quarta-feira, 13 de março de 2013

Antonio Prata

folha de são paulo

!!!!!!!!!!!!!!!!
Fatores colaboram para a dependência da exclamação: é a pressa que me faz mandar 'abs!', 'bjs!' e 'hahaha!'
NÃO LEMBRO quando usei pela primeira vez, mas imagino que as razões tenham sido as mesmas de todo mundo: dar uma descontraída, uma turbinada. Que mal tem? -devo ter pensado: grandes artistas usaram, os jovens mandam uma, duas, três, simultaneamente, a toda hora e em qualquer lugar: por que não? Se soubesse, lá atrás, onde iria chegar, jamais teria experimentado: agora é tarde, Inês é morta. Ou melhor: é morta!!! -digo, exibindo a céu aberto meu vício nesta praga ortográfica: a exclamação.
Não quero me eximir da responsabilidade -um alcoólatra não pode culpar um pé na bunda, a má fase do Palmeiras ou as letras do Reginaldo Rossi por seu estado-, mas há, decerto, fatores que colaboram para a dependência. No meu caso: a pressa. Tivesse mais tempo para tudo o que não é trabalho, conseguisse cultivar as amizades com a calma que elas merecem e não estaria agora enviando e-mails com "abs!", "bjs!", "claro!", "vamos!" e até mesmo -Deus, em sua infinita misericórdia, tenha piedade de mim-: "Hahaha!!!".
Entendam, não é por mal. Ontem, por exemplo: eram umas três e meia a tarde, a crônica estava atravancada, o deadline aproximava-se como o solo na queda livre e eis que chega o e-mail de um amigo querido, que não vejo há anos. Ele conta do filho que nasceu, do emprego que arrumou, lembra de um Réveillon que passamos juntos, em Ubatuba, desenterra uma piada que à época nos fez rir muito e que agora me enche de nostalgia.
Não é uma mensagem a que se possa responder correndo, de modo que a guardo para o fim do expediente, quando, já tendo entregue a crônica e me desincumbido de todos os outros penduricalhos profissionais, poderei contar minhas aventuras e desventuras nos últimos tempos, relembrar algum momento daquela viagem, agregar à piada certo detalhe que ele deixou escapar.
Mas quem disse que consigo desincumbir-me dos penduricalhos? Eles não têm fim. Graças a Bill Gates, Steve Jobs e seus comparsas, que grilaram o tempo ocioso de toda a humanidade, o transformaram em dólares e o depositaram em suas contas bancárias, arrasto atrás de mim uma matilha de celulares, tablets e laptops, bichos mais carentes do que labradores num canil, requerendo continuamente a minha atenção, com seus ganidos eletrônicos: seus "trrrrllls" e "pims" e "brrrrlums".
Um e-mail tão importante, contudo, não pode ficar sem resposta -e é aí, meus amigos, que o homem vacila. É aí que, hesitante entre um dos lados na bifurcação -escrever direito a mensagem, abandonando um pouquinho o trabalho ou deixar para outro dia, dando uma mancada com o amigo-, acabo não escolhendo lado nenhum e metendo o carro no canteiro central -o que, no caso, significa enviar: "Saudades, Fabião! Cerveja, em breve?! Abs!!!".
De noite, na cama, a mensagem fica zunindo em meu ouvido, como um pernilongo. O "Abs!!!", principalmente. Ridículo. De que adiantam três exclamações num abraço que sequer abriu-se com todas as letras? Decido que amanhã, antes de qualquer coisa, escreverei um e-mail decente pro Fábio.
É o que reafirmo hoje, quarta, diante do tablet, enquanto tomo café: assim que acabar de conferir os e-mails, escreverei para ele. Juro!!!

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