segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Esculturas valiosas são tratadas como sucata em BH-Sérgio Rodrigo Reis‏

Mal instaladas, mal conservadas e ignoradas pela comunidade, obras de aclamados artistas se deterioram em espaços públicos da capital. Esculturas valiosas são tratadas como sucata 

Sérgio Rodrigo Reis
Estado de Minas: 18/02/2013 
Belo Horizonte está entre as poucas cidades do Brasil que têm o luxo de contar, em seu espaço público, com um conjunto significativo de esculturas de grandes proporções assinadas por artistas consagrados. São obras valiosas de nomes como Amilcar de Castro (1920–2002), Franz Weissmann (1911–2005) e Mary Vieira (1927–2001). De qualidade inquestionável, elas poderiam figurar em respeitadas coleções internacionais. Mas BH trata mal o seu precioso acervo.

A maioria das peças está instalada de maneira incorreta, sem informações que auxiliem o público a admirá-las e compreendê-las. Além disso, tornaram-se reféns da ação do tempo.

A rara versão em grandes proporções de uma escultura seminal de Amilcar de Castro está escondida no mato. Pior: deitada no pátio de entrada da Escola Estadual Professor Hilton Rocha, no Bairro 1º de Maio. Ela passa despercebida, apesar de ser peça das mais disputadas no mercado de arte. “Ando por aqui direto, não tinha notado. Para mim, isso nada significa”, diz a estudante Jussara Viana, moradora do Bairro Dona Clara. A mesma sensação tem o namorado dela, Ricardo Mendes: “Vim aqui várias vezes, nunca reparei nessa escultura”.

O auxiliar de serviços gerais Marcos Goulart reclama da falta de informações sobre o trabalho de Amilcar de Castro. “Seria importante se os alunos soubessem o significado dele”, comenta. Alessandra Carla Umbelino, diretora da escola, conta que não encontrou informações sobre a peça. “Poderia ser feito um trabalho com parceiros para conscientização e conhecimento”, diz a professora.

A falta de cuidado se repete no caso da obra de Mary Vieira. Uma de suas maiores esculturas, Liberdade e equilíbrio, instalada em 1982 no centro da Praça Rio Branco, em frente à rodoviária, enfrenta a sujeira e a falta de conservação. Mal pode ser notada, pois sua visibilidade é prejudicada pelas árvores que circundam o espaço.

Para completar, recentemente instalou-se uma grande placa publicitária na frente da obra de Mary Vieira com informações sobre a implantação do BRT. “Até posso imaginar que se trata de uma escultura, mas não sei o que é isso. Não há informações sobre o autor. Confesso: sempre fico curioso com ela”, comenta o instalador de tecidos João Ângelo Rodrigues Rezende, que frequentemente cruza a Praça Rio Branco. 

Instalada há vários anos na Praça Afonso Arinos, Espaço circular em cubo virtual, escultura de Franz Weissmann, concorre com tanta informação visual à sua volta que não chama a atenção nem do dono da banca de jornais em frente. Desde 1981, Manoel Ferreira Batista trabalha na Banca Oliveira. E jura que a obra de arte está ali “faz uns três meses”.

Batista nem sequer sabe que se trata de uma escultura. Depois de conversar com o repórter, diz que faltam informações a respeito. “Podia ter uma placa perto, com o nome do artista, explicando melhor suas ideias. Interpretar uma coisa dessas sem nenhuma referência é complicado. Não sei o que dizer diante daquilo”, confessa.

Concorda com ele o bancário aposentado Seleme Isaac Seleme, que mora no prédio em frente à Praça Afonso Arinos. “Já tinha reparado nela, mas não compreendi. Que é bonito, é. Gostei”, afirma ele. 

CADÊ? É muito pior a situação do Monumento ao desarmamento, escultura do artista plástico Jorge dos Anjos instalada há alguns anos numa das entradas da Câmara Municipal de Belo Horizonte. Composto por três cubos empilhados – um de aço, um de vidro com armas de brinquedo dentro e o terceiro de aço –, o trabalho foi removido sem maiores explicações. “Ele ficou muito bonito, mas o tiraram e jogaram num canto qualquer. Fiquei indignado e aborrecido”, reclama Jorge.

O artista plástico lembra que outro problema ocorreu com o Monumento a Zumbi, criado por ele para a prefeitura homenagear o herói da resistência negra. “A peça ficou largada, a placa com informações foi roubada. Para completar, um carro bateu nela e a amassou. Colocaram a escultura no mesmo lugar, sem consertá-la. Ficou lá no início da Avenida Brasil. Ver aquilo sem poder fazer nada é complicado”, queixa-se Jorge.

Giovani Fantauzzi, escultor e professor da Escola Guignard, sugere que Minas siga o exemplo de São Paulo. “Há muitas obras instaladas lá, a maioria bem cuidada. Elas contam com jardim, iluminação e gente para vigiar. Aqui, gasta-se para fazer, mas depois ninguém liga mais”, lamenta.

O professor adverte: não há critério para instalar obras nas praças de BH. “Há coisas muito ruins. O pessoal só pede licença para colocar. Não há, por parte dos governos, preocupação em separar o que é obra de arte e o que é artesanato”, afirma.

O especialista sugere a criação de comissão formada por escultores e críticos para cuidar da seleção de trabalhos a serem expostos. Na opinião de Fantauzzi, autores e familiares de artistas falecidos deveriam cobrar esse cuidado com mais empenho. 

OUTRO LADO
A assessoria de imprensa da Regional Centro-Sul da Prefeitura de Belo Horizonte informa que não conta com equipe de restauração. Acrescenta que a limpeza dos monumentos e de obras de arte da cidade é feita sempre que há demanda. A Fundação Municipal de Cultura informa que tem como meta para os próximos anos a abertura de um concurso de esculturas para ocupar espaços públicos da capital. A Câmara Municipal de Belo Horizonte, por meio de sua assessoria de imprensa, alega que a instalação da obra de Jorge dos Anjos e sua retirada foram iniciativas particulares do ex-vereador Betinho Duarte. Garante que a escultura não pertence ao patrimônio do Legislativo.

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