segunda-feira, 29 de outubro de 2012

EDITORIAL



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Mudança, de novo

São Paulo volta a optar pela troca das forças no comando da cidade; estrangulamento financeiro impõe a Haddad renegociar dívida municipal
Entre manter ou trocar a aliança de partidos que governa a cidade desde 2005, a maioria do eleitorado paulistano decidiu pela segunda opção. Fernando Haddad, do PT, jejuno em eleições até este ano, debutará como chefe do Executivo à frente da maior e mais complexa metrópole da América do Sul.
Não é de hoje que o eleitorado da capital rejeita as forças no poder. Dos oito pleitos desde 1985, quando adotaram-se as votações diretas para prefeito, a situação prevaleceu em apenas dois -a eleição de Celso Pitta (apoiado por Paulo Maluf), em 1996, e a recondução de Gilberto Kassab, em 2008.
Nesses dois casos excepcionais, a economia nacional havia crescido acima de 4% ao ano, em média, ao longo do mandato anterior. Os outros seis governos não contaram com ambiente tão favorável e acabaram sucedidos por opositores.
O prefeito de São Paulo, obviamente, não interfere em ciclos econômicos nacionais. Sofre, entretanto, efeitos das recaídas do PIB.
A cidade quebrou em meados dos anos 1990. Quando os cofres municipais foram resgatados pela União em 2000, o acordo estrangulou sua capacidade de investir.
O caixa se esvai com a obrigação de repassar 13% da receita disponível ao Tesouro Nacional, a título de saldar o custo do socorro. A dívida, cujo montante supera um Orçamento anual, inviabiliza tomar recursos para investimentos. Ela é determinante para o sucesso ou o fracasso da administração.
Daí a premência, para o prefeito eleito e para a cidade, da renegociação dos termos do acordo financeiro com a União. A taxa de correção vigente nesse contrato, que tem chegado a 17% ao ano, foge à realidade de um país que derrubou os juros básicos.
É preciso abater os repasses anuais e o montante da dívida, a fim de recuperar margem para investir, prioritariamente, na sobrecarregada infraestrutura urbana -em especial a rede de transportes, corredores de ônibus à frente- e na habitação popular -cujos padrões precários conflitam com os ganhos no poder de consumo dos trabalhadores nos últimos anos.
Nem tudo se resume à disponibilidade de recursos estatais, entretanto. A prefeitura, com ajuda da Câmara Municipal, tem poder de intervenção na cidade maior que o seu Orçamento, mesmo menos engessado, seria capaz de propiciar.
Enquanto a prefeitura luta para investir R$ 6 bilhões ao ano, o mercado imobiliário movimenta R$ 15 bilhões só em unidades novas. O setor privado constrói a cidade de fato, como seria de esperar, mas pode fazê-lo de modo mais vantajoso para o interesse público.
Será o caso de manter a permissão para vagas de garagem em edificações novas nas localidades bem servidas por transporte coletivo? Que contrapartidas urbanísticas exigir de empreendimentos que atraem multidões de usuários?
Em que regiões se devem incentivar desenvolvimento e construção? Onde e sob que critérios favorecer a instalação de empresas?
É melhor permitir que as torres fiquem mais altas ou que a cidade se espraie? Como assegurar que o boom imobiliário também beneficie famílias mais pobres?
São exemplos de intervenções na alçada da municipalidade que conformarão investimentos multibilionários. Prevista para começar até o fim deste ano, a revisão do Plano Diretor -lei que orienta o desenvolvimento urbano por mais de uma década- ganha contornos de "constituinte" paulistana.
Parcerias com a sociedade em outras áreas também podem ajudar o futuro prefeito a contornar a inelasticidade de recursos e a baixa eficiência da máquina pública. Este é o caso da saúde e da educação, setores em que as administrações petistas têm dificuldade de resguardar o interesse público do assédio corporativista e sindical.
Melhorar a débil fiscalização das organizações sociais que administram unidades municipais de saúde é o caminho, sem dúvida, para legitimar o modelo e afastar desse segmento grupos incompetentes ou mal-intencionados. Mas voltar ao esquema estatal seria um retrocesso a prejudicar, em primeiro lugar, os usuários desses serviços.
No ensino, a desaceleração da demanda por vagas no nível fundamental -em razão da queda na fecundidade das mulheres- abre espaço para incrementar a qualidade. Como um mínimo de 31% do Orçamento precisa ser destinado à educação, haverá cada vez mais dinheiro por aluno matriculado.
Aumentar a carga horária efetiva -sobretudo em português e matemática- é um meio reconhecido de diminuir a desigualdade de oportunidades entre pobres e ricos.
Se fosse um país, a capital paulista seria o sexto mais populoso da América do Sul. Seus problemas e oportunidades, sem dúvida, se comparam aos de uma nação.
"Sic transit gloria mundi" (assim passa a glória do mundo). O famoso aviso aos papas católicos recém-empossados serve como alerta e desafio ao eleito Fernando Haddad. Que faça um bom governo.

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