quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Raça e educação nos EUA


JULIA SWEIG
Há um mito nacional segundo o qual, com Obama na Casa Branca, somos uma sociedade pós-racial

Em 1954 a Suprema Corte dos EUA decretou por unanimidade que a segregação entre alunos brancos e negros nas escolas era inconstitucional. Dez anos depois, a Lei dos Direitos Civis proibiu as principais formas de discriminação racial, de gênero, religiosa ou étnica.
Em 1965, Lyndon Johnson sancionou a Lei de Direitos do Voto, pondo fim a práticas que privavam os afroamericanos do direito de votar. É história recente.
Quando Barack Obama apareceu para o público no Grant Park, em Chicago, na noite em que foi eleito em 2008, as câmeras mostraram os rostos de americanos, não apenas de origem africana, chorando diante da enorme magnitude histórica da conquista dele e dos EUA.
Para a maioria de nós, a eleição comprovou a promessa de Martin Luther King de que "o arco moral do universo é longo, mas se inclina em direção à justiça". O fato de os ancestrais de Michelle Obama, escravos, terem construído a Casa Branca, onde ela e sua família hoje vivem, conta a história toda -quase.
A persistência nos EUA do racismo, virulento e monótono, levou Obama, meio século após as conquistas históricas dos direitos civis, a concluir que ele não pode ser o "presidente negro" da América.
É claro que a identidade de Obama não é só "negra". Sua mãe era branca, seu pai nasceu no Quênia, ele foi criado no Havaí, na Indonésia e por avós brancos do Kansas.
Mas, como relatou o "New York Times" domingo, sua rejeição explícita da política de identidade nasce não apenas de sua própria história pessoal miscigenada.
O cálculo se deve a um desejo de promover a agenda da inclusão social para todos os americanos, incluindo os afroamericanos, mas não se limitando a eles. A escolha de Obama de evitar participar diretamente de um discurso público sobre raça também reflete a ideia de que mostrar é melhor que dizer.
O "NYT" relata que ele e Michelle veem a Presidência como oportunidade de mostrar às crianças negras o que é possível para o futuro delas. Seria difícil discordar.
Mas há uma oportunidade perdida. O NYT também tratou domingo dos efeitos profundamente corrosivos sobre o coração, a alma e a identidade de crianças afroamericanas que estudam em escolas particulares de elite de Manhattan, onde, apesar de estarem mais representadas, há pouco diálogo comunitário sobre raça, classe e privilégios.
Um antigo aluno disse ao jornal que "o nível do silêncio é assombroso". "As pessoas são educadas demais para falar disso", comentou.
A Suprema Corte dos EUA não é tão educada assim e vai em breve julgar uma ação que contesta a ação afirmativa em universidades, uma prática que abriu portas para conquistas de milhões de americanos.
Basta olhar o Tea Party para compreender a cautela do presidente. Mas muito mostrar e pouco falar podem perpetuar um mito nacional segundo o qual, com Obama na Casa Branca, somos uma sociedade pós-racial. Talvez sua reeleição -que não é nenhuma certeza- o faça mudar de ideia, apenas um pouco.
JULIA SWEIG é diretora do Programa América Latina e do Programa Brasil do Council on Foreign Relations

Nenhum comentário:

Postar um comentário