quarta-feira, 15 de maio de 2013

Amparada pelo alto risco-Lilian Monteiro‏

Angelina Jolie surpreende o mundo ao anunciar que se submeteu à dupla mastectomia, retirada dos dois seios, para prevenir o tumor nas mamas. Especialistas brasileiros atestam que cirurgia só é recomendada em casos específicos 


Lilian Monteiro

Estado de MInas: 15/05/2013 

A atriz Angelina Jolie, uma das atrizes mais famosas e bem pagas do mundo, casada com o ator Brad Pitt, revelou ter submetido a uma dupla mastectomia preventiva para reduzir o risco elevado de câncer. Em um artigo com o título “Minha escolha médica” publicado no jornal New York Times, a americana de 37 anos explica que decidiu passar pela operação de retirada dos dois seios porque tem uma mutação genética que aumenta o risco de tumor nas mamas. Em seu caso, a mutação genética conhecida como BRCA1 representava 87% de chance de ela desenvolver um câncer de mama e 50% de ser atingida por um câncer de ovário.


No artigo, a atriz explica que apenas uma fração dos casos de câncer de mama é resultado de uma mutação genética herdada. Aqueles com defeito no gene BRCA1 têm risco de 65% de consegui-lo, em média, e com esse problema, pode ter câncer no ovário também. “Uma vez que eu sabia que esta era a minha realidade, decidi ser proativa para minimizar o risco tanto quanto eu poderia”. Angelina contou que entre o início de fevereiro e o final de abril concluiu três meses de procedimentos cirúrgicos para a remoção das duas mamas. Ela disse que tomou a decisão pensando em seus seis filhos, depois de ver sua própria mãe, a atriz Marcheline Bertrand, morrer de câncer ainda jovem. “Minha mãe lutou contra o câncer por quase uma década e morreu aos 56 anos. Ela resistiu tempo suficiente para conhecer os primeiros netos e segurá-los nos braços. Mas meus outros filhos nunca terão a chance de conhecê-la. Eles me perguntaram se a mesma coisa poderia acontecer comigo”. 


A atriz revelou que manteve os acontecimentos em âmbito particular, mas decidiu escrever sobre o que ocorreu na expectativa de ajudar outras mulheres. “A decisão de passar por uma mastectomia não é fácil. Mas é uma decisão e eu estou muito feliz por tê-la tomado. Minhas chances de desenvolver câncer de mama caíram de 87% para 5%. Posso dizer aos meus filhos que eles não precisam temer que me perderão para o câncer de mama”.


Jolie descreveu em detalhes os procedimentos pelos quais passou. O principal deles uma operação de oito horas para retirada do tecido mamário e a substituição por implantes temporários. “Meu processo começou em 2 de fevereiro, com um procedimento conhecido como ‘nipple delay’, que impede o surgimento da doença nos dutos mamários por trás do mamilo e leva mais sangue para a área”. A seguir, ela contou sobre uma grande cirurgia duas semanas mais tarde, quando o tecido da mama foi removido. Na sua descrição, ela fala da sensação: “Você levanta com tubos de drenagem e extensores nos peitos. Parece uma cena de um filme de ficção científica. Mas alguns dias depois da operação, você pode voltar à vida normal”. 


Nove semanas mais tarde, ela passou por uma cirurgia para a reconstruir as mamas e receber implantes. “Não me sinto menos mulher. Me sinto forte por ter feito uma escolha firme que de maneira alguma diminui minha feminilidade”, escreveu, acresentando que Brad Pitt, seu parceiro há oito anos, esteve no Pink Lotus Breast Center, no Sul da Califórnia, “em todos os minutos das cirurgias. Sabíamos que era o melhor que podíamos fazer para nossa família e que nos uniria ainda mais. E foi assim que aconteceu. A vida está cheia de desafios. Os que não devem nos dar medo são os que podemos enfrentar e podemos controlar”.

