quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

CIÊNCIA » Os nomes de 2012 - Max Milliano Melo‏


Revista Nature divulga lista de personalidades científicas que mais se destacaram no ano. A relação é encabeçada por Rolf-Dieter Heuer, líder da pesquisa que identificou o bóson de Higgs, partícula responsável pela formação da matéria 

Max Milliano Melo
Estado de Minas: 20/12/2012 

A detecção do bóson de Higgs, uma partícula elementar responsável por conferir massa à matéria, foi a grande estrela da ciência em 2012. Por isso, não é de se estranhar que o maestro da legião de pesquisadores envolvidos na busca pela partícula — a peça que faltava para comprovar o modelo atômico — seja o primeiro nome na tradicional lista elaborada pela revista Nature com os 10 pesquisadores que mais se destacaram no ano. Diretor-geral do Centro Europeu de Pesquisas Nucleares (Cern), o alemão Rolf-Dieter Heuer é descrito pela revista como “o diplomata de Higgs”, por ter sido extremamente habilidoso ao lidar com a pressão que seu laboratório sofria para anunciar o achado — alguns cientistas preferiam esperar por novos testes antes de tornar a descoberta pública. Além dele, outros nove pesquisadores, que contribuíram das mais variadas formas para o progresso científico do mundo, têm seus trabalhos destacados pela publicação científica (veja quadro).

Quando a provável detecção do bóson — erroneamente chamado de partícula de Deus — foi divulgada, importantes pesquisadores, como o renomado físico britânico Stephen Hawking, disseram que a descoberta era merecedora do prêmio Nobel, a mais importante láurea científica do mundo. Além do próprio Peter Higgs, o homem que propôs a existência da partícula, hoje com 83 anos, especula-se que o prêmio possa ir para Heuer, chefe do LHC, o Grande Colisor de Hádrons, o maior equipamento científico do mundo, com 27km de extensão, na fronteira entre a França e a Suíça.

Segundo o físico Rogerio Rosenfeld, da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp), colaborador do estudo liderado por Heuer, o feito é dos mais importantes. “O bóson de Higgs é o último pedaço que falta ser descoberto do chamado Modelo Padrão das Partículas Elementares, que descreve com sucesso quase todos os dados experimentais medidos até o momento. Em particular, ele é responsável pela origem das massas das partículas elementares”, conta o especialista, lembrando que os pesquisadores estão repetindo os experimentos para terem certeza de que realmente identificaram a partícula.

Diplomacia A Nature destaca o trabalho conciliador e diplomático do físico alemão. Segundo a revista, ele conseguiu lidar com duas visões bastante divergentes: enquanto os governos que financiam o Cern e o LHC pressionavam para que os resultados das pesquisas fossem divulgados, os cientistas, reticentes com a possibilidade de dar uma informação falsa, insistiam para adiar o processo até o fim deste ano. Ao longo do primeiro semestre, a pressão dos dois lados se tornou uma bomba prestes a explodir. 

A solução encontrada por Rolf-Dieter Heuer foi assumir os riscos que os pesquisadores não podiam. Em julho, ele anunciou, de maneira cautelosa, que os pesquisadores estavam diante de algo muito provável, mas ainda não 100% confirmado. “Como prometido, a palavra ‘descoberta’ apareceu apenas uma vez, em uma citação de Heuer”, conta a publicação, destacando que o papel do alemão em lidar com o conflito foi essencial para que o financiamento dos estudos continuasse e os cientistas não caíssem em uma espiral de acusações de terem anunciado a descoberta precocemente. 

Estudos de impacto

Veja quem foram os outros nove pesquisadores do ano segundo a publicação especializada:

Cynthia Rosenzweig 
A guardiã de Gothan City

Diz-se, nas histórias em quadrinhos e no cinema, que Batman era o guardião de Gothan City, cidade fictícia inspirada em Nova York. Agora, Cynthia Rosenzweig, pesquisadora do Instituto Goddard de Pesquisas Espaciais, da Nasa, desenvolve projetos para proteger a capital do mundo de desastres naturais, como furacões e tempestades, cada vez mais frequentes devido às mudanças climáticas. As pesquisas de Rosenzweig devem direcionar a forma como a cidade evoluirá nos próximos anos, orientando desde a criação de parques até a elaboração de códigos de construção e planejamento urbanístico.

