Mosca-branca-do-fícus que infestou
árvores no Centro de BH ameaça agora espécimes em parque da Região
Norte. PBH declara emergência por decreto para acelerar procedimentos
Flávia Ayer
Estado de Minas: 27/03/2013
Cinquenta
anos depois da derrubada de 350 fícus na Avenida Afonso Pena, os
gigantes verdes que remetem à fundação da capital voltam ao centro das
atenções. A Prefeitura de Belo Horizonte decretou situação de emergência
por causa da infestação das árvores pela mosca-branca-do-fícus
(Singhiella sp). Se até então havia conhecimento da praga em três áreas –
Avenida Bernardo Monteiro, Avenida Barbacena e adro da Igreja da Boa
Viagem –, ontem, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMMA) assumiu
que o inseto migrou para outras regiões do município. Técnicos já
identificaram 246 exemplares doentes na cidade, sendo 14 com indicação
de corte. A maior parte, 125, se concentra no Parque Municipal Lagoa do
Nado, na Região Norte da capital.
A estimativa é de que haja em
BH cerca de 12 mil exemplares de fícus, espécie marcada pelo grande
porte e tombada como patrimônio cultural do município. Ao declarar
situação de emergência, por meio do Decreto 15.183, o objetivo da
prefeitura é acelerar procedimentos junto aos órgãos federais, além da
compra de serviços ou produtos para solucionar o problema. A principal
preocupação é conseguir rapidamente a autorização pela Agência Nacional
de Vigilância Sanitária (Anvisa) da aplicação de um inseticida orgânico e
um fungo para matar o inseto.
“Sem o decreto, essa aprovação
poderia demorar dois anos”, afirma a gerente de Gestão Ambiental da
SMMA, Márcia Mourão, que garante que ainda não há autorização para
cortar árvores, apesar da indicação. De acordo com o coordenador da
Defesa Civil Municipal, coronel Alexandre Lucas, na semana que vem, uma
comitiva vai a Brasília entregar o pedido de autorização para o
procedimento. Também no início de abril, a prefeitura promete começar a
instalar armadilhas contra a mosca, orçadas em R$ 1 mil. As placas
adesivas amarelas ajudarão a capturar as moscas. “Estamos trabalhando
para controlar a praga, salvar as árvores e proteger as pessoas e os
bens”, ressalta Lucas.
Depois de testar o inseticida orgânico
óleo de nim em galhos e troncos de alguns exemplares, os técnicos deram
início ontem a mais um experimento, com a aplicação do produto em cinco
mudas. Outro tanto está recebendo também o fungo entomopatogênico, que
funcionará como um agente de controle biológico. Os resultados do
experimento, que devem ser concluídos em duas semanas, é que indicarão a
linha de atuação a ser adotada. Um dos entraves em relação ao óleo de
nim é o fato de a aplicação ser autorizada pela Amvisa apenas em
ambientes rurais. “Mas o risco do nim é bastante baixo”, assegura o
engenheiro-agrônomo da SMMA Dany Sílvio Amaral, esperançoso pela
aprovação do produto em meio urbano.
Primeiro teste
Segundo ele, a demora em encontrar uma solução envolve fatores como
dinheiro público e a dificuldade em lidar com a praga, cujo combate é
pouco conhecido. “Em São Paulo, não houve essa preocupação com o manejo,
e houve opção principalmente pela supressão. Em BH, não. O primeiro
teste com o nim mostrou a eficácia, mas temos que estudar mais para
comprovar essa eficiência, pois a aplicação do produto envolve despesa”,
afirma. A verba para o tratamento dos fícus em BH vem de compensação
ambiental de empresa, conforme decisão do Conselho Deliberativo do
Patrimônio Cultural do Município. A SMMA não divulgou o montante
necessário para tratar dos espécimes atingidos pela praga.
O
pós-doutor em ecologia Sérvio Pontes Ribeiro, professor da Universidade
Federal de Ouro Preto (Ufop), acredita que o quadro crítico reflete a
falta de cuidado da prefeitura. “Houve uma negligência nos anos
anteriores. Não ocorreu uma atitude preventiva em relação às árvores nem
mesmo um manejo mais intenso quando se soube da infestação, no ano
passado”, afirma o especialista. Apesar de ter solicitado os laudos
sobre a situação das árvores, ele ainda não teve acesso aos pareceres,
mas garante: “A maioria dessas árvores tem condição de se recuperar. Na
Flórida, onde houve o problema, a solução foi um tratamento para
revigorar as plantas”, explica.
Integrantes do movimento Fica
Fícus, criado em defesa das árvores, esperam que a decretação da
situação de emergência sirva para agilizar o tratamento dos fícus.
“Achamos que as ações da prefeitura estão demoradas, travadas por uma
burocracia muito grande. Se a infestação é tão grave, o tratamento tem
que ser rápido”, ressalta uma das fomentadoras do movimento, Patrícia
Caristo. O grupo também pede maior transparência nas discussões.
“Tememos que esse decreto acabe atemorizando a população e contribua
para uma possível supressão das árvore em favor de projetos de
alargamento de avenidas e construção de estacionamentos subterrâneos”,
diz.
MEMÓRIA:
Erradicação na Afonso Pena
Na
madrugada de 20 de novembro de 1963, cerca de 350 fícus foram cortados
da Avenida Afonso Pena, na Região Centro-Sul. Oficialmente, a derrubada
do corredor verde era justificada pela proliferação dos insetos
Gynaikothrips ficorum, os tripes, batizados popularmente como
“amintinhas”, numa referência ao então prefeito de BH, Amintas de Barros
(1959 a 1963). Outra versão, no entanto, aponta que a eliminação das
árvores seria, na verdade, para alargar a Afonso Pena e dar lugar aos
automóveis que chegavam às ruas, com o crescimento vertiginoso da
capital, que passava de 350 mil habitantes na década de 1950 para 700
mil 10 anos depois.
SAIBA MAIS:
INSETO VEIO DA ÁSIA
A
mosca-branca-do-fícus (Singhiella simplex) é um inseto sugador nativo
da Ásia. O primeiro registro da infestação pela praga foi em 2007, nos
Estados Unidos. No Brasil, o problema foi notificado pela primeira vez
no Rio de Janeiro, em 2009, mas foi em São Paulo, no ano seguinte, que a
infestação chegou a um estágio alarmante. Somente em julho do ano
passado a prefeitura de BH identificou a praga na cidade. A
mosca-branca-do-fícus se deposita nas folhas e ataca principalmente os
galhos. Uma característica é a queda das folhas. O ciclo de vida do
inseto dura três semanas e cada fêmea pode botar 150 a 200 ovos. Tem
fácil disseminação pelo vento ou outras plantas.
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