
escritor, que nasceu na cidade de Ferros, no Vale do Rio Doce, mas veio
ainda bastante jovem para a capital mineira, um deles é o mítico Mocó da
Iaiá, misto de bar e restaurante que ficava na Rua Carijós esquina com
Curitiba e era ponto de encontro de jornalistas e intelectuais. Segundo
Arnaldo Viana, colega do jornal, que chegou a frequentar o pedaço quando
dava os primeiros passos na profissão, o dono do estabelecimento se
chamava Silveira.
Drummond conduz o leitor ao mítico Montanhês
Dancing, cabaré que ficava na Rua dos Guaicurus, dirigido com “toda
moral” pela espanhola Olympia Vásquez García. Frequentado por políticos
conhecidos, coronéis do interior e tantos mais, até o cineasta Orson
Welles esteve por lá quando da sua passagem por BH. Corre a lenda que lá
pelas tantas, depois de ter tomado umas e outras, dirigindo-se meio
trôpego para o hotel, o diretor de Cidadão Kane teve vontade de urinar.
Como não achou um banheiro, aliviou-se no tronco de uma árvore, entre a
Avenida Santos Dumont e Rua Rio de Janeiro. Para fãs do cineasta, a
árvore deveria ser tombada.
Daquela região boêmia, que ainda
pulsa na cidade, com a prostituição a correr solta, o romancista não
deixou de citar hotéis conhecidos de encontros íntimos, como o Brilhante
e o Maravilhoso. Foi por aqueles lados que Hilda Furacão, a Garota do
maiô dourado, que frequentava o Minas Tênis Clube, onde causava frenesi,
se tornou ainda mais desejada, depois de chutar o balde e virar
prostituta. No mesmo clube, outras vezes lembrados no livro, existiam as
famosas “missas dançantes”, que nos domingos pela manhã eram a sensação
de rapazes e moças. A última coisa na qual pensavam era rezar.
Os
jornais da época, pelos quais os belo-horizontinos ficavam sabendo das
últimas, são citados em Hilda Furacão. Do Estado de Minas, já naquele
tempo o mais importante do estado, são lembrados os famosos editoriais
do montes-clarense Hermenegildo Chaves, mais conhecido por Monzeca.
Também estão lá o Diário de Minas, do governador Magalhães Pinto, e o
Última Hora. Sem se esquecer do combativo Binômio, que era dirigido por
José Maria Rabelo e Euro Arantes e que foi fechado pela ditadura. Na
Revista Alterosa, outra publicação da época que faz parte da história,
Drummond conheceu o cartunista Henrique Filho, então um iniciante no
jornalismo. O nome Henfil – Hen, de Henrique, e Fil, de filho – foi dado
pelo autor de Hilda Furacão.
Hotéis conhecidos então, como o
Grande Hotel, que ficava onde hoje é o Edifício Maletta, na Avenida
Augusto de Lima, e o Financial, que ainda está na Avenida Afonso Pena (o
dono era o empresário Antônio Luciano, também personagem do livro),
foram imortalizados no romance. Era neste hotel, que tantas vezes
hospedou o presidente JK e outras personalidades da época, que também
morava Aramel, o Belo, personagem do livro.
O Convento dos
Dominicanos, na Rua dos Dominicanos, no Bairro da Serra, Zona Sul da
capital, abrigava as angústias de Frei Malthus, personagem inspirado em
Frei Betto, amigo e companheiro de geração de Roberto Drummond.
Ah!,
devaneios dos devaneios… Roberto não se esqueceu de imortalizar em seu
livro a Serra do Curral. Em seus contrafortes, um grupo de românticos
sonhadores, do qual fazia parte o próprio romancista, chegou a pensar em
criar um foco de guerrilha, para lutar contra a ditadura. “Ela será a
nossa Sierra Maestra”, bradavam entre um copo e outro de cerveja.
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