TESTE É OBSTÁCULO Angelina, no entanto, lamenta que o teste para detectar a mutação genética BRCA1, assim como a BRCA2, custe mais de 3 mil dólares (R$ 6 mil) nos Estados Unidos, “um obstáculo para muitas mulheres”. Mas o diretor médico da Sociedade Americana do Câncer, Otis Brawley, considerou que embora uma dupla mastectomia preventiva “possa ser a melhor opção para algumas mulheres”, elas devem buscar uma segunda opinião antes de se submeterem ao procedimento.


Indicação é rigorosa

A mastologista, ginecologista e professora-doutora adjunta do Hospital das Clínicas e do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Universidade Federal de Minas Gerias (UFMG), Soraya Zhouri, enfatiza que esta decisão é recomendada em casos selecionados, quando há o gene na família e nos parentes de primeiro grau. “Esse procedimento teve um boom no início da década de 1980, quando houve certo apavoramento das americanas. Mais tarde, quando constatado que por mais que se retire a glândula, vai ficar 5% de tecido glandular, o ímpeto diminuiu porque viu-se que a intervenção não é 100% segura”.
O oncologista André Márcio Murad, pesquisador do Hospital das Clínicas da UFMG e do Centro Avançado de Tratamento Oncológico Cenantron, reconhece o aumento significativo dos casos de câncer de mama em mulheres mais jovens, abaixo dos 40 anos de idade, mas afirma que a remoção preventiva das mamas somente deve ser oferecida para mulheres que sejam comprovadamente portadoras de mutações nos genes BRCA-1 ou 2, e que mesmo assim, há outras opções a serem discutidas, como, por exemplo, a remoção preventiva dos ovários tão logo as mulheres tenham o número de filhos desejado. “Nesse caso, a medida prevenirá não só o câncer das mamas como também o dos ovários, câncer este não prevenido quando se opta pela mastectomia”, afirma. 


O presidente da Sociedade Brasileira de Mastologia, Carlos Alberto Ruiz, ressalta que o diagnóstico precoce ainda é o melhor caminho para a prevenção da doença. Quando detectado logo no início, 95% dos casos de câncer de mama têm chances de cura. Ele alerta que a mamografia é o exame mais preciso na identificação dos tumores precocemente. A recomendação da SBM é que o exame seja feito anualmente a partir dos 40 anos. Estudos independentes sobre dados obtidos em pesquisas mundiais mostram redução de até 35% na mortalidade pela doença em mulheres entre 39 e 69 anos, como resultado do rastreamento mamográfico. “A detecção precoce também pode levar à preservação dos seios na cirurgia de retirada do tumor”, diz Ruiz.

OS RISCOS DO SILICONE
Diante desse quadro, mais uma vez levanta-se o questionamento sobre os possíveis riscos que mulheres com implantes de silicone correm de desenvolver câncer de mama. Conforme estudo divulgado pelo British Medical Journal, as próteses não são as causadoras dos tumores, mas dificultam o diagnóstico do câncer em seus estágios iniciais. Os autores da pesquisa, o epidemiologista Eric Lavigne e o professor Jacques Brisson, ambos da Universidade de Quebec, analisaram os resultados de 12 estudos publicados desde 1993 nos Estados Unidos, Canadá e no Norte da Europa. Eles concluíram que mulheres com silicone tem 26% mais chances de serem diagnosticadas com câncer nos estágios avançados da doença – justamente porque a prótese impediu o diagnóstico no estágio inicial. Uma análise de cinco estudos mostrou que a chance de morte entre pacientes com prótese aumenta 38%. 


Conforme a Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica, em 2011 foram realizadas quase 150 mil cirurgias de aumento dos seios no Brasil, colocando o país atrás somente dos Estados Unidos no ranking do número de mulheres que realizam a cirurgia. Em todo o mundo, foram 1,2 milhão de cirurgias.

