terça-feira, 9 de julho de 2013

Governo federal lança programa de saúde que obriga estudante de medicina a atender dois anos no SUS‏


PACTO DA POLÊMICA 

Governo federal lança programa de saúde que obriga estudante de medicina a atender dois anos no SUS
 

Julia Chaib, Étore Medeiros, Juliana Colares e Karla Correia

Estado de Minas: 09/07/2013 


Brasília – Ciente da polêmica em torno das principais medidas do Programa Mais Médicos, lançado ontem dentro do pacto pela saúde, a presidente Dilma Rousseff decidiu comprar a briga em torno da contratação de profissionais estrangeiros e do ciclo obrigatório de dois anos que será introduzido nos cursos de medicina públicos e privados em todo o país, incluindo a obrigatoriedade de estudantes atenderem no Sistema Único de Saúde (SUS) a partir de 2015. Anunciado como resposta às manifestações que tomaram conta das ruas do país e lançado sob a forma de medida provisória, o programa já sofre pressões das entidades representantes da classe médica.
“Não se pode obrigar um médico que prefere viver na capital a ir para o interior, não se pode fazer isso, mesmo que possamos oferecer toda a estrutura necessária e uma boa remuneração”, disse Dilma ontem, durante o lançamento do pacote. “Mas nós precisamos admitir, honestamente, que algo deve ser feito para que todos os brasileiros tenham direito a um médico e é disso que se trata de garantir que todos os brasileiros tenham acesso a um médico”, defendeu a presidente.
Minutos após ela discursar, o Conselho Federal de Medicina (CFM) criticou duramente o pacote de medidas, classificando-o como meramente eleitoreiro. O presidente do CFM, Roberto D’Avila, classificou a iniciativa do governo federal de “vazia e sem consistência”. Em carta conjunta, outras três entidades médicas repudiaram o pacto. Já há ameaças de judicialização e de greve.
Segundo D’Avila, um dos pontos que devem ter a constitucionalidade questionada no Supremo Tribunal Federal (STF) é o que libera os médicos formados no exterior de se submeterem ao Revalida, exame aplicado para validar o diploma de estrangeiros. Eles receberiam uma autorização provisória, após treinamento de três semanas. Também seriam monitorados por uma universidade federal ou uma secretaria de saúde durante o contrato no Brasil. “Não existe CRM (registro profissional médico) provisório. Ou você tem CRM para trabalhar como médico ou você não tem CRM e fica sob a responsabilidade de um tutor, sem tocar no paciente. O que eles estão fazendo é uma mentira, uma enganação”, disse.
As medidas foram, em grande parte, elaboradas em virtude da forte pressão de prefeitos em relação ao financiamento da assistência médica nos municípios e às dificuldades de atrair profissionais para regiões distantes. Para eles, mesmo quando oferecidos grandes salários, os médicos não aceitam o trabalho em cidades do interior. “O Conselho Federal de Medicina diz que não faltam médicos, mas que o problema é na distribuição deles. O problema é que buscamos médicos, mas não conseguimos”, disse o prefeito de Porto Alegre, José Fortunati.
A mudança no currículo prevista no pacote também é alvo de pesadas críticas. No fim da grade tradicional de seis anos, os estudantes de medicina serão obrigados a cumprir um ciclo de dois anos de trabalho no SUS. “Isso é uma ofensa à inteligência das pessoas. É uma manobra para explorar a mão de obra médica. O formando já trabalha no SUS, nos hospitais universitários”, disse o presidente da Federação Nacional dos Médicos (Fenam), Geraldo Ferreira. O presidente do CFM foi ainda mais duro. Disse que a medida é típica de países totalitários e que “nações sérias” criam condições para os profissionais irem espontaneamente para o interior. O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, disse que não se trata de um serviço civil obrigatório e que o estudante receberá uma remuneração de até R$ 8 mil.

O pacote da Saúde

MUDANÇAS NOS CURSOS DE MEDICINA
Para ampliar vagas de medicina no país e atrair profissionais para áreas que carecem de atendimento, o governo federal fará mudanças nos cursos públicos e privados de medicina para alunos que ingressarem na graduação a partir de 2015.

