Ângela Faria
Estado de Minas: 01/12/2012
Domingo passado, Mick Jagger fez show em Londres para comemorar os 50 anos dos Rolling Stones |
Mick Jagger (Companhia das Letras), biografia do astro pop escrita pelo jornalista londrino Philip Norman, traz preciosas dicas para compreender a engrenagem que transformou os Rolling Stones em cinquentenária instituição do rock and roll. Do jovem Mike dos anos 1950 ao sir Mick Jagger de 2012, as 619 páginas são capazes tanto de entreter fãs em busca de “bafões” quanto leitores interessados em refletir sobre a cultura nos séculos 20 e 21.
Cabe ao ex-estudante de economia Mick Jagger boa parcela de responsabilidade no fato de a “firma” seguir lucrando com a inesgotável reciclagem de clássicos de tempos atrás, embora nos anos 1980 ele quase tenha implodido o negócio ao apostar em seus projetos solo. Esse voo particular, além de não decolar, atraiu a ira pública de seu “glimmer twin”, Keith Richards. Jagger também foi a nocaute, literalmente, depois de tomar uns tabefes do sempre cool baterista Charlie Watts.
Na trajetória dos Stones, muita gente beijou o ringue. O sócio-fundador Brian Jones, viciado em drogas, foi encontrado morto depois de ser despedido. O baixista Bill Wyman e o guitarrista Mick Taylor pediram o boné, fartos do papel de coadjuvantes do circo pop. Uma coleção de empresários levou bilhete azul em meio a capciosos contratos, turnês milionárias e prejuízos para a banda. O homem de negócios Mick Jagger mostrou talento nato e aplicação: aprendeu, na marra, a lidar com o capitalismo selvagem.
Philip Norman disseca cada etapa da saga stoneana, inclusive as crises. Evita chafurdar nas fofocas, embora não se furte a brindar o leitor com detalhes do way of life jaggeriano, temperado com drogas, sexo, incontáveis beldades, rock e confusões com a lei. De certa forma, escreveu um livro para adultos – contraponto à divertida Vida, a escrachada, sincera e meio adolescente confissão pública de Keith Richards.
Boa parte da biografia não autorizada de Mick Jagger joga luz sobre a trajetória dos Stones até a década de 1980. Quem gosta de história da cultura não perde tempo ao ler esses capítulos, pois o período fornece boas pistas sobre a formação da indústria que enriqueceu Jagger & Richards, vindo a culminar na roda da fortuna que alimenta Madonna, U2 e Lady Gaga.
Não é novidade que jogadas marqueteiras construíram a lucrativa imagem dos Stones como antibeatles rebeldes. Nos anos 1960/1970, juventude, drogas e contestação se tornaram sinônimos. Os Stones souberam, propositalmente, ser o símbolo disso. Mas, segundo Norman, seu biografado pouco se encaixa nessa persona, embora tenha aprendido a manipulá-la. Algumas daquelas armações chegam a soar ingênuas nestes nossos tempos de linchamento virtual.
Boa parte dessa performance se deve a gente como o empresário Andrew Loog Oldham, jovem como os roqueiros, expert em aproveitar escândalos e flertes com a barra-pesada para “agregar valor” à banda. Porém, Philip Norman pondera: nem tudo era farra. Em certos momentos, a cultura incomodou o poder – para valer.
O autor esmiuçou fatos que levaram à prisão de Mick Jagger, Keith Richards e amigos por porte de drogas, nos anos 1960, oferecendo indícios convincentes de que a batida policial fora armada pelo sistema. Leia-se: por um “amigo” infiltrado na casa de praia de Richards por articulações envolvendo o MI5, o serviço de segurança inglês, e o FBI. Naqueles tempos, roqueiros podiam ser subversivos. Tão perigosos quanto comunistas e militantes dos direitos civis...
Harém Norman deixa claro: antes de tudo, os Stones eram músicos de primeira, discípulos aplicados do R & B. Seu livro não alivia Mick Jagger. Enumera papelões – para não dizer cafajestadas – desse conquistador compulsivo, sobretudo com Jerry Hall e Marsha Hunt, que lhe deram cinco dos sete filhos. Criado em bom e velho lar de classe média britânico, o cantor é autêntico sir, pelo menos quando se trata da própria prole. Não dá mole para os herdeiros.
Se Norman nos apresenta um homem complexo, sensível, afetivo e sagaz, também nos revela alguém ambicioso, meio cínico e esnobe, sobretudo na juventude. Porém, defende Jagger em episódios polêmicos, contaminados por fofocas. Garante que ele se portou dignamente no Festival de Altamont, na Califórnia, quando um fã morreu esfaqueado pelos Hell’s Angels. Desmonta teorias da conspiração sobre a tragédia de Brian Jones e nega, com argumentos, que Jagger tenha covardemente defenestrado o frágil amigo da banda.
Em 2013, o astro entrará para a turma dos setentões bem resolvidos. Já se vão décadas desde que Mick trocou o rebelde pop inventado por Andrew Loog Oldham pelo cidadão “autocontrolado, calculista e conformista”, nas palavras de seu biógrafo. Atualmente, ele comemora o cinquentenário dos Rolling Stones rebolando no palco, cobrando preços salgados pela nova turnê e atraindo o público com os clássicos de sempre, por mais que surja uma ou outra nova canção.
Os Stones são profissionais, aprenderam o jogo. E sabem, como ninguém, lucrar com a própria lenda.
MICK JAGGER
• De Philip Norman
• Companhia das Letras, 619 páginas, R$ 49,50
• De Philip Norman
• Companhia das Letras, 619 páginas, R$ 49,50
OS JOVENS
A memorabília de Mick Jagger, Keith Richards (foto) e cia. é mercado fértil na festa de 50 anos do grupo de rock mais famoso do mundo. Early Stones (Editora Planeta, R$ 79,90), com fotografias do início da carreira feitas por Michael Cooper, traz imagens dos Rolling Stones entre 1963 e 1973. Os depoimentos vêm de Richards (“Michael captou o espírito e a essência de como a banda chegou a ser o que é”); de Ian Stewart, o amigo que acompanhou o grupo por décadas; e de Anita Pallenberg e Marianne Faithfull – musas de Jagger e Richards nos anos 1960/1970.
Nenhum comentário:
Postar um comentário