O própolis, que somente na década de 1980
ganhou notoriedade no Brasil, é usada com sucesso para fins medicinais.
Empresa mineira ganhou prêmio Apex por desenvolvimento do produto
Alfredo Durães
Estado de Minas: 06/09/2014
O que é mesmo o
própolis, produto que, cada vez mais, tem sido usado na medicina? De
acordo com um dos maiores apicultores brasileiros, Helmuth Wiese, em seu
livro Nova apicultura, publicado em 1995, “o própolis é uma substância
resinosa, adesiva, balsâmica, elaborada pelas abelhas a partir da coleta
de produtos existentes em botões florais, gemas e em cortes da casca
dos vegetais”.
O professor Yong Park, da Universidade Estadual de
Campinas, afirma que “as abelhas retiram essa resina e a reaplicam na
parte externa da colmeia. Dessa forma, o própolis age como vedante,
protegendo o lar das abelhas contra organismos invasores que querem
roubar mel”. E emenda: “Para conseguir o própolis que consumimos, os
produtores preferem extrair o produto das colmeias, onde a quantidade é
maior que nas plantas. Só para dar uma ideia, pode-se tirar cerca de 300
gramas de própolis de uma colmeia por mês”.
Atrás somente da
China, o Brasil é o segundo maior produtor mundial de própolis. Das 700 a
800 toneladas consumidas anualmente no mundo, o país responde por 150 a
170 toneladas, atendendo, entre outros clientes, 80% da demanda do
mercado japonês. Atualmente, há um forte interesse do mercado europeu
pelo própolis orgânico certificada produzida no Brasil.
Estudo
que confirmou as propriedades antioxidantes e antimicrobianas do
própolis orgânico certificado produzido na Região Sul do Brasil foi
finalizado recentemente pelo engenheiro agrônomo Severino Matias de
Alencar, professor associado da Escola Superior de Agricultura Luiz de
Queiroz (Esalq) e da Universidade de São Paulo (USP), com apoio da
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
Em
colaboração com o farmacêutico Pedro Luiz Rosalen, professor titular de
farmacologia, anestesiologia e terapêutica da Faculdade de Odontologia
de Piracicaba (FOP), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e
com a participação da doutoranda Ana Paula Tiveron (Esalq) e do
pós-doutorando Bruno Bueno Silva (Instituto de Ciências Biomédicas,
USP), ambos bolsistas da Fapesp, além do doutor Masaharu Ikegaki, da
Universidade Federal de Alfenas (Unifal).
VARIANTES
A equipe investigou 78 amostras, coletadas em apiários no Sul do Paraná
e Norte de Santa Catarina. Nesse total, identificou sete variantes de
própolis orgânico, com comprovada atividade antioxidante e
antimicrobiana (em relação às bactérias Streptococcus mutans,
Streptococcus sobrinus, Staphylococcus aureus, Streptococcus oralis e
Pseudomonas aeruginosa).
O professor Severino Matias concorda que
o interesse científico pelas propriedades do própolis é relativamente
recente. “No Brasil, o interesse pelo própolis ocorreu somente na década
de 1980. Portanto, há ainda muito que se pesquisar, principalmente no
que diz respeito à padronização e classificação do própolis. Não se pode
deixar de considerar o enorme potencial dele como fornecedor de
moléculas bioativas a serem testadas e com possibilidade de aplicação
nas indústrias alimentícia e farmacêutica”, afirmou. Segundo ele, o
grande desafio que os pesquisadores têm pela frente é responder qual
tipo de própolis é melhor para qual atividade biológica, considerando
que, no Brasil, existem vários.
Severino atesta que o própolis
vem ganhando cada vez mais popularidade como suplemento alimentar
saudável e tem sido amplamente utilizada em alimentos e bebidas,
atuando, assim, como elemento funcional para melhorar a saúde e prevenir
inflamações, doenças cardíacas, diabetes e até mesmo câncer. “Porém,
essa funcionalidade depende de cada tipo de própolis e, no Brasil, pelo
menos 13 tipos distintos dele já foram descritos na literatura.”
Vários alvos terapêuticos
Uma linha de gel à
base de própolis, a Proporalcare, destinada a controlar e erradicar os
efeitos colaterais da radioterapia em pacientes portadores de câncer nas
regiões da cabeça e do pescoço, garantiu a uma empresa mineira um
prêmio, há dois meses. A pesquisa, o desenvolvimento do produto e a
conquista do mercado externo com o Proporalcare deram à Pharma Nectar,
sediada em Belo Horizonte, premiação na categoria Micro e Pequena
Empresa, no 5º Prêmio Apex-Brasil de Excelência em Exportação, promovido
pela Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos
(Apex-Brasil).
