Marina Colasanti
marinacolasanti.s@gmail.com
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Estado de Minas: 07/02/2013
A menina aparece de repente na esquina entre duas gôndolas de produtos de beleza, passa por mim correndo, desvia de um carrinho, para, pega num produto, larga de volta na prateleira, fala sozinha e sai correndo. “Sofia!”– chama a mãe, empenhada na leitura de uma embalagem. Sofia não responde. “Sofia, vem pra cá”, ordena a mãe sem convicção. Sofia não vem. A mãe acabou a leitura, empurra seu carrinho repetindo ordens de que Sofia não toma conhecimento. Sofia, calculo quando torna a passar por mim correndo, deve ter uns 4 anos. E já sabe que quem manda ali é ela.
Adam Mansbach, um americano esgotado pelas manhas da filha de 2 anos, acabou transformando-as em dinheiro ao vender mais de 500 mil exemplares do seu livro Go the fuck to sleep (Vai para a porra da cama). Não li o livro, mas o título soa mais como um rompante humorístico do que como o enunciado de uma tese sobre educação. E 500 mil pais o compraram, ávidos para saber como se manda um filho de apenas 2 anos para a cama.
Poderiam ter lido o livro da mãe tigresa Amy Chua, que com um decálogo de apenas cinco pontos mostra, em termos domésticos, como e por que a China ganha tantas medalhas de ouro em esporte e tantos lugares de destaque nas orquestras. É simples, desde pequeno deve-se proibir ao rebento: dormir fora de casa, brincar com outras crianças, assistir à TV ou jogar videogame. E exigir: ser sempre o primeiro em tudo, tocar piano ou violino com perfeição. Como arremate: qualquer nota escolar abaixo de 10 não deve ser tolerada.
Na década de 1960, embarquei na educação da minha primeira filha com o olhar iluminado de quem ouviu vozes. Eu e a minha geração tínhamos ouvido o apelo libertário de Alexander S. Neil, que, com sua experiência em Summerhill, nos exortava a romper os grilhões educativos das crianças. Liberdade sem medo era o lema. Somava-se à famosa frase da psicanalista francesa Françoise Dolto: “As crianças têm só direitos, os pais, obrigações.”
Assim, de soma em soma, chegamos ao ponto que nos desespera, o império das crianças dominadoras.
Elas não obedecem, porque os pais acham que obedecer é submeter-se e a submissão enfraquece o caráter. Elas exigem veementemente tudo o que querem, porque os pais estão convencidos de que negar seus desejos equivale a criar frustrações. Elas questionam a autoridade, porque os pais não a exercem com convicção. Elas não conhecem limites porque nenhum limite lhes é imposto. Como escreveu um jornalista francês, são desde cedo “drogadas no prazer imediato”.
Programados, esperados ansiosamente, fotografados desde o útero, nomeados bem antes de nascer, louvados, treinados para o fascínio das marcas e o exercício da posse, adestrados em aulas e cursos para brilhar em qualquer domínio, esses filhos muitas vezes únicos, e para quem se quer dar tudo o que não se teve, não são exatamente mais felizes do que o foram as crianças de outros tempos. E nada nos leva a crer que venham a ser mais aptos para a vida.
Educar os filhos é uma lenha, sobretudo porque só nos é permitido acertar. Mas parece evidente que, entre a rigidez da mãe tigresa e o pobre pai em desespero, existe um ponto intermediário mais equilibrado, aquele que, sem tantas fórmulas ou decálogos, se deixa guiar pelo bom senso.
Adam Mansbach, um americano esgotado pelas manhas da filha de 2 anos, acabou transformando-as em dinheiro ao vender mais de 500 mil exemplares do seu livro Go the fuck to sleep (Vai para a porra da cama). Não li o livro, mas o título soa mais como um rompante humorístico do que como o enunciado de uma tese sobre educação. E 500 mil pais o compraram, ávidos para saber como se manda um filho de apenas 2 anos para a cama.
Poderiam ter lido o livro da mãe tigresa Amy Chua, que com um decálogo de apenas cinco pontos mostra, em termos domésticos, como e por que a China ganha tantas medalhas de ouro em esporte e tantos lugares de destaque nas orquestras. É simples, desde pequeno deve-se proibir ao rebento: dormir fora de casa, brincar com outras crianças, assistir à TV ou jogar videogame. E exigir: ser sempre o primeiro em tudo, tocar piano ou violino com perfeição. Como arremate: qualquer nota escolar abaixo de 10 não deve ser tolerada.
Na década de 1960, embarquei na educação da minha primeira filha com o olhar iluminado de quem ouviu vozes. Eu e a minha geração tínhamos ouvido o apelo libertário de Alexander S. Neil, que, com sua experiência em Summerhill, nos exortava a romper os grilhões educativos das crianças. Liberdade sem medo era o lema. Somava-se à famosa frase da psicanalista francesa Françoise Dolto: “As crianças têm só direitos, os pais, obrigações.”
Assim, de soma em soma, chegamos ao ponto que nos desespera, o império das crianças dominadoras.
Elas não obedecem, porque os pais acham que obedecer é submeter-se e a submissão enfraquece o caráter. Elas exigem veementemente tudo o que querem, porque os pais estão convencidos de que negar seus desejos equivale a criar frustrações. Elas questionam a autoridade, porque os pais não a exercem com convicção. Elas não conhecem limites porque nenhum limite lhes é imposto. Como escreveu um jornalista francês, são desde cedo “drogadas no prazer imediato”.
Programados, esperados ansiosamente, fotografados desde o útero, nomeados bem antes de nascer, louvados, treinados para o fascínio das marcas e o exercício da posse, adestrados em aulas e cursos para brilhar em qualquer domínio, esses filhos muitas vezes únicos, e para quem se quer dar tudo o que não se teve, não são exatamente mais felizes do que o foram as crianças de outros tempos. E nada nos leva a crer que venham a ser mais aptos para a vida.
Educar os filhos é uma lenha, sobretudo porque só nos é permitido acertar. Mas parece evidente que, entre a rigidez da mãe tigresa e o pobre pai em desespero, existe um ponto intermediário mais equilibrado, aquele que, sem tantas fórmulas ou decálogos, se deixa guiar pelo bom senso.
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