Vacina em spray criada nos EUA tem o
princípio ativo protegido por nanocápsulas de proteína, que impedem que a
substância seja barrada pelas secreções nasais
Paulo Lima
Estado de Minas: 26/09/2013
Um dos grandes
desafios da medicina é aposentar as vacinas com agulha. Não se trata de
agradar aos que temem as injeções. Além de uma questão de segurança,
cientistas buscam eficiência. A terapia por meio de um pulverizador
nasal surge como uma promissora alternativa. Estudos têm indicado que a
vacina em spray apresenta mais eficácia contra doenças virais. Um dos
desafios, porém, é fazer com que as secreções da mucosa não embarreirem o
que é lançado no nariz. Cientistas americanos podem ter dado um passo
importante na solução desse impasse. A vacina tem como base nanocápsulas
de proteína que revestem o princípio ativo, facilitando a chegada dele à
parte do corpo que precisa ser protegida ou tratada.
“Descobrimos
que as nanocápsulas foram resistentes na via respiratória e tivemos
resultados além do esperado. Houve imunização sistêmica”, destaca
Adrienne Li, pesquisadora do Departamento de Engenharia Biológica do
Instituto de Tecnologia de Massachusetts. A integrante do estudo
acredita que a estrutura criada pode se transformar em um método que
revolucione a aplicação de vacinas. As nanocápsulas são formadas por
combinações de proteínas cobertas de lipídeos. A união faz com que elas
fiquem densas e fortes — condição para resistir à ação do muco nasal. Os
resultados alcançados foram detalhados na edição de hoje da revista
científica Science Translational Medicine.
Para testar a eficácia
das nanocápsulas, os cientistas fizeram um experimento com camundongos.
Uma parte das cobaias recebeu doses da vacina em spray. A outra, o
tratamento tradicional, ou seja, aplicações por meio de injeção. Os
bichos imunizados com as nanocápsulas receberam proteção nos pulmões, no
intestino e no trato reprodutivo. Isso foi possível porque houve uma
ativação das células T, que são responsáveis pela defesa imunológica
contra vírus, bactérias e fungos. “Essa resposta imune generalizada
indica que o local de administração da vacina é um fator importante para
a proteção de doenças infecciosas”, avalia Li.
De acordo com Darrel
Irvine, autor da pesquisa americana de nanocápsulas, se a eficácia da
vacina via aerosol na mucosa for confirmada em animais maiores, a
abordagem pode ser útil para o desenvolvimento de imunizações contra
agentes patogênicos respiratórios, como os causadores da gripe, e outros
micro-organismos que representam risco à saúde humana. “Essas vacinas
podem ajudar a proteger contra a influenza, mas a prevenção se estende
às doenças sexualmente transmissíveis, como o papilomavírus humano
(HPV), o HIV e o herpes”, prevê o professor de engenharia biológica da
Escola de Medicina de Harvard, nos Estados Unidos.
Irvine cogita até
a exploração da técnica para combater células tumorais. “As minicamadas
poderiam ajudar a aumentar as células de proteção no corpo e a inibir
as estruturas infecciosas do câncer. São resultados promissores.
Pretendemos, o quanto antes, seguir adiante”, diz.
Também na USP O
Brasil também pesquisa a vacina em spray. O projeto acontece na
Universidade de São Paulo (USP). Segundo o professor Marco Antônio
Stephano, que orienta o projeto do biólogo Jony Yoshida, é uma vacina
feita à base de quitosina, substância presente na casca de crustáceos,
como camarões e caranguejos.
Com essa formação, a vacina gruda na
mucosa nasal, facilitando que o princípio ativo seja absorvido pelo
organismo. “Já testamos a eficácia em ratos e os resultados foram
animadores. Agora, estamos em fase de adaptação para que essa vacina
seja produzida em pó. Nossa esperança é que, daqui a cerca de seis anos,
ela já esteja disponível para uso em humanos”, diz Stephano.
Sobre o
estudo dos pesquisadores americanos, Stephano acredita que tem boa
aplicabilidade e poderá, de fato, ser uma alternativa importante na hora
da imunização. O pesquisador faz um comparativo com a vacina
brasileira. “Ambas vão trazer vantagens significativas para a medicina,
mas o nosso modelo de nanopartículas é mais barato. Isso poderá ser
determinante para oferecer à população uma vacina de baixo custo com
efeitos atestados.”
Já existem imunizações em spray aprovadas para
uso humano. Uma das mais conhecida é a contra poliomielite, que é
absorvida no trato digestivo. Há também a vacina contra a gripe entregue
via nasal e a terapia nasal contra cólera, febre tifoide e rotavírus.
Mas, de acordo com os pesquisadores americanos, o resultado não é tão
consistente quanto o alcançado com as nanocápsulas.
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