Documentário proibido dos Rolling Stones feito em 1972 segue sendo visto e vendido
EDITOR-ASSISTENTE DA "ILUSTRADA"
Ainda na ressaca da comemoração do cinquentenário da banda, os Rolling Stones atravessam agora o 51º ano de vida em turnê festejada.
Em comparação com seus shows de 1972, as músicas são quase as mesmas --o grupo não fez muita coisa boa de lá para cá--, mas fora do palco as coisas devem ter mudado.
Aos 70 anos, completados na última sexta-feira, Mick Jagger não deve ter mais fôlego para encarar a maratona de sexo, drogas e rock and roll na qual a turnê americana de 1972 estava inserida.
Cocksucker Blues
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Keith Richards prepara heroína em cena de "Cocksucker Blues"
Ele, Keith Richards e Charlie Watts talvez queiram esquecer a fase de devassidão, mas há um fantasma que não permite enterrar essas memórias: o documentário "Cocksucker Blues", hoje presente em vendas on-line ilegais.
Dirigido por Robert Frank, o filme sobre os bastidores da excursão foi encomendado pela banda e, posteriormente, proibido por ela.
Em 1977, o diretor ganhou na Justiça o direito de fazer uma exibição pública anual da obra, desde que ele próprio esteja presente. Frank, 88, compareceu em novembro ao MoMA (Museu de Arte Moderna) de Nova York, que incluiu o documentário em um festival. Jagger registrou um protesto oficial contra a exibição.
Durante anos, pessoas levavam câmeras para filmar o que aparecia na tela nessas sessões. Versões assim circulavam no Brasil, no início dos anos 1980, com a chegada das fitas VHS. A qualidade de imagem era sofrível e várias vezes era possível ver na parte de baixo da tela as cabecinhas das pessoas na plateia.
Atualmente essas sessões não são tão concorridas. A cada ano, o avanço da pirataria espalha mais cópias de "Cocksucker Blues". Para fúria de Jagger, versões com mais qualidade circulam na internet em vídeos compartilhados ou na venda de DVDs "físicos", com capa e ficha técnica.
Editoria de Arte/Folhapress | ||
Até a respeitável loja eletrônica Amazon é usada pelos piratas; volta e meia surge na seção de usados do site uma cópia do filme --na semana passada, um DVD de "Cocksucker Blues" estava à venda por cerca de R$ 330.
O filme entra e sai do YouTube. Raramente completo, é habitualmente colocado em trechos. Depois de horas ou dias no ar, é excluído pela política de direitos autorais do YouTube. Na última segunda-feira, cinco arquivos com trechos eram encontrados ali.
Mas, afinal, o que perturba tanto em "Cocksucker Blues"?
Para começar, o título, algo como "O blues do chupador de pau", tirado do título de uma polêmica canção da banda (leia texto explicativo )".
Depois, cenas explícitas de consumo de drogas e outras quase explícitas de sexo grupal. Na maior parte, protagonizadas por funcionários e amigos dos Stones.
Mas Jagger aparece com a mão dentro da calça, se masturbando, e cheirando cocaína. Richards prepara e consome heroína, além de beber galões de destilados.
SEXO NO AVIÃO
Em uma cena que não aparece em todas as versões piratas, amigos fazem farra no avião da banda com várias tietes nuas e drogadas, enquanto os integrantes da banda batucam e aplaudem. Richards percebe que Frank está filmando e pede que ele pare.
Um dos maiores fotógrafos do século 20, o suíço radicado na América foi contratado pelos Stones, que admiravam suas fotos, notadamente "The Americans", livro de 1958.
Sua intenção de registrar sem censura o mundo dos Stones é atraente e melancólica. Jagger e Richards aparecem fragilizados em sua condição de ídolos paparicados.
Deuses do rock também são criaturas mundanas.
Título do filme vem de canção pornográfica
DO EDITOR-ASSISTENTE DA "ILUSTRADA"A sequência inicial do filme "Cocksucker Blues" explica o título do documentário. Marshall Chess, presidente da então recém-fundada Rolling Stones Records, conta a história da canção homônima.Seguindo os passos dos Beatles, Jagger e Richards decidiram abrir o próprio selo. Mas o contrato com sua antiga gravadora, Decca, exigia um último single.
Contrariada, a banda resolveu então gravar algo pornô, que a Decca certamente rejeitaria e nunca seria lançado.
Surgiu "Cocksucker Blues", canção arrastada que fala de um garoto londrino que faz sexo oral e anal com policiais. Chess põe a música para tocar, o que funciona como prelúdio do tom pesado do filme.
Não há glamour no documentário. Nem beleza. As imagens são captadas em super 8 --apenas as cenas de shows são coloridas, ficando em preto e branco as filmadas em camarins, quartos de hotel, aviões, casas e estúdios.
Há sujeira por todos os lados, como garrafas, restos de comida e cinzeiros cheios. São cenas para derrubar a aura fashion dos Stones: Richards está quase sempre sem camisa e de calça jeans puída; Jagger dá entrevistas a uma rádio de cueca e cabelo desgrenhado.
Cada um deixa transparecer o que tem de pior. Jagger é autoritário, ranzinza, dá xilique. Richards, alternando cigarros, bebidas e heroína, parece um zumbi, entre o riso solto e a carranca. Celebridades como Andy Warhol e o escritor Truman Capote ficam zanzando como moscas em torno dos Stones.
O quadro é depressivo. O baterista Charlie Watts aparece numa cena assistindo à TV, com ar perdido, olhando o vazio. Boa representação do momento emocional da banda.
Mas "Cocksucker Blues" também tem música. E 1972 marca a melhor fase criativa dos Stones. São performances matadoras de clássicos como "Brown Sugar" e "Satisfaction" --esta com participação de Stevie Wonder, então com 22 anos e artista que abria os shows da turnê.
O momento mais bacana traz Jagger e Richards cantando "Happy". Os dois, dividindo um microfone, ainda formam a imagem mais emblemática do rock and roll.
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