segunda-feira, 24 de junho de 2013

Rejeição de interlocutores ameaça legado dos protestos

folha de são paulo
ANÁLISE
LUCIANA COELHODE SÃO PAULOOs manifestantes que saíram às ruas do Brasil nas duas últimas semanas têm lições a tirar do Occupy Wall Street, movimento que chacoalhou o debate político nos EUA em 2011 e 2012 e desde então viu sua relevância se dissipar sem legado maior.
A maior delas: por mais poderosa que seja uma massa, ela não pode se dar ao luxo de rejeitar interlocutores.
A dimensão e a ressonância dos protestos, a polarização política dos dois países e a pulverização de demandas tornam a comparação automática (e, sim, lá houve vandalismo por uma minoria, mas menos disseminado).
Tanto que na última semana o Occupy publicou em seu site um texto de apoio ao movimento brasileiro.
Outro ponto comum foi ter criado um debate sobre realidades distintas.
No caso americano, sobre a desigualdade, por muito tempo assunto restrito ao círculo acadêmico e de ativistas.
No brasileiro, a cola por trás do quebra-cabeças é menos clara, mas pode ser resumida, talvez, na dissonância entre o país que virou "hype" em manchetes internacionais e aquele onde ainda há muito a consertar.
O fato de a sensação sobrepor-se à mensagem pode ser um começo ou um fim.
Nos EUA, foi um fim. Em outubro de 2011, quando o movimento americano tinha apenas um mês de vida, a Folha ouviu de um líder de sua ala de Washington que o objetivo, naquele primeiro momento, era "atrair as pessoas para a conversa", pois o país até então só "exigia soluções sem debater os problemas".
ESQUERDA
O recado, nos EUA, guardava clara identificação com a esquerda, sob a bandeira da desigualdade crescente, e era alimentado por recém-formados desempregados.
Tomava como alvo o sistema financeiro, simbolizado pela rua que abriga a Bolsa de Valores de Nova York, Wall Street, perto da qual os manifestantes acamparam.
No Brasil, a insatisfação ainda soa geral e genérica, assim como a massa que lhe deu voz. No primeiro momento, isso tem facilitado a adesão. Em um passo seguinte, arrisca transformar tudo em ruído.
A horizontalidade da liderança e o crescimento orgânico dos protestos também repetem a versão americana. Nos EUA, nunca se forjou uma lista de demandas nem se conseguiu estabelecer interlocutores. Havia assembleias onde a insatisfação contra o "sistema" era palpável, mas nunca organizada em metas ou prioridades.
Políticos eram rejeitados em bloco, o que impediu o estabelecimento de diálogo.
Aos 21 meses de vida, o movimento pouco aparece na mídia. Quando é discutido, a história contada é a da crise de identidade adolescente de uma criança promissora.

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