ZERO HORA - 02/01/2013
A
palavra tsunami só entrou no meu repertório a partir da tragédia
acontecida na Tailândia. Antes disso, se eu a vi escrita em algum lugar,
devo tê-la confundido com alguma sobremesa, quem me garantiria que não
era uma prima do tiramisu?
Pois tsunami, descobri, era outra
coisa, possuía um significado trágico. Águas revoltas emborcando corpos,
afogando vidas, eliminando gente num ataque surpresa. Você imagina que
está no paraíso (à beira-mar, quem não está?) e de repente é arrastado
para as profundezas com tal violência que, se conseguir escapar, não
voltará o mesmo. Quem sobrevive, coleciona cicatrizes e traumas. Ou
seja, tsunami passou a ser a metáfora ideal para todos aqueles momentos
em que somos atingidos por uma força exterior capaz de deixar nosso
mundo fora de lugar.
Seu marido saiu de casa, um tsunami.
Demissão coletiva na empresa, um tsunami. Seu filho foi vítima de um
assalto com arma, um tsunami. Todas as vezes em que você disse para si
mesmo “não sei se vou segurar a onda”, era porque um tsunami estava
passando por cima da vida satisfatória que você tinha antes.
Eu,
que sempre fui fascinada por água, que sonho frequentemente com o mar e
que costumo comparar a vida a um barco à deriva, passei a usar e abusar
do termo tsunami para descrever abalos emocionais. Até que fui assistir
ao filme O impossível, que reproduz o que aconteceu a uma família em
férias naquele fatídico 26 de dezembro de 2004, e botei meus pés de pato
de molho.
Amores terminam, pessoas adoecem, perde-se o emprego,
e tudo isso modifica destinos, mas há que se levar em conta que esses
são tsunamis razoavelmente previsíveis. É muito improvável que, durante
toda uma vida, você não padecerá de algum infortúnio. Doerá, mas sabe-se
que são através dessas dores que amadurecemos. Sofrer é péssimo,
ninguém deseja nem merece, mas há que se reconhecer algum valor
terapêutico nisso.
Já um tsunami de verdade faz sofrer de uma
forma bem menos didática. O filme, principalmente no início, é de um
realismo de embrulhar o estômago. Do meio para o fim, ele apela um pouco
para o melodrama – a trilha sonora avisa a plateia: hora de chorar,
pessoal! Mas é nas cenas iniciais, em que um inocente banho de piscina
no hotel se transforma num terror absoluto, que a gente se dá conta de
que quase nada do que vivemos em nosso cotidiano se compara a essa
brutal agressão pela qual se é atingido de um segundo para o outro.
O
que é pior: a dor física ou a dor emocional? Quando ambas acontecem ao
mesmo tempo, a catástrofe é completa. Fiquei muito impressionada com o
que assisti, porque não era apenas um filme, e sim um convite a entender
o que sentem as vítimas de um drama que atinge o corpo por dentro e por
fora. Tsunami como metáfora? A partir de agora, usarei com mais
parcimônia.
Chacinas em escolas são tsunamis. Assassinato de um
filho é um tsunami. Já para as nossas dores de cotovelo, frustrações
profissionais e tristezas congênitas, a analogia prescreveu. Temporais: é
isso que cai sobre nós de vez em quando, amém.
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