Os males da medicina
Não passa de um agrado à classe médica o anúncio do Ministério da Educação de que só autorizará novos cursos de medicina em lugares com carência de profissionais.Uma medida como essa talvez fosse eficaz em países que imponham restrições à movimentação de seus cidadãos. No Brasil, onde todos são livres para estudar, morar e trabalhar no local que preferirem, é improvável que funcione.
Escolas de medicina estão entre as mais concorridas do país. A tendência é o aluno se graduar onde conseguir vaga e depois mudar-se para a praça com melhores salários e condições de trabalho, na sua avaliação. Em geral, os grandes centros do Sudeste e do Sul.
Para romper o ciclo da concentração dos médicos, é preciso não só oferecer remuneração competitiva nas zonas afastadas como também garantir condições mínimas para se exercer o ofício.
Um bom salário pode atrair o profissional para a Amazônia, mas, se lá não houver um hospital equipado e outros médicos e enfermeiros para repartir funções e responsabilidades, ele mudará de emprego na primeira oportunidade.
É mais fácil baixar uma portaria do que lidar com esses problemas estruturais. E há que desconfiar, sempre, quando o governo cria mais barreiras para fornecer licenças. Pode ser a senha para os oportunistas prosperarem com as propinas por facilitação.
No mais, a má distribuição não é o único nem o principal problema dos cursos. Muito pior é a questão da qualidade dos jovens médicos. Mesmo em São Paulo, ela deixa muito a desejar, como mostrou o último exame do Conselho Regional de Medicina (Cremesp), no qual 55% dos formandos não conseguiram acertar 60% das questões.
O Planalto deveria privilegiar medidas menos chamativas, como ampliar as vagas de residência médica, torná-la obrigatória e exigir que todos os cursos contem com um hospital-escola. Além disso, urge implantar um exame nacional eliminatório para formandos.
É pouco provável que isso ocorra. De imediato, a ousadia só renderia gastos e reclamações ao governo, ora mais interessado em "mostrar serviço", como se diz.
EDITORIAIS
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Teto para desigualdade
Criação de um fundo para servidores do Executivo federal concretiza regime de previdência com condições iguais à do setor privadoA estreia do fundo de previdência complementar para os servidores do Executivo federal representa avanço importante para controlar gastos -ainda que em futuro remoto- num setor que gera deficit bilionários para os cofres públicos.
O funcionário que entrar para o governo federal, a partir desta semana, não terá mais garantia de se aposentar com rendimentos iguais ou próximos aos que percebia quando parou de trabalhar. Ele passa à mesma situação dos empregados de instituições privadas: receber aposentadoria de, no máximo, R$ 4.159, hoje o teto do INSS.
Servidores que almejarem benefícios acima desse valor terão de contribuir para um fundo de previdência complementar dos servidores do Executivo, o Funpresp-Exe.
A regra deverá valer, a partir do mês que vem, para os novos contratados pelo Legislativo federal. O mesmo ocorrerá com os do Judiciário, porém sem data prevista.
Os servidores do Executivo, todavia, eram os que mais contavam. Eles constituem a maioria do funcionalismo federal, cerca de 80% (excluídos os militares, que não fazem parte do novo regime e, portanto, mantêm o privilégio atual).
Apesar da reforma, o sistema público ainda é generoso. Para viabilizar pagamentos acima do teto do INSS, a União vai arcar com contribuições mensais de até 8,5% do salário do servidor (que recolherá outro tanto ao fundo). Na previdência complementar privada, o desembolso patronal em geral não ultrapassa 7,5%.
De todo modo, a criação do fundo é um passo na direção de reduzir a desigualdade entre os regimes dos setores público e privado e de conter o deficit alimentado sobretudo pelo descasamento entre contribuições de servidores na ativa e benefícios pagos aos aposentados.
Em 2012, o gasto com a previdência dos funcionários federais (quase 1 milhão de pessoas) acarretou deficit de R$ 62 bilhões. No setor privado, também há rombo significativo, de R$ 42 bilhões, mas só porque inclui aposentadorias rurais (um programa assistencial), pois é superavitário no meio urbano; além disso, beneficia cerca de 30 milhões de pessoas.
Se tudo der certo, a previdência do setor público será superavitária em 35 anos. Segundo a ministra Miriam Belchior, do Planejamento, o Funpresp se tornará o maior fundo de pensão da América Latina em uma década.
Precisará, porém, de controles rigorosos para não terminar aparelhado por partidos nem cooptado pelo governo para mascarar a intervenção estatal no setor privado.
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