Desde 1999, uma parceria entre a Faculdade de
Odontologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a Pharma
Nectar possibilita o estudo das propriedades do própolis verde (retirada
pela abelhas do alecrim do campo) na prevenção de diversos tipos de
doenças causadas por micro-organismos que afetam e causam lesões na
boca, tais como gengivite, candidíase, cárie, aftas e herpes.
Outra
meta foi um medicamento para a prevenção e tratamento de mucosite e
candidose em pacientes que lutam contra o câncer e recebem irradiação
nas regiões da cabeça e do pescoço. Nesses casos, a irradiação gama
provoca xerostomia, disfunção causada pela radioterapia, conhecida como
“boca seca”, caracterizada por pouca ou nenhuma produção de saliva, que
protege a boca e controla o crescimento exagerado de micro-organismos
potencialmente patogênicos.
Os experimentos mostraram que, dos
pacientes tratados antecipadamente com o gel do própolis, 90% não
desenvolveram a mucosite, enquanto que os restantes 10% tiveram a
inflamação no grau dois, bem mais branda e que não chegou a afetar a
qualidade de vida deles. No projeto, sob a liderança do professor de
patologia bucal Vagner Rodrigues Santos, com a equipe técnica da Pharma
Nectar, constatou-se a eficácia do própolis no tratamento de pacientes
com aftas, candidoses e doenças periodontais.
ALECRIM DO CAMPO
A partir dessa constatação, a diretora científica da Pharma Nectar, a
farmacêutica Sheila Rago Lemos Abreu, desenvolveu um gel mucoaderente à
base do própolis verde do alecrim do campo (Baccharis dracunculifolia),
para o início dos estudos clínicos. No Hospital das Clínicas da UFMG, na
véspera do início da radioterapia, o paciente é encaminhado para
receber a aplicação do produto, procedimento que se repete durante 45
dias. Segundo a farmacêutica, “representa um grande avanço, pois um
único produto reúne vários alvos terapêuticos, necessários para os
pacientes irradiados”.
Os testes passaram por autorização do
comitê de ética em pesquisa clínica da UFMG, foram registrados, têm
autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e
seguem normas internacionais de pesquisa clínica da Organização Mundial
de Saúde (OMS). Em parceria com a Escola de Odontologia da UFMG, a
Pharma Nectar está desenvolvendo um produto com própolis para melhorar a
qualidade de vida de pacientes oncológicos. Esse estudo encontra-se na
fase três de pesquisa clínica e todos os pacientes oncológicos que
tenham qualquer manifestação desconfortável na cavidade oral podem
procurar o serviço da patologia bucal da UFMG, para participar do ensaio
clínico.
Três perguntas para...
Alexandre Silva de Abreu, diretor da Pharma Nectar
O senhor considera que ainda há muitos caminhos, no sentido de descobrir outras propriedades e aplicações da própolis?
No
caso da própolis, existe um processo de inovação sequencial, por meio
do qual inovações vão surgindo em decorrência do aprimoramento dos
produtos com novas utilidades e aplicações. Mas é preciso que a
sociedade se aproprie mais de um produto nosso, que é referencia mundial
de qualidade.
Qual a produção mensal de própolis da empresa e quanto desse total é exportado?
A
nossa meta não é a exportação de própolis in natura, mas a elaboração
de produtos com maior valor agregado, que possam impactar positivamente
na vida das pessoas. Hoje, os principais produtos da empresa são os
extratos secos, que preparamos de forma customizada para outras
indústrias, seguidos pela exportação de cápsulas e os produtos para
cavidade oral, como o gel e o fio dental e enxaguante. Esses produtos
representam a produção e a venda de mais de 1 milhão de unidades por
ano, com crescimento estável ano a ano.
O senhor avalia que há uma demanda grande e contínua pelo produto no mundo?
O
mercado para produtos à base de própolis cresce ano a ano em todo
mundo. Recentemente, a Apex realizou um trabalho de inteligência
comercial nos mercados-alvo para a própolis brasileira e os números são
impressionantes: somente na América do Norte, Europa e Ásia, as vendas
de própolis nas mais diferentes apresentações superam US$ 10 bilhões ao
ano.
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