Adam Steltzner
O homem de Marte 

Quando o robô Curiosity pousou em Marte, em agosto deste ano, poucas pessoas estavam mais interessadas no acontecimento do que o norte-americano Adam Steltzner. Foi ele quem liderou a equipe de mais de 50 pessoas envolvidas no projeto. A missão liderada por Steltzner custou mais de US$ 2,5 bilhões à Nasa e foi um dos principais feitos espaciais dos últimos anos. Espera-se que o material recolhido e analisado pela sonda, além das imagens produzidas ajudem a responder se Marte já teve condições de abrigar vida.

Cédric Blanpain
O rastreador de células

O belga Cédric Blanpain vem revolucionando uma série de áreas na ciência — desde a microbiologia aos estudos sobre a evolução da vida e a medicina — ao desenvolver uma técnica que permite colorir células de modo que elas sejam mais visíveis em microscópio. O grande pulo do gato na pesquisa de Blanpain, da Universidade Livre de Bruxelas, é que as células originadas das que ele coloriu desenvolvem a mesma pigmentação. Assim, é possível saber qual é a célula mãe e quais se desenvolveram a partir dela. Com a técnica, abre-se, por exemplo, novas janelas para o tratamento mais eficaz de doenças como o câncer.

Elizabeth Iorns
A caçadora de confirmações

A pesquisadora americana Elizabeth Iorns havia acabado de terminar seu doutorado, há cerca de 10 anos, quando decidiu repetir o experimento genético de um famoso artigo científico sobre câncer. Depois de inúmeras tentativas, chegou à conclusão de que o estudo estava errado. Depois de enfrentar uma espécie de calvário profissional, tentando comunicar ao mundo o erro, Iorns finalmente provou que estava certa. Hoje, dirige uma fundação que se dedica a confirmar experimentos de outras pesquisas.

Jun Wang 
O Fanático do genoma

Personagem dos quadrinhos X-Men, Fanático é conhecido pela força excepcional e poder de cura. Jun Wang, um chinês de 34 anos, incorpora, segundo a Nature, o espírito do personagem. Comanda em seu país o maior laboratório de sequenciamento genômico do mundo, procurado por empresas e pesquisadores do planeta atrás de dados sobre animais e plantas de seus interesses. Para dar conta do trabalho, que inclui comandar mais de mil pesquisadores, é preciso ser mais que humano.

Jo Handelsman 
A detetive do preconceito

O debate entre as diferenças no tratamento dado a homens e mulheres no mercado de trabalho é antigo, mas este ano invadiu o mundo científico como nunca, graças a um estudo de Jo Handelsman. A pesquisadora enviou currículos iguais, com nomes masculinos e femininos, para diversas universidades americanas a procura de emprego. O resultado foi que, em todos os casos, os “homens” receberam uma proposta de salário maior do que as “mulheres”. O estudo dela é a base para a discussão de como diminuir as diferenças de gênero nos laboratórios.

Tim Gowers 
A semente da discórdia

Pouca gente fora do mundo científico sabe, mas é extremamente caro publicar em periódicos consagrados. Os preços praticados pelas editoras — em especial a Elsevier, líder do mercado — para que os artigos sejam submetidos levou Tim Gowers a criar uma verdadeira guerra no mundo editorial, abrindo o debate: podem as publicações cobrarem pelo acesso a pesquisas, em especial aquelas financiadas com dinheiro público? O trabalho dele vem dando frutos. EUA e Reino Unido já discutem leis que facilitem o acesso aos artigos científicos.

Bernardo de Bernardinis
Na trilha das falhas

O engenheiro italiano Bernardo de Bernardinis foi condenado pela morte de 29 pessoas durante o terremoto de L’Áquila, na Itália. Funcionário de um escritório governamental, ele participou dos estudos, divulgados seis dias antes do abalo, que não previam o risco iminente de terremotos na região. Diferentemente dos demais colegas, que se esconderam da mídia e da Justiça, Bernardinis luta para provar que não foi sua culpa o erro de previsão — afinal é engenheiro, não sismólogo — e trava uma batalha paralela: fazer com que a história que vive sirva para modificar os padrões internacionais em relação aos estudos de previsão de terremotos. 

Ron Fouchier
O guerreiro da gripe

O holandês Ron Fouchier tomou as páginas dos jornais este ano por ter feito uma pesquisa perigosa demais para ser publicada. O grupo do pesquisador conseguiu produzir uma mutação no vírus H5N1, da gripe aviária, capaz de ser transmitido pelo ar entre mamíferos, em um processo relativamente simples. A pesquisa gerou reações até mesmo do FBI e dos serviços de segurança de vários países. O temor era que os resultados poderiam ser usados para terrorismo biológico. Por causa do debate, as revistas Science e Nature adiaram a publicação dos estudos, que acabaram sendo divulgados com alguns trechos suprimidos.

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