Os primeiros seis anos de curso terão a mesma estrutura atual. Terminado esse primeiro ciclo, os estudantes não poderão mais pedir o registro no Conselho Regional de Medicina (CRM). A mudança acontecerá nos últimos dois anos.
No 7º e 8º anos, o estudante trabalhará com um registro provisório do CRM e só poderá atuar por meio de um vínculo com a instituição de ensino. Não será permitido dar plantão por fora nem abrir clínica ou consultório.
Nesses dois anos extras, chamados pelo governo de 2º ciclo, o médico deverá trabalhar exclusivamente em unidades ligadas ao Sistema Único de Saúde (SUS).
O estudante receberá durante os dois anos uma bolsa do Ministério da Saúde, com valor ainda não definido – a expectativa é de que fique entre R$ 3 mil e R$ 8 mil.
O governo pretende criar 11.447 vagas de graduação em medicina até 2017, em 117 municípios.

MÉDICOS ESTRANGEIROS

Para aumentar o número de médicos em regiões mal atendidas do país, o governo federal pretende abrir 10 mil postos de trabalho.
Uma lista de vagas por cidades será divulgada em 26 de julho e os médicos interessados em participar do programa terão dois dias para se inscrever definindo onde querem atuar.
O governo federal vai liberar uma bolsa de R$ 10 mil e uma ajuda de custo pagas pelo Ministério da Saúde para os profissionais que foram para regiões mais carentes.
A ajuda poderá ser de R$ 30 mil para os que forem trabalhar na Amazônia Legal, na fronteira e nos distritos sanitários indígenas; R$ 20 mil para o Nordeste, Centro-Oeste (com exceção do DF) e Vale do Jequitinhonha; e R$ 10 mil nas capitais e regiões metropolitanas. Nos dois primeiros casos, o pagamento da ajuda será parcelada: 70% no começo e 30% seis meses depois. No último caso o pagamento se dará todo de uma vez.
A previsão é de que as atividades dos selecionados comecem já em setembro.
Os médicos brasileiros terão prioridade para preencher as vagas do programa. Após a convocação dos profissionais brasileiros as vagas remanescentes serão abertas para médicos estrangeiros.
Os profissionais que vierem de fora passarão por período de avaliação e treinamento em universidades do país e só trabalharão se forem aprovados.
Os estrangeiros vão atuar com supervisão de médicos brasileiros por três anos e só poderão atuar dentro do programa por um período determinado.
O Revalida continuará sendo aplicado. O exame será obrigatório para médicos estrangeiros que quiserem ter a liberdade de trabalhar em qualquer lugar do país, mas não aos que aderirem ao Programa Mais Médicos.
INVESTIMENTOS
O pacto pela saúde prevê a expansão e a aceleração de investimentos em mais e melhores hospitais e unidades de saúde e por mais médicos, totalizando R$ 15,8 bilhões até 2014.
Desse montante, R$ 7,4 bilhões já estão contratados para construção de 818 hospitais, 601 Unidades de pronto atendimento (UPAs 24h) e de 15.977 unidades básicas.
Os outros R$ 5,5 bilhões serão usados na construção, reforma e ampliação de unidades básicas e UPAs, além de R$ 2,9 bilhões na construção de 14 hospitais universitários.

CRONOGRAMA
Hoje – Publicação da medida provisória, do edital para abertura de vagas do Programa Mais médicos e dos editais para abertura de novos cursos de medicina.

De hoje a 22/7 – Período para adesão dos municípios.
De hoje a 25/7 – Período de inscrição de médicos brasileiros e estrangeiros.
10 a 26/7 – Médicos estrangeiros e brasileiros formados no exterior devem apresentar declaração de inscrição no programa nas embaixadas e consulados em seus países.

26/7 – Definição das vagas por município.
26 a 28/7 – Médicos inscritos definem os lugares em que pretendem atuar.
1º/8 – Publicação de resultado provisório com os médicos brasileiros selecionados para cada região
5/8 – Publicação do resultado final no Diário Oficial da União (DOU).
6/8 – Divulgação das vagas remanescentes para estrangeiros e brasileiros formados no exterior.
13/8 – Publicação do resultado com médicos estrangeiros e brasileiros formados no exterior.
26/8 – Início das atividades de capacitação dos médicos estrangeiros.
2/9 – Início das atividades dos médicos brasileiros.
18/9 – Início das atividades dos médicos estrangeiros. 

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