Zero Hora 13/01/2013
Pouca coisa me escandaliza, mas fiquei perplexa com o vídeo que andou
circulando pela internet, que mostra um culto da Assembleia de Deus
conduzido pelo pastor Marco Feliciano – sim, o polêmico presidente da
Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, o maior
para-raios de encrencas da atualidade.
O vídeo mostra o momento da coleta de dízimos e doações, a parte
mercantilista da negociação dos fiéis com o Pai Supremo, de quem o
pastor se julga uma espécie de contador particular, pelo visto.
Entre frases inibidoras, como “Você vai mesmo ficar com esse
dinheiro na sua carteira?”, dirigida a pessoas da plateia, e estimulando
que os trabalhadores cedam uma porcentagem do seu salário dizendo
“Aquele que crê dá um jeito”, aconteceu: alguém entregou seu cartão de
crédito nas mãos do pastor. No que ele retrucou: “Ah, mas, sem a senha,
não vale. Depois, vai pedir um milagre pra Deus, Ele não vai dar, e aí
vai dizer que Deus é ruim”.
Entendi bem? Deus está à venda? Cobrando pelas graças solicitadas?
Essa colocação do pastor bastaria para abrir uma CPI contra os caras
de pau que, abusando da esperança de gente sem muito tutano, arrecadam
fortunas e depois vão fazer suas preces particulares em algum resort em
Miami. Quem dera houvesse um Joaquim Barbosa para colocar ordem nesse
galinheiro falsamente místico, mas quem ousa? Se essa simples crônica já
sofrerá retaliações, imagine alguém peitar judicialmente um
representante de Deus, ou que assim se anuncia.
Religiosidade é algo extremamente respeitável. Cada um exerce a sua
com a intensidade que lhe aprouver, de forma saudável, a fim de
conquistar bem-estar espiritual. Todas as pessoas religiosas que
conheço, e são inúmeras, nunca precisaram comprar sua fé nem dar nada em
troca – conquistaram-na gratuitamente através de cultura familiar ou de
uma necessidade pessoal de conforto e consolo que é absolutamente
legítima.
Religião é, basicamente, isso: conforto e consolo.
Já os crentes fazem parte de outra turma. São os que acreditam
cegamente em pecado, castigo, punição e numa recompensa que só virá
depois de algum sacrifício. Quando não pagam em espécie, abrem mão de
prazeres terrenos como forma de penitência, para se tornarem dignos da
vida eterna – que viagem.
É preciso ser muito iludido para acreditar que pagar a conta de luz é
menos importante do que pagar pelo milagre encomendado a Deus através
de seus “assessores” – e que, segundo o pastor Marco Feliciano, só será
realizado se você não tiver caído na malha fina do Serasa Divino.
O que fazer para tirar os crentes desse transe? Colocar na cadeia
esses ilusionistas que se apresentam como pastores? Duvido que ajude. A
bispa Sonia e seu marido Estevam Hernandes foram condenados por lavagem
de dinheiro e de nada adiantou. Se fossem condenados por lavagem
cerebral, quem sabe.
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