Combater a inflação
Alta de preços exige ação clara também do governo, e não só do Banco Central, que mostra disposição para elevar taxa de juros
Verdade que, nos últimos 12 meses, a inflação acumulada chegou a 6,7% e terminou acima do limite de tolerância de 6,5% definido pelo Conselho Monetário Nacional.
Deve-se observar a partir de agora, porém, tendência de queda --registrou-se, no segundo semestre de 2012, grande alta de preços forçada sobretudo pela quebra da safra nos EUA, algo que não deve se repetir agora. Ao contrário, já começa a se concretizar a queda do valor dos alimentos no varejo.
Além disso, foi relativamente baixa a chamada taxa de dispersão de junho --do total de produtos medidos pelo IPCA, 55,34% ficaram mais caros nesse mês. Desde março de 2012 esse indicador não ficava abaixo de 60%.
Nada garante que o problema inflacionário esteja devidamente equacionado, contudo. Os preços dos serviços, por exemplo, ainda crescem 8,5% ao ano, e não há sinais de mudança nesse padrão.
Do lado das expectativas, tampouco há o que comemorar. Após mais de dois anos de atuação errática do governo no combate à inflação, poucos analistas acreditam no compromisso com a meta de 4,5%. Pesquisa semanal do Banco Central indica projeções de 5,8% para 2013 e 5,9% para 2014.
Recolocar o gênio da inflação na garrafa ainda demandará esforço. Na reunião do Copom (Conselho de Política Monetária) que começa hoje, espera-se a terceira elevação consecutiva da taxa básica de juros (Selic), possivelmente para 8,5% --em abril, ela passou de 7,25% para 7,5%, e em junho foi a 8%. Já há projeções indicando taxa de dois dígitos nos próximos anos.
A razão, em parte, é o choque cambial dos últimos meses. Em 2013, o real já se desvalorizou cerca de 15%. Assim, bens sujeitos à competição externa devem encarecer --com o dólar mais valorizado, há espaço para aumentar o preço de produtos concorrentes fabricados no Brasil. O Ministério da Fazenda, por isso, cogita reduzir alíquotas de importados para compensar tal efeito.
Tudo somado, permanece desafiador o quadro inflacionário, e a credibilidade em baixa da política econômica em geral --incluindo o Banco Central-- apenas torna a situação mais difícil.
O governo precisaria emitir sinais claros e coerentes a respeito de seus objetivos. Controlar a inflação não é tarefa que possa ficar apenas a cargo do Banco Central. Depende também, por exemplo, de uma gestão orçamentária mais cuidadosa --compromisso que a administração Dilma Rousseff teima em não levar a sério.
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Massacre no Egito
A crise no Egito ganhou contornos mais explosivos com a morte, por forças do Exército, de 51 partidários de Mohammed Mursi, eleito presidente há um ano e deposto do poder, na semana passada, por um golpe militar.A Irmandade Muçulmana, organização à qual Mursi é filiado, classificou a ação como um massacre. Foi de fato o que se verificou diante do quartel da Guarda Nacional, onde o ex-presidente estaria recolhido. Somente um militar morreu no episódio, que teve início com "terroristas" tentando invadir o local, segundo versão das Forças Armadas.
Condenada por líderes de diversos partidos e autoridades religiosas, a violência pode radicalizar a situação. Tornou-se ainda mais difícil para as Forças Armadas validar o discurso tortuoso de que a deposição de Mursi não teve como objetivo golpear o islamismo, mas garantir a democratização. Líderes importantes de outras vertentes muçulmanas que pareciam inclinados a colaborar com os militares já retiraram o apoio.
O episódio também pressiona governos ocidentais a assumir posição menos ambígua em relação ao golpe. As repercussões já chegaram à política dos EUA, onde a oposição republicana ao presidente Barack Obama --não sem uma dose de oportunismo-- passou a defender a suspensão da ajuda aos militares egípcios.
Vozes sensatas cobram apurações sobre os abusos e apelam pelo diálogo entre as forças políticas do país. Desde que Mursi foi destituído, aviva-se a lembrança do que se sucedeu na Argélia, nos anos 1990, quando um golpe contra a frente islâmica que chegava ao poder por meio de eleições resultou em longa e sangrenta guerra civil.
As circunstâncias, é claro, não são as mesmas --a começar pelo fato de a Irmandade não ser uma organização armada. Ainda assim, o papel estratégico desempenhado pelo Egito na região desperta apreensões justificadas a respeito dos próximos passos.
Não há dúvida de que Mursi atuou de maneira sectária, tentou subordinar o Judiciário e patrocinou uma Constituição com feições pouco democráticas.
As Forças Armadas, com seu histórico de autoritarismo laico, também estão muito longe de representar garantia à democratização.
Ou a sociedade egípcia encontra forças e sensatez para se organizar em torno de uma agenda de entendimento, ou o impasse poderá se alongar de maneira sombria e imprevisível.
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