Estado de Minas: 07/09/2014
Li ótimo livro sobre viagem de 14 dias à Índia, edição caprichada e fora de comércio, motivo pelo qual peço licença para não dizer os nomes dos três casais de brasileiros que lá estiveram. Gente riquíssima que viajou em jato particular, talvez o melhor do Brasil.
No subcontinente indiano, os seis visitaram várias cidades, sempre hospedados nos hotéis mais luxuosos, alguns de embasbacar com a relação de 14 empregados por hóspede. Viagens em terra a bordo de vans, com motoristas atentos e guias turísticos fluentes em inglês. Voltaram impressionados com o trânsito absolutamente maluco, que funciona, as multidões que se sucedem – em 2012, somavam 1.237 bilhão de pessoas num território de 3.287.596 km2, menos que a metade do brasileiro.
Levaram do Brasil caixas com aquele negócio usado nos hospitais, uma espécie de touca para os pés, mas tiveram que visitar um templo jainista descalços: é proibido calçar qualquer coisa. Jainismo, como sabe o leitor, é religião indiana criada no século VI a.C. em ruptura com a tradição védica e o hinduísmo, fundamentada na ideia do ainsa (rejeição à violência). São aqueles malucos que espanam o chão para não matar formigas. O templo é imenso, lindíssimo, luxuosíssimo e o turista sai com os pés imundos.
Índia, China e Rússia são exemplos do contraste entre a miséria e o luxo incomparável. Os outros dois países dos Brics, África do Sul e República Federativa do Brasil, têm a miséria sem os castelos e os templos dos três primeiros. Como explicar o luxo do Kremlin, da Cidade Proibida, da sucessão de palácios indianos? Um só daqueles palácios tem mais luxo que toda a Barra da Tijuca.
Conforto é uma coisa, luxo é outra muito diferente. Você pode morar numa casa superconfortável que não seja luxuosa, como também pode morar numa luxuosa sem qualquer conforto. Deu para entender? Isto não obstante, o luxo atrai muito mais gente que o conforto. Deve ser exibicionismo, mania de humilhar os outros, de impressionar a patuleia.
No livro citado, foram omitidos o jato com dois pilotos e uma aeromoça, pijamas e camisolas de seda para os passageiros, catering Troisgros, Ducasse ou equivalente, como fiquei sabendo por um amigo que viajou no mesmo avião de Paris para o Rio. Omissão inteligente da autora, uma carioca na faixa dos cinquenta e muitos, que sempre foi de esquerda e não teve culpa de o seu marido ficar bilionário. No mais, só lendo o livro. Vou sugerir à autora que mande fazer uma edição comercial. Entre outros bens, a família tem imensa editora, que não representa 0,5% do faturamento do grupo.
Antissemitismo
Confundir o Hamas com os árabes é idiotice tão grande quanto confundir os homofóbicos da Rua Augusta com os paulistanos, o PCC com os brasileiros, os cangaceiros com os nordestinos, os traficantes com os cariocas.
Isso não obstante, o antissemitismo é tão forte no mundo inteiro que pessoas alfabetizadas tomam o partido do Hamas na guerra contra Israel. É perfeitamente compreensível que um homem de bem deteste o mau judeu, o mau cristão, o mau muçulmano, o mau ateu, mas odiar todo um povo como os antissemitas odeiam os israelitas só pode ser inveja, burrice ou maluquice.
Quando o antissemita não é burro e não creio que tenha inveja dos mais de 100 prêmios Nobel israelenses, a explicação para seu ódio aos judeus fica restrita à maluquice ou, o que é mais provável, a um quadro de demência senil. Fico triste porque fui amigo dele.
O mundo é uma bola
7 de setembro de 1159: eleição do papa Alexandre III, nascido Rolando Bandinelli em Siena, por volta de 1100, morto em 1180 com presumíveis 81 anos. Foi o 170º papa e pontificou um tempão. Reconheceu a independência de Portugal e Afonso Henriques como vassalo da Igreja e rei de Portugal. Em 1164, Stanislas Poniatowski, o protegido da Rússia, é eleito rei da Polônia. Em 1793, tem início o Cerco de Toulon, uma operação militar realizada pelas forças da Primeira República Francesa contra um corpo de combatentes da Primeira Coligação formado pelas tropas desembarcadas de uma frota enviada para bloquear o porto francês. Foi a primeira operação militar em que se destacou um capitão de artilharia chamado Napoleão Bonaparte. Claro que o Cerco de Toulon não nos interessa, mas preciso encher linguiça, hoje infelizmente sem trema, sinal diacrítico que dava sabor à tripa recheada com toucinho e carne crua, especialmente de porco.
Em 1822, às margens do Ipiranga, o príncipe regente dom Pedro proclama a independência do Brasil. Como é sabido, sua alteza não cavalgava o belo cavalo retratado por famosos pintores, mas uma besta baia gateada. E vinha de aliviar as tripas às margens plácidas do riacho Ipiranga, agoniado por uma disenteria com dores que apanhara em Santos. Não invento: o evento disentérico foi testemunhado e relatado pelo padre Belchior Pinheiro. E o resultado aí está nos 39 ministros de um país grande e bobo. Hoje, feriado nacional, felizmente é domingo.
Ruminanças
“Meu caro: recebi seu livro. Como você é chato!” (Guilherme Figueiredo, 1915-1997).
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