Malhar ou fechar a boca?
Suar na academia pode até ajudar a perder alguns quilos, mas as últimas pesquisas mostram que é impossível emagrecer de verdade sem mudar o estilo de alimentação
Victor Moriyama/Folhapress |
O psiquiatra Volnei da Costa, 79 kg, que perdeu 8 kg em dois anos só treinando "pesado", sem mexer na sua alimentação, posa na academia que frequenta, em São Paulo |
JULIANA VINESDE SÃO PAULO
Ser fisicamente ativo é se movimentar mais o tempo todo. Não adianta a pessoa treinar uma hora e ficar sentada as outras 23 horas do dia
Para gastar apenas 500 calorias é preciso fazer 60 minutos de uma atividade de alto impacto. E o esforço pode ir embora em dois pedaços de pizza
O último round da disputa científica entre dieta e exercício físico (qual emagrece mais?) foi vencido pela mudança alimentar.Atividade física até ajuda a perder uns quilos, mas quem está acima do peso -48,5% da população brasileira, segundo o Ministério da Saúde- precisa fechar a boca para ter resultado, de acordo com pesquisas recentes.
Uma delas, publicada em outubro último no periódico "Obesity Reviews", analisou os resultados de 15 trabalhos. Todos mediram o efeito de atividades físicas, como caminhada ou corrida, em pessoas que não fizeram mudanças na dieta.
As conclusões não animam. Na maioria dos estudos (que envolveram 657 pessoas e duraram de três a 64 semanas), a perda de peso foi menor do que a esperada.
"Algumas pessoas conseguem emagrecer bastante, mas, em geral, a prática de atividade física resulta em uma perda de apenas dois ou três quilos", disse à Folha Timothy Church, um dos coordenadores do trabalho. Ele é médico do Centro Pennington de Pesquisa Biomédica, em Louisiana (EUA).
COMPENSAÇÃO
Se toda atividade física causa queima energética e se para emagrecer basta ter um saldo negativo (gastar mais do que ingerir), por que a conta nem sempre fecha?
O trabalho de Church levanta algumas hipóteses. Segundo a principal delas, quem faz exercício acaba compensando a perda de calorias comendo mais. Isso aconteceu em pelo menos dois artigos analisados.
"Não sabemos por que isso ocorre, estamos estudando melhor agora", afirma.
Para o médico do exercício Marcelo Leitão, da Sociedade Brasileira de Medicina do do Exercício e do Esporte, é comum as pessoas superestimarem os efeitos da atividade física.
"As pessoas têm uma noção errada de que se fazem exercícios podem comer o que quiserem. Se você fizer uma hora de atividade e depois tomar uma cervejinha, já recuperou o que perdeu."
Para gastar 500 calorias (meta diária de quem quer perder meio quilo por semana) é preciso fazer uma hora de atividade de alto impacto, como uma aula de "jump". O esforço pode ir embora em dois pedaços de pizza.
"Uma hora de caminhada por dia muda indicadores de saúde, mas não necessariamente faz perder peso", acrescenta Leitão.
FAZENDO AS CONTAS
"É muito mais fácil cortar calorias do que gastar. As dietas, em geral, são supercalóricas", afirma Julio Tirapegui, bioquímico e pesquisador da Universidade de São Paulo.
Uma pessoa com sobrepeso pode consumir mais de 3.000 calorias por dia e um obeso chega a 5.000, segundo o médico argentino Máximo Ravenna, autor de "A Teia de Aranha Alimentar" (Guarda-Chuva, 264 págs., R$ 38). "Não tem como compensar isso com exercício. Tem que reduzir pelo menos 40% da ingestão de alimentos."
Outro ponto a considerar é que o gasto de energia resultante do exercício não é exato: varia segundo o condicionamento físico e as características pessoais (altura, peso, idade). Na dieta, dá para fazer as contas com precisão e cortar calorias.
Foi calculando tudo que colocava para dentro que Lucélia Bispo, 27, auxiliar administrativa, perdeu 23 quilos em cinco meses, sem exercício. Ela fez uma dieta de pontos de um site especializado.
"Não deixava passar nada, anotava até uma bala", diz ela, que antes já tinha feito regime, sem sucesso.
"Sempre dá aquela impressão de que não vamos poder comer nenhuma besteira. Mas aprendi que se for um pouquinho, tudo pode."
O recorde de Lucélia foi ter perdido 2,3 kg em apenas uma semana.
Depois de emagrecer bastante, ela passou a fazer uma dieta de manutenção. Hoje está com 71 kg. "Só agora vou fazer academia, porque fiquei com um pouco de flacidez."
IMPOSSÍVEL NÃO É
É claro que quem pratica exercícios com regularidade e foge da armadilha da compensação alimentar consegue perder peso.
Na cabeça do psiquiatra Volnei Costa, 31, nunca passou a ideia de fazer regime: "Gosto muito de comer".
Quando viu que precisava emagrecer, manteve o cardápio e começou a treinar pesado seis vezes por semana, alternando musculação e exercícios aeróbicos. Em seis meses eliminou oito quilos -passou de 79 kg para 71 kg. Hoje está com 76 kg. "Ganhei massa muscular", diz.
Abandonar o sedentarismo também foi decisivo para a designer Camilla Pires, 23. Com 21 anos e 85 quilos, ela começou a nadar. A atividade motivou mudanças no cardápio. "Passei a pensar mais no que comia. Estava fazendo muito esforço, não podia desperdiçar."
Por um ano, ela juntou a fórmula dos sonhos dos especialistas: adotou uma " alimentação saudável" e se mexeu mais. Além da natação, passou a correr. Perdeu 24 quilos. "Para mim, o que fez a diferença foi o exercício, mas também parei de comer compulsivamente ", conta.
O pesquisador americano Timothy Church, apesar das ressalvas, admite que, com a atividade física, o emagrecimento fica mais fácil. E até dá a receita: 150 minutos de caminhada rápida e 2 dias de treinamento com pesos (20 minutos por dia) por semana.
Para Franz Burini, professor da Unesp e médico da academia Reebok Sport Club, não existe atividade física ideal. "O melhor exercício é aquele que é feito", afirma. E não precisa passar uma hora na academia para ter resultado. "Ser fisicamente ativo é se mexer mais todo o tempo. Tem pessoas que treinam uma hora e ficam paradas as outras 23."
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