sábado, 24 de agosto de 2013

EDUARDO ALMEIDA REIS - Verborragia‏

Pintadas com tintas derrapantes que nem quiabo, nossas ciclovias são ideais para a invenção de mais um esporte: o esqui asfáltico 


Publicação: 24/08/2013 04:00




Pode-se dizer muito em meia dúzia de palavras. Penso, logo existo (Descartes), Só sei que nada sei (Sócrates), Mediocridade dourada (Horácio), O dado está lançado (Júlio César). Há divergências a respeito dessa última sentença. Suetônio disse que César, ao transpor com suas tropas o Rio Rubicão, teria exclamado Jacta est alea, “a sorte está lançada”, mas Plutarco disse que a frase foi em grego “o dado está lançado”, reproduzindo o comediógrafo Menandro (342-292 a.C.).

Sempre fui bom de síntese – método, processo ou operação que consiste em reunir elementos diferentes, concretos ou abstratos, e fundi-los num todo coerente. Nada brilhante como a turma citada acima: digamos que minhas sínteses fossem comentários de 200 ou 300 palavras, que os jornais e as revistas encomendam para preencher suas páginas. Já pensaram numa página, como esta aqui, preenchida com Penso, logo existo e só com as três palavras de Descartes? Que, por sinal, foram cinco em francês: Je pense, donc je suis. E ficam supimpas em latim: Cogito, ergo sum.

De uns tempos a esta parte, contudo, baixou ni mim uma verborragia preocupante. Um dos arquivos aqui do computador estoca as tolices que vou compondo para recolher, conforme o assunto e o número de palavras, e publicar nos veículos em que trabalho. Uma revista pede 750 palavras, outra limita a 560 e uma terceira exige 4.200 caracteres com espaços, nem mais, nem menos.

Para que o leitor faça ideia, até “menos”, na frase anterior, havia 1.403 caracteres com espaços. Penso que nesta coluna, quase diária, do Grande Jornal dos Mineiros, cabem dois ou três comentários totalizando 600 palavras, a seção “O mundo é uma bola”, que muito me diverte fazer com 200 palavras e uma ruminança. Ninguém aguenta mais que uma ruminança, que é para ruminá-la durante horas. Veículos que entopem de citações uma página conseguem que os seus leitores não guardem uma só frase.

Pois muito bem. Nos últimos tempos, com o acesso de verborragite, está ficando difícil encontrar suelto de menos que 400 palavras. Se uso dois num Tiro & Queda, não sobra espaço para “O mundo é uma bola”.

Pot-pourri


Não dá para entender a implicância do nosso Mario Fontana com a febre cicloviária belo-horizontina. Já o nosso Téo Mascarenhas disse que a PBH inventou a Ciclovia do Quiabo, o que não espanta num país que já teve a Ferrovia do Diabo matando milhares de operários e engenheiros durante a construção. Pintadas com tintas derrapantes que nem quiabo, nossas ciclovias são ideais para a invenção de mais um esporte: o esqui asfáltico. Ladeiras não faltam para a prática da salutar atividade esportiva, ainda mais emocionante quando se sabe que os motoristas não respeitam as faixas pintadas para uso exclusivo dos ciclistas, nas quais só transita uma ou outra bicicleta pela Páscoa da Ressureição.

Vejam-se os bairros de Santo Antônio e São Pedro: são ideais para a instalação de ciclovias, desde que a PBH construa elevadores de bicicletas. Há exemplos em algumas regiões europeias. O ciclista agarra um cabo que sobe até ao alto do bairro. Uma vez lá em cima, o bicicletista volta pelas ladeiras muito íngremes, que são dezenas em diversas ruas.

Pulemos para os cerimoniais. Jorge Mario Bergoglio, o papa Francisco, é o terror dos cerimoniais. Não os respeita e vem de provar que o pontificado é infenso ao vírus H1N1. Idoso, exausto, com um só pulmão, enfrenta as chuvas e os ventos beijando todos os fiéis que dele se aproximam. Qualquer cidadão que não fosse papa, depois de se expor às intempéries e aos vírus que andam matando neste país grande e bobo, griparia com direito a extrema-unção. Repórteres e fotógrafos que ficaram de plantão no Sumaré atestaram que aquilo é uma Sibéria.

Governos de Minas sempre tiveram cerimoniais comandados por profissionais da melhor competência. Lembro-me de solenidade na Academia Mineira de Letras, onde o cerimonialista oficial inventou uma faixa para separar os jornalistas dos demais convidados. Como acadêmico, tive o direito de ficar do lado de cá da faixa, enquanto o profissional do cerimonialismo examinava as credenciais e os convites para botar os jornalistas do lado de lá.

O tipo da função fácil, porque a rapaziada, quando não está com o colete de fotógrafo profissional (tenho um), máquina e sacola com diversos equipamentos, pode ser identificado pela indumentária masculina ou feminina. Jornalistas vestem-se mal, mistura de salários baixos e egos elevados. Em verdade vos digo: está para nascer o jornalista que caiba em seu ego. Os cronistas, porque achamos que o mundo gira em torno dos nossos umbigos; os repórteres, porque têm a certeza de que a importância da cerimônia reportada depende do que vão escrever depois de voltar às redações. O pessoal das tevês dispensa apresentações: cerimônia sem tevê é bisonharia, acanhação, escabreação, encalistramento.

 O mundo é uma bola

24 de agosto tem um monte de coisas para escrever, mas falta espaço. Em 410, Roma foi saqueada por Alarico I; em 1891 Thomas Edison patenteia a câmera de cinema; em 1943 a aviação aliada destrói 80% de Frankfurt e em 1954 Getúlio Vargas se suicida com um tiro no peito.

Ruminanças
“...piora com o remédio” (Virgílio, 70-19 a.C.).

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