sexta-feira, 17 de maio de 2013

Tendências/Debates

folha de são paulo

ELISABETH LEWANDOWSKI LIBERTUCI
A volta e a reviravolta da CPMF
A decisão do Supremo Tribunal Federal pela constatação de compra de votos no mensalão não tem mero efeito declaratório
Publicado o acórdão do mensalão e analisados os recursos dos réus que agora chegam ao Supremo, uma bomba fiscal vai estourar nos cofres do Executivo. Algo em torno de R$ 100 bilhões (em valores nominais). Em termos estatísticos, uma dívida de cerca de R$ 500 que a União tem com cada brasileiro, gerada de forma discreta, quase de carona, por decisões recentes de nossa maior Corte judiciária.
Explico. As consequências do julgamento do mensalão pelo STF não se encerraram com a decisão sobre o destino de cada um dos réus.
Tendo condenado 25 pessoas por envolvimento num esquema de compra de apoio de parlamentares em votações de matérias do interesse do governo do então presidente Lula, os ministros do STF abriram espaço para o debate jurídico quanto ao entendimento de que questões decididas nessas votações são inconstitucionais, não pela matéria sobre a qual versam, mas por vício formal no processo legislativo.
Em outras palavras: se as medidas foram aprovadas no Legislativo em um processo que envolveu compra de votos de parlamentares, seu resultado deve ser anulado, ou, pior, considerado inexistente, como se a votação nem sequer tivesse acontecido. O que ocorreu foi tão somente uma "encenação de votação", flagrantemente revelada no curso do processo de condenação dos "mensaleiros".
Parece, portanto, decorrência lógica que a compra de votos de parlamentares que aprovaram a prorrogação da CPMF entre 2005 e 2007 fere princípios constitucionais.
Ao submeter sua aprovação à vantagem em dinheiro oferecida a parlamentares, não houve, na votação, a expressão da vontade do povo por meio de seus representantes que a Constituição exige.
Não tendo sido aprovada por votação constitucionalmente válida, a lei aprovada também não é valida. Pior: simplesmente jamais existiu, porquanto viciada a etapa mais importante do processo legislativo, que é a votação, momento em que o congressista não fala por si, mas tem a honra de manifestar a vontade daquele que o elegeu como porta-voz no Legislativo: o eleitor!
Provada a percepção de vantagem indevida de parlamentares, não se exteriorizou a vontade do povo naquela votação. Consequência: ela inexistiu. E o que foi pago indevidamente deve ser restituído espontaneamente pela União a cada um dos contribuintes, em atenção ao princípio da moralidade pública (art. 37 da Constituição).
O prazo de cinco anos para pedir essa restituição começou no dia 22 de abril deste ano (data da publicação do acórdão da ação penal 470), quando o STF reconheceu que houve crime na votação da emenda constitucional 42, que prorrogou a CPMF por três anos. Isso porque a decisão do STF pela constatação de compra de votos não tem mero efeito declaratório. O escândalo é tamanho que, neste caso, indubitavelmente, a decisão tem caráter constitutivo.
Afinal, sem a decisão do STF, jamais os contribuintes poderiam saber que foram enganados por seus representantes no Congresso, sendo irrelevante quantos deles faltaram com o decoro parlamentar. A votação é uma só --e se apenas um congressista faltou com sua função de representar quem o elegeu, não houve votação. E ponto final.
Excelentíssima presidenta Dilma: por dever cívico, nós, contribuintes, aguardamos com brevidade a solução para sermos reembolsados daquilo que pagamos indevidamente aos cofres públicos. O que o contribuinte/eleitor não pode imaginar é ter de recorrer ao Judiciário e esperar para ser ressarcido.
E, de novo, o recurso ao Judiciário, neste caso, não se trata unicamente de reembolso de ordem financeira. É dever cívico do contribuinte/eleitor/cidadão receber de volta o que lhe foi escandalosamente surrupiado e que tem nome e sobrenome: a CPMF paga em 2005, 2006 e 2007!

    CARLOS EDUARDO SOARES GONÇALVES
    Nixon, Lindbergh e a independência do BC
    Agora Lindbergh desengaveta uma proposta de autonomia do Banco Central. Vindo dele, menino estrela do PT, a coisa ganha credibilidade
    Foi um republicano que, como presidente dos Estados Unidos, viajou à China no começo dos anos 70 para reatar os laços entre os dois países. De fato, Richard Nixon era a pessoa justíssima para a tarefa.
    Um conservador buscar aproximação com os chineses pode soar estranho, mas foi o que tornou a estratégia crível. Pense no contrário: como um liberal lograria convencer a sociedade de que a movimentação seria dissociada de seu viés ideológico?
    Já no caso de um falcão, o horror ao comunismo elimina dúvidas. O entendimento geral passa a ser: "Essa política só pode ser benéfica ao país". Com efeito, a expressão "Nixon in China" tornou-se usual para descrever esse tipo de fenômeno.
    Há versões tupiniquins da mesma lógica. Sugiro duas: Lula e a Previdência e Lindbergh e o Banco Central autônomo. Que tal?
    Pense num governo tucano propondo impor um teto para a gorda previdência dos funcionários públicos. Se não estou enganado, eles até tentaram. "Bando de neoliberais!" são os gritos que escuto.
    Mas Lula não. Lula não é neoliberal, é homem do povo. E se ele, lá em 2003, afirmava que era preciso reformar a Previdência, e tocou a reforma adiante, é porque ela de fato era necessária para o Brasil.
    Agora o senador Lindbergh Farias desengaveta uma proposta do senador Francisco Dornelles (PP-RJ) sobre a autonomia do BC. Vindo dele, menino estrela do PT, a coisa ganha credibilidade.
    Imagine o prezado leitor se a proposta tivesse saído do gabinete do presidenciável Aécio Neves ou da tal Casa das Garças, reduto dos pais do Plano Real. Como a sociedade poderia estar certa de que a ideia não seria destinada a atrapalhar a vida da presidente Dilma Rousseff?
    E por que mesmo é importante descasar os mandatos dos diretores do BC dos mandatos do Executivo e tornar a demissão deles mais difícil, requerendo aprovação parlamentar?
    Porque os horizontes e interesses dos políticos em geral não coincidem com os da sociedade. Assim, uma orientação monetária politicamente boa, daquelas que dão uma empurrada na atividade econômica no curto prazo, mas deixam um legado de inflação difícil de ser revertido mais à frente, vai sempre ser favorecida por um Executivo de olho na reeleição.
    Mas, nesse caso, o que é bom para o governo não é bom para a sociedade, porque a inflação ganha persistência. E é aí que entra nosso herói, o BC independente.
    Mas não teria o BC os mesmos incentivos para dar uma estimulada efêmera no crescimento econômico? Não, porque, passada a euforia e chegada a inflação, ele seria cobrado pela consequência adversa de seus atos. Além disso, uma diretoria independente não tem qualquer ganho em agradar os políticos.
    Por fim, deixo uma sugestão ao senador Lindbergh. Incluir na proposta a necessidade de parte da diretoria não ser formada por funcionários de carreira. São profissionais extremamente capacitados, não me entenda mal. Mas se o objetivo é termos um BC que não precise se sujeitar à política, é importante que parte dos diretores se sinta à vontade para pedir para sair caso a pressão consiga se inserir por alguma fissura da nova legislação.

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