Estado de Minas: 05/02/2013
Um aviso gritante sobre a necessidade e a urgência da reforma política, especialmente no que toca ao financiamento da política (e não só das eleições), acompanhou todo o processo de renovação das Mesas do Congresso, concluído ontem com a eleição de Henrique Eduardo Alves para presidente da Câmara. Um aviso amplamente ignorado: é bem mais fácil e mais simples expor as nódoas das fichas individuais e desqualificar os políticos de modo geral do que tentar compreender as razões dos resultados que, segundo todas as mídias, ofenderam o que se convencionou chamar de opinião pública. A execração geral vai minando a crença da população na representação política e na democracia que, a tantos, custou tanto. Ontem mesmo soubemos mais sobre o martírio de Rubens Paiva e ouvimos o novo presidente da Câmara evocar os duros tempos da resistência, nos primeiros de seus 11 mandatos. A histeria contra os eleitos nada resolverá. Os histéricos erram no diagnóstico quando miram pessoas, e não o sistema. A estrutura das Mesas e a proporcionalidade que rege a eleição interna existem desde 1904. Os eleitos puderam concorrer, primeiramente, porque foram postos no Congresso pelo povo. Depois, todos os deputados seguiram a regra da proporcionalidade, inclusive os da oposição, PSDB e DEM. Exceção foi o PSB, ao abraçar a candidatura de Júlio Delgado, embora o partido não fizesse jus ao cargo. Rose de Freitas foi só uma dissidente do PMDB. Se o sistema eleitoral não permite a eleição de bons parlamentares, e por decorrência, de bons dirigentes para as Mesas, o sistema é que precisa ser mudado. Aqui é que entra a reforma política.
Os financiadores da política, também chamados imprecisamente de “o poder econômico”, atuam nas eleições populares, mas também nos processos internos do Parlamento. Certamente atuaram na escolha de líderes e de membros das Mesas, por meio de candidatos que ganharam votos de seus pares acenando com ajudas eleitorais futuras. É assim, leitores, que as coisas de fato funcionam. Ao longo da legislatura, os financiadores recorrem ainda àqueles que ajudaram ou ajudarão para aprovar emendas orçamentárias, enfiar “contrabandos” em medidas provisórias ou indicar nomes para cargos.
O perverso sistema de financiamento privado das eleições (e da atividade política, mesmo na fase que o ex-presidente do STF Ayres Britto chamou de entressafra eleitoral) tem feito com que, a cada legislatura, a banda boa do Congresso se encolha, ao passo que se amplia a banda comprometida com o fisiologismo e as práticas que a sociedade civil repudia. Com o financiamento público e a criminalização de doações privadas fora do previsto, haverá chance para a renovação, tanto dos atores políticos quanto das práticas. Quando o parlamentar não deve nada a ninguém, é mais livre para votar e contrariar interesses, observando apenas o que quer a sociedade.
Com a legislatura começando e a parte mais crítica da sociedade irada com o Congresso, seus novos dirigentes deviam colocar a reforma política, e especialmente esse ponto, no alto das prioridades. Ainda que contornando a desculpa de que estamos em cima da hora com um acordo para que vigore só em 2016. Essa é a bandeira que deveria ser levantada agora pelos que se indignaram tanto com as eleições de Renan Calheiros, Henrique Alves e do conjunto das Mesas.
O governo e o novo Congresso
É certo que o PMDB mandará nas duas Casas do Congresso, aumentando a força do vice-presidente Michel Temer e a dependência do governo Dilma em relação ao partido. Mas pior foi para o governo petista quando, não tendo o PMDB, precisou do apoio dos partidos periféricos e os socorreu com dinheiro do valerioduto e ficou com o carimbo do mensalão.
Renan e Henrique Alves, pelos problemas que enfrentarão, não serão “condestáveis” do governo, como foi Ulysses para Sarney, ou mesmo Luiz Eduardo Magalhães para Fernando Henrique. Agora que o estoque de munição dos adversários contra o PT minguará, com o fim do julgamento do mensalão, desgastar os dirigentes do Congresso será também uma forma de limar o prestígio de Dilma e manter o PT nas cordas. Não foram eleitos com o apoio dela, ainda que algo envergonhado, e os votos dos petistas? PT e PMDB, se tiverem juízo, fortalecerão a aliança, olhando para 2014. O PSB, do governador Eduardo Campos, é que sai do processo ainda mais distante de Dilma. O candidato do partido, Júlio Delgado, quase levou a eleição para o segundo turno, ao colher 165 votos. Faltaram só 14 para isso. Mas, em toda eleição, quem ganha leva as batatas e pronto. Henrique, que teve 271, esperava uma vitória maior. Mas, daqui a pouco, ninguém se lembrará mais disso.
Ganha a literatura
Agora que deixou a Presidência do Senado, o senador José Sarney (PMDB-AP) voltará a ter mais tempo para sua outra paixão, a literatura. Primeira tarefa: entregar ao editor, em março, as memórias da vida inteira, que já escreveu e está revisando.
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