Perfil angelina Jolie
O engajamento social e atuação atrás das câmeras, como diretora e produtora, têm afastado Angelina Jolie da tela grande. O mais recente longa-metragem estrelado por ela é O turista (2010), em que contracenou com Johnny Depp. Depois deste, Jolie só participou do segundo Kung Fu Panda (2011), como dubladora. Mesmo com alguns revezes recentes –sua estreia na direção de ficção, com Na terra de amor e ódio (2011), foi considerada pífia –Jolie coleciona prêmios e boas bilheterias. Estreou no cinema em 1982, como Angelina Jolie Voight, aos 7 anos, numa pequena participação na comédia Lookin' to get out, escrita e protagonizada pelo pai, Jon Voight, com quem tem uma relação de altos e baixos. O reconhecimento veio 16 anos mais tarde, com o telefilme Gia – fama e destruição. Levou um Globo de Ouro.

Outra personagem problemática lhe deu o Oscar de coadjuvante: Garota, interrompida (1999, que também lhe garantiu seu terceiro Globo de Ouro), em que interpretou uma jovem internada num hospital psiquátrico. Foi com a personagem Lara Croft, importada dos videogames, que a atriz virou sinônimo de boa bilheteria. Foram dois filmes da série Tomb Raider, em 2001 e 2003. Dois anos mais tarde, ela estrelaria Sr. e Sra. Smith, o filme em que começou o relacionamento com Brad Pitt.

Em 2008 foi dirigida por Clint Eastwood em A troca e, em 2010, filmou Salt (2010). Seu próximo filme, com estreia prevista para julho de 2014, é a fantasia Malévola, em que conta a história da A bela adormecida sob o ponto de vista da vilã. Vivida por ela, é claro.
No entanto, sua maior atuação parece ser a de ativista social e de mãe. Foi nomeada Alta Comissária da Organização das Nações Unidas para os Refugiados (UNHCR), já tendo feito 40 visitas a locais de conflito em 20 países, em nome da agência, incluindo Paquistão, Haiti, Iraque, Síria e Chade. Ela doou pelo menos US$ 5 milhões para as operações de resgate de vidas. Angelina e Pitt adotaram as crianças Maddox, Pax, e Zahara, e têm três filhos biológicos: Shiloh, Knox e Vivienne.


O impacto do 'efeito Angelina'
Declaração de estrela de Hollywood, que anunciou ter removido os seios para se prevenir do câncer, desperta dúvidas entre mulheres de todo o mundo. Cirurgia tem indicação restrita e exige exame não coberto pelo SUS 



Junia Oliveira

Estado de Minas: 15/05/2013 


Uma decisão drástica tomada por uma das artistas mais bem pagas e admiradas de Hollywood fez ontem mulheres do mundo inteiro voltarem os olhos para o próprio corpo, com um sentimento misto de surpresa, curiosidade e preocupação. Apesar de ter atraído a atenção de meios de comunicação de todo o planeta, a cirurgia de remoção total dos seios como medida de prevenção ao câncer de mama, anunciada pela atriz Angelina Jolie, está longe de ser modismo de uma estrela de cinema, nada tem de estética, muito menos pode ser feita à revelia. O procedimento é indicado em casos específicos, para uma parcela rara de mulheres com chance altíssima de incidência de tumor, de caráter hereditário, em decorrência de uma mutação genética. Mesmo entre as pacientes que se encaixam nesse grupo de risco, nem todas têm acesso à opção de Angelina: no Brasil, é preciso ter plano de saúde ou recursos para bancar o diagnóstico, uma vez que o Sistema Único de Saúde (SUS) só cobre mastectomia depois de identificada a doença e não contempla um dos principais exames para detecção do problema, que custa em média R$ 8 mil.

E os médicos alertam: não é qualquer caso de câncer na família que leva à indicação de retirada das mamas. De acordo com o Ministério da Saúde, esse é o segundo tipo de tumor mais frequente entre as mulheres, respondendo por 22% dos novos casos. Mas o câncer de mama hereditário (quando uma ou mais parentes de primeiro grau, como mães e irmãs, têm a enfermidade) acomete apenas 10% do total – cerca de 5 mil pacientes por ano no Brasil.

