Zero Hora 02/07/2014
Duas retas finais: a da novela Em Família e a da Copa do Mundo no
Brasil. Acompanho as duas. A novela das nove, comecei a assistir pra
valer só no último mês, e façamos justiça ao autor Manoel Carlos: a
audiência pode não ser a esperada, mas é uma delícia ver diálogos
hiper-realistas e cenas domésticas que se desenrolam num ritmo muito
parecido com o nosso, nos dando a possibilidade de sermos voyeurs
olhando pelo buraco da fechadura de portas alheias. Me divirto, relaxo,
esqueço da vida.
Só uma coisa me aflige, não sei se quem assiste à novela também
percebeu: alguns personagens dão três beijinhos quando se encontram.
Três. Será o novo modismo da zona sul carioca? Fiquei nervosa, confesso.
Logo agora, quando estamos observando um avanço aqui no Sul: o fim
dos dois beijinhos. Não sei como essas coisas iniciam, quem introduz,
como pega, mas agora, na capital dos gaúchos, a gente está fazendo como
os paulistas, dá um beijo só e basta.
Gosto de simplificações. Gosto de tudo que é enxuto, econômico,
objetivo. Poucos meses atrás, estive em São Paulo visitando uma amiga e
ela me apresentou sua turma, e saí tascando dois beijos, um que era
retribuído e outro que ficava no ar, porque acostumados com um só, os
paulistas logo afastavam suas suculentas bochechas depois do primeiro,
fazendo com que eu parecesse uma caipira. Oh, infernais dois beijos,
para que o excesso?
Pois agora, para complicar, vem a novela das nove lançar três
beijinhos. Tem gente que ficou apreensivo com o insosso beijo gay da
Clara e da Marina, mas escandalosos mesmo são os três beijinhos entre a
Helena e a Shirley. Vamos nos preocupar com coisa séria, por favor.
Não suporto dar três beijos, mas dou quando não há a mínima chance
de fuga. Três beijos é um exagero, porém não se sintam menosprezados os
que possuem o costume, pois na aristocrática Suíça se dá o mesmo. Três
beijos. Por que motivo, não sei.
Mas, excetuando-se a Suíça, o interior do Rio Grande do Sul e os
estúdios do Projac, a tendência mundial é a da subtração, os modos se
refinam. Me garantiram: em Porto Alegre não se dá mais dois beijinhos. É
um só.
Saiu no Diário Oficial?
Um beijo só, aleluia. Tenho dúvida se a ideia já está disseminada,
mas diante do desserviço da novela global, ofereço minha contribuição
com essa crônica, apoiando. Um único beijo é a elegância da economia. Um
único beijo é suficiente para demonstrar nossa simpatia. Um beijo
rápido, talvez com o adendo de um abraço nos casos mais íntimos e em
situações calorosas, e estaremos todos devidamente cumprimentados.
Antes que me perguntem: no ombro, de preferência, nenhum. E mordida, só entre lençóis.
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