O oncologista André Márcio Murad, pesquisador do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais e do Centro Avançado de Tratamento Oncológico (Cenantron), conta que a indicação da mastectomia preventiva ocorre em três situações. A primeira indicação é para mulheres que tenham a mutação dos genes BRCA-1 e 2 – hipótese em que se encaixa o caso da atriz norte-americana. Esses genes são responsáveis pela autorreparação do DNA das células, quando sofrem agressões por toxina ou má alimentação. Quando ocorre alguma transformação, a capacidade de reparação é afetada e o organismo torna-se predisposto à doença. Esse é o tipo de problema que pode ser detectado pelo exame não coberto pelo SUS.

O teste é pedido em casos de suspeita de síndrome genética, que também é o segundo fator para indicação da cirurgia: muitos casos na família de câncer de mama (feminino ou masculino), ovário, próstata e pâncreas e, principalmente, se eles acometem pacientes com idade abaixo de 50 anos. O terceiro critério é a chamada bilateralidade, quando a paciente tem a doença nas duas mamas ou nos dois ovários.
Diante desse quadro, explica o médico, o paciente tem 80% de risco de ter, em algum momento da vida, câncer de mama, índice que é de 50% para que o mal se manifeste no ovário. “Nesse caso, vale a pena instituir medidas preventivas, que variam de acompanhamento com exames periódicos ao uso de medicamentos”, afirma.

O presidente da Regional Minas Gerais da Sociedade Brasileira de Mastologia, João Henrique Penna Reis, acrescenta que, mesmo quando feito na rede particular, o exame para constatação da mutação no gene BRCA tem uma série de exigências. Ele alerta: “As pessoas não devem sair correndo atrás do teste, que é de indicação restrita e vai beneficiar um número pequeno de pessoas”. A mulher só se submete a ele depois de avaliação com geneticista e psicólogo, que vão identificar, inclusive, a capacidade do paciente para lidar com os resultados.

O especialista conta que a parte cara do teste é fazer o sequenciamento dos genes para identificar a mutação. Na primeira etapa do exame, é avaliado um parente que teve câncer. Se identificada a mutação, a paciente com suspeita da doença também tem os genes analisados, procedimento que custa entre R$ 400 e R$ 500.

Nesses casos radicais, os dois médicos são unânimes na defesa da retirada dos ovários, em vez das mamas, pois o câncer nessas estruturas tem diagnóstico mais difícil e é mais agressivo. “Com a mastectomia, reduz-se em 90% a chance de ter câncer de mama. Já a retirada dos ovários reduz apenas em 60% a chance de doença nas mamas, mas em 90% a probabilidade de ela se manifestar no ovário”, diz André Murad.

VIDA NOVA A empresária Silvana Hamade, de 50 anos, vive a milhares de quilômetros da atriz Angelina Jolie, mas sabe como ela deve estar se sentindo. Silvana fez a mastectomia há oito meses, como forma de se prevenir contra a doença que na família acometeu tias e a irmã. A mãe dela também passou pelo procedimento, há quatro meses.
Com o histórico familiar, há um ano, em uma consulta com a mastologista, a empresária se viu diante de duas opções: fazer exames a cada seis meses ou a cirurgia radical. A decisão não demorou. “Eu ia ficar de seis em seis meses procurando um câncer, tensa, esperando resultado pelo resto da minha vida. E, se acontecesse, teria de tirar a mama, sem contar a rádio e a quimioterapia”, conta. “É uma mistura de coragem, por fazer, e covardia, por não querer ficar doente”, diz. Silvana fez o procedimento com um cirurgião plástico e já saiu do consultório com a prótese de silicone.

Depois do susto, autoestima recuperada. “Não fico pensando que não tenho mais seio, até porque nunca me vi sem mama. Fiquei com o seio do tamanho que era e, se eu não falar, ninguém nota”, afirma. Para a empresária, racionalidade foi fundamental: “Eu pude escolher o jeito que queria, a hora que quisesse. Tive todas as opções, o que, quando você está com câncer, não tem. Você começa a correr atrás do tempo. E eu queria ter o tempo para mim”.

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